O mais novo lançamento da Mauricio de Sousa Produções (MSP) é o filme Turma da Mônica: Lições, que estreou nos cinemas do Brasil em 30 de dezembro. O enredo coloca os famosos personagens — Mônica, Magali, Cascão e Cebolinha — em situações complicadas. O quarteto, que se vê em um momento de amadurecimento, tem de se virar para resolver os problemas. Entre as mensagens do longa, há uma que se encaixa bem para a atual conjuntura da empresa do maior desenhista do País: é possível crescer sem deixar de ser criança. É como se a Mauricio de Sousa Produções mandasse um recado para ela mesma. Obviamente que a intenção do filme é se comunicar com o público e a companhia do artista sabe bem onde pisa, valoriza o passado, trabalha no presente e está atenta às tendências do futuro. Mas para uma produtora fundada em 1959 — há 62 anos —, manter o entusiasmo de quando iniciou sua trajetória é um dos desafios.

O outro é se atualizar a cada dia e amadurecer para se manter relevante em um mercado do entretenimento dinâmico, com dezenas de criadores de conteúdo ganhando espaço e invadindo nossos computadores, tablets e celulares a cada minuto. Mauricio de Sousa já aprendeu essa lição e tem dado aula no mundo digital. Apenas no YouTube, são 16 bilhões de views, sendo a maior audiência para Mônica Toy, desenvolvido exclusivamente para a plataforma. “É uma empresa nova a cada dia”, disse à DINHEIRO Mônica Sousa, diretora-executiva da Mauricio de Sousa Produções. “É sobre crescer, mudar e apresentar novidades.”

Há forte engajamento dos fãs nas redes sociais. São 18 milhões de inscritos no canal da Turma da Mônica no YouTube. No Instagram, 1,2 milhão de seguidores, e no Facebook, 1 milhão. Apesar da intensa interação com o público, esses canais servem apenas para fortalecer a marca. Na ponta do processo, abrem caminho para a empresa permanecer em evidência e garantir licenciamentos de produtos, principal linha de negócios da MSP, responsável por 90% do faturamento da empresa — a receita não é divulgada.

LINGUAGEM DIRETA Diretora-executiva da MSP, Mônica Sousa explora temas do cotodiano, como empoderamento feminino, para fortalecer a marca e manter proximidade com o público. (Crédito:Divulgação)

Licenciamentos dos personagens que começaram em 1968, com o Jotalhão estampado na lata de massa de tomate Elefante, da Cica, hoje Cargill. Após 54 anos de parceria, o contrato permanece ativo, em uma das relações comerciais mais longevas do País. Os mais recentes acordos — fora os ligados ao filme Lição — foram firmados em dezembro com a Ipanema, que lançou a coleção de chinelos Turma da Mônica Baby e Infantil, e com a Wickbold, que apresentou minipanetones com os personagens nas embalagens. A produtora bateu a marca de 4 mil itens licenciados. Difícil o consumidor não encontrar um produto com desenho de Mauricio de Sousa em cada um dos corredores quando faz compras no mercado. De alimentos à higiene. De moda a brinquedos.

Mauricio de Sousa atrai marcas tão naturalmente quanto a Magali gosta de melancia. É também de forma natural que se afasta de polêmicas, como Cascão foge do banho. A empresa do desenhista considerado o Walt Disney brasileiro destaca-se por adaptar suas produções, criando novos espaços e personagens, revendo a forma como conduzem suas histórias, avaliou Karin Müller, professora de comunicação e marketing na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fesp-SP), na ESPM e na Metodista. “A preocupação em falar sobre assuntos latentes na sociedade renova a marca, expõe sua visão sobre o mundo e reforça seu propósito”, disse a especialista. “É convidativo para as marcas.”

DIGITAL FORTE Vídeos da Turma da Mônica Toy são produzidos exclusivamente para o YouTube. (Crédito:Divulgação)

É nessa linha que foi criada a personagem Milena, uma menina negra, filha de uma veterinária, que tem ganhado destaque nos quadrinhos da MSP. Mônica, filha de Mauricio e executiva da empresa, afirmou que a personagem nasceu depois de apontamentos feitos em uma audiência da ONU Mulheres, em que um grupo de mulheres negras dizia não se sentir representada pela Mauricio de Sousa Produções. Uma crítica construtiva sobre a companhia que tem Mônica, a do desenho, como um símbolo de empoderamento feminino há décadas. “Ainda existe autoestima baixa das meninas. Temos de fortalecer essas informações para fazer um futuro mais igualitário”, afirmou Mônica, a executiva. “A boneca da Milena chegou a vender mais do que a da Mônica”, disse a profissional que comanda as operações da MSP.

A produtora de Mauricio de Sousa possui vários outros exemplos de diversidade e representatividade, criados há muito tempo, como o Papa Capim (1970), um índio que ensina a cuidar e respeitar a natureza, o Humberto (1981), que não fala, então se comunica em linguagem de sinais, o André (2003), um menino autista, Dorinha (2004), uma garotinha cega, e Luca (2004), um garoto paraplégico.

A MSP também não se furta em entrar nos assuntos cotidianos debatidos em ambiente político. A Tina (1970), uma estudante de jornalismo e modelo, tem sido usada para combater fake news em publicações impressas e nas redes sociais. Outros personagens têm conscientizado o público sobre distanciamento social, uso de máscara, higienização das mãos e a importância da vacinação. “É nossa obrigação”, afirmou Mônica Sousa, ao ressaltar que a MSP cumpre ao longo de sua trajetória o papel de ator da alfabetização e educação informal dos brasileiros. “Temos comunicação direta com as famílias, com linguagem simples, honesta e carinhosa”, disse a executiva, que encabeça o movimento Donas da Rua, em parceria com a ONU Mulheres. Com divulgação de histórias inspiradoras, o projeto trabalha para a eliminação da discriminação contra as mulheres e meninas e pela igualdade de oportunidades.

GARFIELD A MSP lançou ano passado a coleção Horácio Completo, que reúne todos os tabloides (de 1963 a 1992) do dinossauro que ama alface e devaneia sobre filosofia. Dos quatro volumes, dois já estão à venda e outros dois estarão à disposição dos fãs neste ano. A produtora firmou contrato com o Cartoon Network, canal de televisão americano, para veicular desenhos animados com a ºTurma da Mônica Jovem. Episódios das aventuras de Mônica, Magali, Cascão e Cebolinha também estão no HBO Max. Para a mesma plataforma, está sendo produzida pelo selo Graphics MSP uma história do Astronauta para adultos. Estão no forno ainda novos volumes de Franjinha e Magali, Anjinho, a fuxiqueira Denise e Mingau.

E 2022 terá o encontro de dois dos maiores cartunistas do mundo: Mauricio de Sousa e o americano Jim Davis, criador do Garfield. Os dois trabalham no crossover Turma da Mônica & Garfield — O Lápis Mágico, que deve ser lançado pela Editora Panini em fevereiro. A minissérie, de três partes, vai trazer pela primeira vez uma aventura dos personagens do Bairro do Limoeiro com o do gato que ama lasanhas e odeia segundas-feiras. Como isso vai se desenrolar? Só dois gênios dos quadrinhos para responder em forma de arte. Com novos traços e criatividade, em mais uma dessas lições que eles aprendem e ensinam.