A ascensão dos “unicórnios” brasileiros, como Nubank, Pagseguro e ifood, tem criado um efeito virtuoso no mercado. Quanto mais sucesso essas empresas alcançam, mais investimento as demais startups recebem. Isso tem incentivado a criação de novos fundos e a chegada de grupos internacionais para explorar esse universo, que – apesar da crise – não para de crescer.

Entre 2020 e 2021, o número de investidores que colocaram dinheiro em startups no Brasil subiu 34%, de 404 para 544 – o maior crescimento absoluto desde 2007, segundo a plataforma de inovação Distrito. Tratase de um mercado em franca expansão e com oportunidades de negócios. Atualmente, o País tem 21 “unicórnios” (empresas com valor de mercado superior a US$ 1 bilhão) e outras dezenas de candidatas a integrar o seleto grupo de startups bilionárias nos próximos anos.

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São essas promessas e a possibilidade de embolsar alguns milhões de reais que enchem os olhos dos investidores e realimentam esse mercado. Só em 2021, os fundos de venture capital que aplicam recursos em startups bateram recorde de investimento. Até novembro, o valor aportado no mercado brasileiro foi quase 200% superior ao de todo o ano de 2020: US$ 8,8 bilhões (quase R$ 50 bilhões, pelo dólar de quinta-feira), ante US$ 3 bilhões (R$ 17 bilhões).

“Este ano foi fenomenal. Pela captação que os fundos estão tendo, 2022 tem tendência de crescimento igual a deste ano”, diz Gustavo Araujo, cofundador e presidente do Distrito. Na avaliação dele, um dos destaques de 2021 foram as megarrodadas de investimentos, acima de US$ 100 milhões. De um lado, as empresas estão mais maduras e com necessidade maior de capital. Do outro, há gestores bem capitalizados e com apetite por ativos brasileiros, destaca Araujo.

Foco na região

O efeito Nubank, que estreou nas Bolsas de Nova York e de São Paulo no início do mês, deverá ajudar a atrair ainda mais investidores internacionais. Além do bilionário Softbank, que prepara novo fundo para a América Latina, gigantes do mundo dos investimentos como Tiger Global, Warburg Pimco e Andreessen Horowitz também voltaram suas atenções para a região.

O empreendedor Paulo Veras, um dos fundadores do primeiro “unicórnio” brasileiro, a 99, diz que o mercado está vivendo uma mudança geográfica relevante. Há dez anos, afirma ele, os investimentos estavam migrando para o sudoeste asiático, e a América Latina era praticamente excluída desse movimento. Hoje, a região virou o epicentro dos investimentos de venture capital.

Na avaliação dele, vários fatores aumentam a atratividade dos ativos brasileiros. Além dos novos “unicórnios”, o fato de a maior parte da população ter um smartphone e acesso a infraestrutura de dados e banda larga eleva o patamar e as perspectivas de sucesso de um negócio no País. Outro ponto de atenção dos investidores é o nível de desbancarizados no Brasil, o que significa mercados potenciais a serem explorados.

Veras diz ainda que gestoras nacionais também estão sendo criadas – ou foram recentemente lançadas – para entrar no mercado. Entre elas, está a Headline, do fundador do Buscapé, Romero Rodrigues; a NVA Capital, do ex-XP Marcelo Maisonnave; e a Niu Ventures, do americano Paul Bragiel e Reinaldo Normand. Parte dessas carteiras deve ir para startups que estão começando agora – cerca de 75% dos investimentos atuais estão concentrados nas rodadas iniciais chamadas Pré-seed, Seed e Série A, segundo dados da plataforma Emerging Venture Capital Fellows.

Mercado vê novos investimentos

O novo ciclo de alta da Selic não tem preocupado os gestores de investimento em startups. Para eles, quem investe nesse mercado está olhando o longo prazo e não vai deixar de aplicar nesses ativos para ir para renda fixa. “É um caminho sem volta. O Nubank jogou a barra para cima. Muita gente ganhou dinheiro e isso retroalimenta o ecossistema”, diz o sócio da gestora Iporanga Renato Valente.

Na avaliação dele, nunca foi tão bom empreender. Neste ano, a empresa investiu em dez startups e planeja a captação de um novo fundo no primeiro trimestre do ano que vem. Apesar do aumento dos juros, ele acredita que a liquidez no mercado vai continuar.

Atualmente, um terço da carteira da Iporanga está alocado em fintechs e alguma coisa em educação. Para 2022, diz Valente, a gestora continuará de olho nas startups de finanças. “Com o avanço do open banking e do Pix, muitas oportunidades vão surgir. Mas também vamos analisar startups voltadas para criptomoedas e para o agronegócio, um mercado que ainda não despontou, apesar do potencial.”

Na Astella Investimentos, o sócio Daniel Chalfon também não acredita numa mudança de tendência agora por causa da alta dos juros. Ele destaca que a queda anterior da Selic teve um efeito positivo, que foi trazer investidores que não conheciam esse mercado. “São profissionais que colocam recursos em ativos no longo prazo e não estão procurando renda fixa.”

O ano de 2021, diz o executivo, rendeu uma boa liquidez para o fundo, com a venda da RD Station para a Totvs – a gestora tinha uma participação na empresa. A Astella já captou quatro fundos e tem investimento ativo em 27 companhias. No ano que vem, afirma Chalfon, é possível que uma nova carteira seja montada. “2022 começa com uma perspectiva muito boa, depois de um ano em que todas as métricas bateram recordes.”

O cofundador e presidente do Distrito, Gustavo Araujo, diz que o mercado está crescendo em todas as dimensões, seja em investimentos ou em número de fundos e de novas startups. Segundo ele, a partir de agora o segmento vai começar a conhecer uma segunda onda de fundos de venture capital, que são aqueles mais especializados em algumas áreas, como educação, finanças e varejo. Boa parte desse capital ainda virá do exterior, mas o mercado brasileiro está mudando, com mais investidores conhecendo esse segmento.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.