O chefe da diplomacia dos Estados Unidos, Antony Blinken, partiu neste domingo (16) em uma viagem voltada para o futuro do Ártico, fonte de crescentes tensões com a China e um teste para as complicadas relações de Washington com a Rússia, diante de uma possível cúpula Biden-Putin.

Blinken vai primeiro a Copenhague, onde se encontrará com líderes dinamarqueses na segunda-feira, antes de viajar para a Islândia para uma reunião ministerial do Conselho Ártico, que reúne oito países, na quarta e quinta-feira.

Em Reykjavik, todos os olhos estarão voltados para um encontro entre Blinken e seu homólogo russo Sergei Lavrov, a primeira reunião de alto nível entre as duas potências desde que Joe Biden assumiu a presidência em janeiro.

O Ártico, uma vasta área de condições extremas e inóspitas, se tornou nos últimos anos palco de uma competição geopolítica entre os países que compõem o Conselho Ártico (Estados Unidos, Rússia, Canadá, Noruega, Dinamarca, Suécia, Finlândia e Islândia).

À medida que o aquecimento global deixa essa região mais acessível e menos imponente, aumenta o interesse por seus recursos naturais, suas rotas de navegação e sua posição estratégica.

Para desgosto de Washington, o Ártico também é cobiçado pela China, que tem apenas o status de “observador” no Conselho, mas se posicionou como uma potência “quase-ártica”.

Durante o governo de Donald Trump, os Estados Unidos rejeitaram o que consideraram “agressividade” por parte da Rússia e da China na região. Agora, a administração Biden parece determinada a continuar firmando sua participação no território.

“Não estamos dizendo não a todas as atividades ou investimentos chineses, mas insistimos no cumprimento das regras internacionais e na adesão a altos padrões”, disse James DeHart, coordenador norte-americano para a região ártica, em recente encontro com jornalistas. Algumas atividades chinesas, acrescentou, geram “preocupação” nos Estados Unidos.

– Groenlândia não está à venda –

Talvez a missão mais importante de Blinken seja virar a página em duas controvérsias herdadas do governo Trump.

O presidente republicano afirmou que os Estados Unidos poderiam comprar a Groenlândia, com seu vasto território ártico, da Dinamarca, o que provocou uma resposta furiosa de Copenhague de que a ideia era “absurda” e que o território “não está à venda”.

Blinken terá que se manter afastado de tais provocações, já que se reunirá primeiro com autoridades dinamarquesas e depois fará uma breve parada nesse território autônomo.

Pior ainda, o antecessor de Blinken à frente do Departamento de Estado, Mike Pompeo, abalou a última reunião do Conselho Ártico ao bloquear a declaração final do grupo porque o texto mencionava mudanças climáticas.

Pompeo até parecia ver uma oportunidade no aquecimento do clima, afirmando que a redução gradual do gelo estava abrindo novas rotas de navegação e criando oportunidades de comércio.

A mensagem norte-americana mudou radicalmente com a chegada de Biden à Casa Branca, já que o líder democrata fez do combate ao aquecimento global uma de suas prioridades.

– “Risco tremendo” –

O Conselho emitirá uma declaração final desta vez, que já foi aprovada pelas oito nações, assim como um “plano estratégico” comum para os próximos 10 anos, segundo Marcia Bernicat, alta funcionária do Departamento de Estado que lida com as questões ambientais.

“A abertura do oceano, por assim dizer, não é uma coisa boa sem reservas. Também representa um risco tremendo”, disse ela em entrevista coletiva na sexta-feira. Estudos recentes, afirmou, mostram que o Ártico está esquentando “não duas vezes mais, mas três vezes mais do que o resto do mundo”.

O governo Biden quer usar os problemas climáticos para explorar possibilidades de cooperação com Moscou, que terá a presidência rotativa do Conselho do Ártico nos próximos dois anos.

Blinken e Lavrov revisarão “toda a relação bilateral: o bom, o ruim e o médio”, disse o porta-voz do Departamento de Estado, Ned Price.

“O mal” provavelmente ocupará grande parte da discussão, dadas as acirradas disputas entre os dois países sobre a interferência de Moscou nas eleições norte-americanas, além das acusações de espionagem e ataques cibernéticos.

Determinado a romper com o que muitos consideravam uma relação cordial entre Trump e Vladimir Putin, Biden passou a chamar o líder russo de “assassino”. E depois de sua posse, Washington e Moscou impuseram sanções mútuas, em uma dinâmica de olho por olho.

Mas a Casa Branca insiste que sua política externa é muito pragmática e está aberta a encontrar pontos de contato até mesmo com seus piores inimigos quando se trata de questões de interesse dos EUA, como as mudanças climáticas ou o desarmamento.

Esse é o principal objetivo dos Estados Unidos na conferência de Reykjavik, que deve levar à confirmação de uma primeira cúpula Biden-Putin na Europa em junho.

Washington quer “testar e tentar ver se podemos conseguir um relacionamento com Moscou que seja mais estável e previsível”, declarou Price.