Os últimos anos não foram, digamos, os mais suaves da vida do empresário paranaense Hélio Rotenberg, cofundador e presidente da Positivo Tecnologia. Seu principal mercado, o de computadores pessoais, despencou de 15 milhões de unidades, em 2013, para 5 milhões, em 2016. Houve, no ano passado, uma recuperação de cerca de 10%, mas o cenário está longe de voltar aos patamares pré-crise. “Atravessamos um período de muitos desafios, com incertezas de mercado, instabilidade na economia e turbulências na política”, afirma Rotenberg. Mas a empresa conseguiu atravessar a tempestade, como define o presidente. Entre janeiro e setembro de 2017, o último dado disponível, a receita atingiu R$ 1,5 bilhão, resultado semelhante ao mesmo período de 2016. O faturamento contabilizado em 2016 foi de R$ 1,75 bilhão, e deve ter fechado o ano passado acima dos R$ 2 bilhões. “Tenho observado que as coisas estão melhorando para toda a economia, o que nos leva a acreditar em um 2018 de recuperação e bons resultados.” Acompanhe, a seguir, sua entrevista:

DINHEIRO – Como a crise será lembrada na Positivo?

HÉLIO ROTENBERG – Foi complicado. Nos últimos anos, atravessamos um período de muitos desafios, com incertezas de mercado, instabilidade na economia e turbulências na política. Passado o pior, já é possível olhar para 2017 como um ano melhor do que foi 2016, embora não tenha sido um ano bom. Houve uma crise intensa no mercado de computadores entre 2014 e 2016. Mas, já no primeiro semestre de 2017, as vendas começaram a parar de cair. Isso nos deixou animados. Tanto é que, no segundo semestre, as vendas dispararam. Tivemos falta de produtos, uma situação não vista há muitos anos. Os números ainda não estão fechados, mas se compararmos a segunda metade de 2017 com o mesmo período de 2016, o ritmo de expansão superou 15%. Tenho observado que as coisas estão melhorando para toda a economia, o que nos leva a acreditar em um 2018 de recuperação e bons resultados.

 

DINHEIRO – A recessão foi mais curta do que os empresários esperavam?

ROTENBERG – A crise foi longa, mas seu fim surpreendeu. Todos nós fomos surpreendidos positivamente pelo mercado. A gente não imaginava que o mercado ia crescer como cresceu. Com a crise arrefecendo, com o desemprego parando de crescer, com a expectativa de a economia melhorar, as pessoas já passaram a trocar o computador. Como o mercado reagiu mais rápido, os fabricantes foram pegos de surpresa e não tinham componentes suficientes para suprir a demanda.

 

DINHEIRO – Essa reação da economia pode ser atribuída à melhora da conjuntura, como a queda nos juros e a estabilidade do dólar?

ROTENBERG – Também. Selic em queda é sensacional. É tudo o que o empresário quer e precisa. Com Selic de 7%, e juro real de 4% a 4,5%, é outro mundo. Não se compara. Com uma Selic de 14% e juros reais acima de 6%, é duro ter retorno de capital. Não tenha dúvida disso. Com isso, o ambiente está mais favorável para os negócios. O empresariado, agora, se sente encorajado a desaplicar o dinheiro e fazer negócios produtivos, que é o que faz o Brasil crescer e gerar empregos.

 

DINHEIRO – E o dólar?

ROTENBERG – Para nós, o problema não é dólar caro ou dólar barato. O que mais prejudica é o sobe-e-desce. A flutuação é pior do que a camada do dólar, a faixa da cotação. Dólar a R$ 3,30 é um bom dólar, ao meu ver, desde que fique parado. Quando há oscilação aguda, todo mundo perde.

 

DINHEIRO – Como a Positivo está se preparando para o fim do mercado de computadores?

ROTENBERG – Não concordo com essa visão. O mercado de computadores não vai desaparecer. O mercado corporativo é feito, basicamente, de computadores, não de tablets e smartphones. São funções distintas. Hoje, a gente não passa um dia no escritório sem ter um computador na frente. O mercado doméstico, para determinadas questões, principalmente para a produção de conteúdo, é muito melhor do que um smartphone. O consumo de conteúdo se transferiu também para o smartphone, mas para produzir conteúdo, a história é outra. Eu vi uma vez uma palestra de Jean Paul Jacob, um pesquisador da IBM, há uns 15 ou 20 anos. Ele disse: ‘Só lembrem-se uma coisa: o nosso dedo não diminui de tamanho’.

Seção de tecnologia da Casas Bahia, em São Paulo (Crédito:Divulgação)

DINHEIRO – Como a empresa conseguiu se adaptar às crises dos últimos anos?

ROTENBERG – Colocamos em prática uma série de medidas internas e externas para atravessar a fase mais difícil. Primeiro, adaptamos a empresa para o tamanho do mercado brasileiro. Segundo, internacionalizamos os negócios. Posso citar, como exemplo, o início das operações e vendas na Argentina, no Uruguai, no Chile e no Peru. Começamos a fabricar também na África, com unidades próprias no Quênia e em Ruanda. Terceiro, partimos para a diversificação, com destaque para o mercado de smartphones. Tanto é que a receita não caiu durante a crise. Perdemos dinheiro, pontualmente, com alguns negócios, mas conseguimos nos adaptar rapidamente para manter as contas sólidas e saudáveis. Nossa receita hoje é dividida em 65% computadores pessoais e 35% para os demais produtos.

 

DINHEIRO – O que chamou a atenção lá fora?

ROTENBERG – Gostei muito do mercado africano. O continente está atrasado em relação ao seu processo de informatização, se compararmos com o restante do mundo, principalmente na região Sudeste da África. O grau de informatização da sociedade é baixo. Conseguimos vender lá em Ruanda e Quênia grandes projetos de informatização das escolas, com a implementação de um computador por aluno. Além disso, temos fábrica própria na Argentina, que é um mercado fechado como o do Brasil. Nos mercados chileno e peruano entramos com a marca Vaio, que temos a licença para esses países. Projetamos alguns produtos com os japoneses da Sony.

 

DINHEIRO – A marca Vaio ainda carrega a boa reputação da Sony?

ROTENBERG – Com certeza. A marca é muito forte dentro e fora do Brasil. A engenharia também. Foi um grupo de engenheiros da Sony que fez o spin-off e continuou com a marca Vaio. Então, é um pilar importante de nossos negócios no Brasil e em alguns países da América Latina.

Alunos de escola pública em Ruanda, país que adotou programa de informatização em suas escolas (Crédito:Divulgação)

DINHEIRO – Como os notebooks estão se adaptando a um consumidor que prefere, cada vez mais, tablets e smart-phones?

ROTENBERG – Os notebooks ultrafinos são sensacionais. O Positivo Motion, que é o mais vendido do Brasil em sua categoria hoje, é um cloud book com memória super rápida. Ou seja, para combater os smartphones de moda, os notebooks estão ficando muito bonitos e completos. Surgiram os notebooks dois em um, que são conversíveis, se transformam em tablets e possuem tela touch. Ou seja, estamos muito otimistas como esse mercado e, ao mesmo tempo, muito otimistas com o segmento de smartphones. Temos nessa categoria a marca Quantum, que é um aparelho maior. O Quantum V é um aparelho que tem até projetor embutido. É sensacional. Para fazer uma apresentação, basta projetar na parede. Se quiser levar para praia, no final de semana, dá para assistir um Netflix no teto ou na parede.

 

DINHEIRO – A concorrência ficou mais acirrada nos últimos anos?

ROTENBERG – Sim. Só consegue sobreviver quem for muito bom em cada detalhe, entendendo muito bem a mercado local. Nós conseguimos posicionar nossa marca Positivo para a classe C e a marca Vaio para as classes A e B. Na marca Positivo, fazemos um produto muito adaptado à realidade brasileira, com produtos super bonitos e baratos. O preço médio é de R$ 1 mil. Já o Quantum começa em R$ 899 e vai até R$ 2 mil.

 

DINHEIRO – Com essa estratégia, a Positivo consegue escapar da concorrência direta de Apple e Samsung?

ROTENBERG – Existe uma pirâmide nesse mercado, típica das classes sociais brasileiras. As marcas mais caras, como Apple e Samsung, focam nos consumidores do topo da pirâmide. Mas a pirâmide é enorme. Basta olhar para as pessoas nas ruas e será fácil perceber que a maioria não tem nas mãos nem Samsung S8 nem Apple. Se tem, é um modelo mais antigo. Existe uma parcela enorme da população brasileira que não consegue pagar por um aparelho tão caro. Esse consumidor busca um smartphone que cumpra seu papel, que proporcione acesso a WhatsApp, a um aplicativo de vídeo com qualidade, que tenha uma câmera de boa resolução e uma boa bateria. E que caiba no bolso, do ponto de vista financeiro. Existe uma massa de famílias de classe média que podem comprar e estão bem servidas com as opções existentes no mercado, mas a maioria vive outra realidade.

 

DINHEIRO – Quais são suas projeções para os negócios neste ano?

ROTENBERG – Estou otimista, mas sei que não vai dobrar de volume. Não vai voltar aos níveis pré-crise, mas continuará avançando. O fato de saber o que mercado está em crescimento, mesmo que seja em um ritmo mais lento, nos traz um certo conforto. Só para se ter uma ideia do tamanho do tombo nos últimos anos, em 2013 o mercado brasileiro vendeu 15 milhões de computadores. Um ano antes, foram cerca de 5 milhões de unidades. Neste ano, devemos fechar em torno de 5,5 milhões. Mas o fato de ter um crescimento no horizonte é um alento.

 

DINHEIRO – O que esperar da economia em um ano eleitoral?

ROTENBERG – Ano de eleição sempre gera receios para a economia. Se relembrarmos as últimas eleições, veremos que o mercado precificou essa incerteza com muita instabilidade. A volatilidade dependerá dos resultados das pesquisas de intenção de voto. A gente torce para que seja um processo democrático tranquilo. Afinal, não podemos ter malucos na condução da economia brasileira. Por isso, espero que o próximo presidente tenha consciência social e tenha responsabilidade com a economia.