O agronegócio e o mercado de capitais são dois dos setores mais pujantes da economia brasileira. Ao longo dos últimos anos, ambos mantiveram distância entre si. Porém, em 2021, algumas aberturas de capital de empresas do campo – que responde por 26,6% no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro e movimenta cerca de R$ 2 trilhões por ano – prometem mudar esse quadro. Só neste ano ocorreram três emissões. As aberturas de capital da usina Jalles Machado, que captou R$ 741,5 milhões, e da Boa Safra, maior sementeira de grãos do País, emitindo R$ 400 milhões. E o retorno da BrasilAgro ao pregão, com oferta subsequente de R$ 4,3 bilhões.

Esses três lançamentos podem ser a indicação de que o mercado de capitais e o agronegócio estão reduzindo suas diferenças. Desde o final de 2004, quando a abertura de capital da Natura inaugurou o Novo Mercado, as empresas captaram R$ 1,536 trilhão em aberturas de capital e ofertas subsequentes. Foram ao todo 438 operações. No entanto, o agronegócio passou longe dessa animação. A primeira abertura do setor ocorreu em 2004, com a Pomifrutas, que estreou como Renar Maçãs. Desde então houve só 23 operações que captaram R$ 18,5 bilhões, apenas 1,2% do total já movimentado. Agora isso deve começar a mudar. Para analistas, outras seis empresas devem engrossar a fila de IPOs, desenhando uma safra boa também no mercado de capitais.

O momento é considerado propício pelo estrategista de renda variável da Ouro Preto Investimentos, Bruno Komura. Os motivos são o real desvalorizado e a forte demanda pelas commodities. O crescimento da China e dos Estados Unidos e a reabertura de várias economias desenvolvidas, como as europeias, têm feito os preços dos produtos agrícolas subirem. Isso deve levar muitas empresas que hoje concentram seus negócios no mercado interno a testar a exportação. Para isso, é preciso recursos. E a ideia é usar o chamariz do faturamento em moeda forte para fazer brilhar os olhos dos investidores. “O setor está bem e deve continuar surfando nesse mercado por um bom tempo, até a cadeia de suprimentos se reorganizar”, disse Komura.

Além das receitas em dólar, as características do setor também funcionam como atrativo. “O agronegócio se demonstrou não apenas resiliente, mas antifrágil frente à pandemia”, afirmou o especialista em concessão de crédito para o agronegócio e CEO da TerraMagna, Bernardo Fabiani. “Agora, a liquidez elevada pavimentou a avenida para que a Faria Lima possa chegar ao campo.” O sócio especializado em crédito da gestora Vinci Partners, Marcello Almeida, avalia que essas condições devem ser duradouras. “O segmento tem boas perspectivas com o esperado crescimento mundial nos próximos anos, devido aos estímulos e ao excesso de liquidez”, afirmou. Para participar disso, a Vinci Partners acabou de assinar uma joint venture com a butique de investimentos Chrimata, especializada no agronegócio, para levantar recursos para investimentos no campo.

ENTRAVES Apesar das boas perspectivas ainda há alguns entraves à aproximação entre mercado de capitais e campo. O preço de venda dos IPOs do setor neste ano ficou abaixo do esperado, o que desanimou outros empresários a tocar a campainha na B3. Três candidatas, Agrogalaxy, Oleoplan e Vittia Fertilizantes interromperam os processos. A desistência ocorreu devido à grande volatilidade em função das incertezas econômicas. Mesmo que no exterior as coisas já estejam melhorando com o avanço da vacinação, no Brasil há ainda dúvidas diante de problemas de orçamento, questão fiscal, pandemia, CPI e, para completar, as eleições de 2022. Por isso, muitas ofertas tiveram seu preço reajustado, porque os investidores estão pedindo mais retorno. E quem quer abrir o capital tem de aceitar menos dinheiro.

Apesar desses entraves poderem desestimular alguns empresários, os analistas dizem acreditar que os preços das commodities logo vão aparar as arestas. Isso vale não só para as commodities metálicas, como também para os produtos do campo. “O Brasil possui importantes vantagens competitivas como clima favorável, recursos naturais em abundância, infraestrutura instalada e em expansão, além de tecnologia e pesquisa de ponta”, afirmou o sócio da Vinci Partners responsável pelo desenvolvimento imobiliário, Leandro Bousquet. Assim, apesar de eventuais solavancos, na Faria Lima o campo logo vai ser pop.