DINHEIRO ? Por que um cientista no Ministério da Economia?

AVI HASSON ? Isso vem das características específicas da economia israelense. Israel é um país com território pequeno, sem recursos naturais e com uma população de menos de oito milhões de pessoas. Não há muito espaço para expansão dos nossos mercados e não temos produtos primários para exportar. Assim, nos últimos 40 anos, tem sido uma política de Estado fomentar as exportações de produtos com alto valor agregado, e o que mais agrega valor é conhecimento, pesquisa, tecnologia. Daí a importância da pesquisa científica em nossa economia.

 

DINHEIRO ? Qual é o seu trabalho?

HASSON ? Procurar parcerias internacionais em diversos níveis, tanto empresariais quanto com governos e universidades. Nossa política de Estado tem sido procurar conectar o que chamamos de ecossistema econômico israelense ? que inclui investidores, empresas e a universidade ? ao mercado global. Esse trabalho tem de ser profundo e contínuo. Exportar tecnologia é muito mais difícil do que exportar matérias-primas ou mesmo produtos acabados. 

 

DINHEIRO ? Por quê?

HASSON ? Quando você exporta minério de ferro, madeira, calçados ou vinho, o consumidor sabe exatamente o que está comprando e o produto se encerra nele mesmo. Só isso já é uma enorme barreira aos negócios tradicionais, imagine, então, quando se negocia alguma coisa tão intangível quanto a tecnologia. Por isso, há cerca de dois anos, percebemos que nossa política de exportações de tecnologia tinha de avançar em diversos as­­pectos se quiséssemos vender nosso conhecimento. 

 

DINHEIRO ? O sr. poderia citar alguns exemplos?

HASSON ? Há muito tempo procuramos fechar parcerias. O que mudou de dois anos para cá é que, agora, nós temos um marco legal que sustenta os acordos fechados com entidades estrangeiras. Isso facilita enormemente o processo. Muitas vezes você se reúne com uma empresa e oferece uma parceria que interessa ao empresário. Ele descobre que Israel é um bom lugar para fazer negócio, mas, sem regras claras que definam o uso e os limites da propriedade intelectual, é difícil colocar isso em prática. Os países são muito distantes, as culturas são diferentes, a legislação é diferente; então, fica mais complicado colocar os acordos para funcionar. Se vou fazer negócio com quem não conheço, quero ter certeza de que as regras são claras.

 

DINHEIRO ? As mudanças recentes referem-se apenas ao estabelecimento de um marco legal?

HASSON ? Não. Isso faz parte de uma política de Estado para promover a exportação de tecnologia. Israel não é uma escolha óbvia, há países maiores e com mais vantagens competitivas. Por isso, temos de compensar nossa falta de recursos com uma grande abertura e uma grande proatividade na promoção comercial. Estamos abertos para negócios e, para reduzir os riscos dos nossos parceiros, estabelecemos esses marcos regulatórios. A regulamentação é importante, mas não é o único fator. Também é necessário garantir aos empresários que é seguro fazer negócios conosco. E, é claro, fazer promoção. Nós temos de, literalmente, sair de casa para vender.

 

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Judeus orando junto ao Muro das Lamentações, em Jerusalém

 

DINHEIRO ? Como isso funciona na prática?

HASSON ? Agora, há um orçamento estatal e recursos estatais para a promoção das exportações de tecnologia. Por exemplo, nós realizamos eventos sistematicamente. Promovemos feiras, rodadas de negócio, visitas de delegações de empresários estrangeiros a Israel e também vamos visitar outros países. Outro ponto muito importante, e percebemos que ele faz uma enorme diferença, é que o governo disponibiliza bases de dados sobre as empresas israelenses para os interessados. Parece óbvio, mas, com mais informações disponíveis, atraímos mais pessoas que querem fazer negócios. A colaboração e a difusão de informações reduzem o risco de parte a parte. Nós também estabelecemos missões conjuntas de empresários, acadêmicos e autoridades, que viajam frequentemente. Não há alternativa, temos de ser ativos e dedicados na divulgação do que podemos oferecer. Esse é o único jeito de garantirmos nosso lugar no mundo para as próximas gerações. Estamos fazendo isso há 40 anos e vamos continuar. É a única maneira de garantirmos nossa importância econômica.

 

DINHEIRO ? Como isso se aplica ao Brasil?

HASSON ? O Brasil está na pequena lista de países que definimos como estratégicos, ao lado da Índia, da China e do Canadá. O País nos interessa muito por vários motivos. A economia brasileira pode oferecer algo que Israel nunca terá: escala. Além de o mercado no Brasil ser muito grande, o País é uma excelente porta de entrada para a América Latina, que é uma região que nos interessa muito. Depois, as duas economias são muito complementares, e não apenas devido aos produtos básicos brasileiros. A tecnologia brasileira também nos interessa.

 

DINHEIRO ? É quase um consenso no País que um dos problemas da economia brasileira é que as empresas e o governo investem pouco em pesquisa e desenvolvimento. No que a tecnologia brasileira interessa a Israel?

HASSON ? Há vários exemplos, mas vou citar apenas dois. A Petrobras é líder mundial em tecnologia de exploração de petróleo em águas profundas e na exploração de gás. Não temos petróleo em nosso território, mas precisamos nos integrar a essa cadeia produtiva, e a experiência em petróleo da Petrobras nos interessa bastante. Outro exemplo é o da mineradora Vale, que é extremamente eficiente e que pode ser um parceiro muito interessante. Sem falar na Embraer, é claro, e nas inúmeras oportunidades do agronegócio. Evidentemente, fechar parcerias sempre é difícil. Não há muitas pessoas que conheçam os dois países e que possam servir de intermediários. Sem isso, como as companhias brasileiras podem descobrir oportunidades interessantes em Israel? Por isso, falamos com todo mundo. Em dois dias, tivemos encontros na Federação das Indústrias de São Paulo, na Universidade de São Paulo, na Fapesp e no Ministério do Desenvolvimento. É uma agenda corrida, mas vale a pena.

 

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Plataforma de exploração de petróleo da Petrobras

 

DINHEIRO ? O seu trabalho é divulgar a tecnologia israelense. Se o sr. fosse assessorar o governo brasileiro para fazer esse serviço, qual seria sua estratégia?

HASSON ? Não tenho a pretensão de querer ensinar o Brasil a desenvolver sua tecnologia, mas posso falar um pouco de promoção. Vender tecnologia é muito mais complicado do que vender minério de ferro ou soja, porque comprador e vendedor precisam trabalhar juntos para colocar o que foi vendido para funcionar. Um processo como esse enfrenta barreiras de todos os tipos. As pessoas são diferentes, têm culturas diferentes, falam línguas diferentes, moram em países com fusos horários diferentes. O Brasil pode ser um grande exportador de tecnologia, se quiser. Como já citei, temos os exemplos da Petrobras, da Vale, da Embraer, do agronegócio. Se o Brasil definir que é importante vender a tecnologia brasileira para outros países, é preciso que ele transforme a divulgação internacional dessa tecnologia em uma política de estado, como é feito em Israel. Os governos mudam, mas as diretrizes de exportação de tecnologia continuam as mesmas. Há mudanças, claro. A aprovação desse novo marco legal, há dois anos, foi um grande avanço. Mas o espírito da nossa política de divulgação não muda.

 

DINHEIRO ? O sr. veio anunciar um fundo de investimentos para start-ups israelenses. Qual é a meta de captação?

HASSON ? A meta desse fundo é captar US$ 400 milhões de investidores institucionais brasileiros interessados na tecnologia israelense. Temos alguns bons exemplos de empresas incentivadas que nasceram em incubadoras e que, atualmente, não apenas são listadas nas bolsas internacionais como também fazem negócios com o Brasil. Posso citar dois exemplos. Um deles é uma empresa chamada El-Bit, que produz equipamentos de segurança e de vigilância, e outra é uma companhia farmacêutica chamada Protalix, que desenvolve medicamentos para uma doença genética, a síndrome de Gaucher. A Protalix foi autorizada pela Anvisa a vender seus produtos no Brasil em junho deste ano. Há algumas dezenas de empresas israelenses que podem seguir caminhos semelhantes, e queremos que os investidores brasileiros participem desse desenvolvimento.