uase duas gerações, além dos estilos musicais, separam dois cantores populares brasileiros, o paulista Antonio Pecci Filho e o mineiro Nivaldo Batista Lima, mais conhecidos como Toquinho e Gusttavo Lima. Porém, o autor de “Aquarela” e o intérprete de “Balada” e “Não me arranha” têm algo em comum: ambos vincularam suas composições ao mercado financeiro. Toquinho cedeu seu acervo à Hurst Capital, gestora de ativos alternativos criada pelo advogado Arthur Farache. Já Lima garantiu a receita de seus shows, algo incerto em tempos mais ou menos pós-pandemia, antecipando a venda dos ingresso por meio de uma operação com um fundo de investimentos criado pela empresa de entretenimento Four Even e pela plataforma de serviços financeiros One7. Os dois músicos juntaram-se assim a uma das tendências de mais rápido crescimento no mercado internacional de capitais, os investimentos nos chamados ativos alternativos.

O princípio é simples. Shows de Gusttavo Lima e de Toquinho atraem públicos animados e fiéis, mas os artistas sempre correm riscos. Por exemplo, as autoridades sanitárias podem lançar inesperadamente uma medida de restrição. Se isso ocorrer, o evento é cancelado. Porém, as despesas como locação de espaço e contratação de profissionais – de músicos a seguranças – têm de ser honradas. Para evitar isso, o fundo garante a receita do espetáculo antecipadamente. “O fundo adquire os direitos de venda do show e o comercializa depois. O artista recebe antes o dinheiro de um show que ainda está para acontecer”, disse o principal executivo da One7, João Paulo Fiuza.

Segundo Farache, da Hurst, esses investimentos não são exatamente uma novidade. Em 1983, quando estava gravando “Say, say, say”, o ex-Beatle Paul McCartney aconselhou o parceiro de gravação Michael Jackson a investir parte de sua enorme fortuna em direitos musicais. Dois anos depois, Jackson investiu US$ 47 milhões para comprar os direitos de 251 composições dos Beatles, superando o próprio McCartney. Os royalties ganhos com essas canções salvaram Jackson da bancarrota várias vezes. “Esse tipo de ativo sempre existiu, mas era pouco conhecido no mercado financeiro, pois estava disponível apenas para profissionais do setor artístico ou investidores especializados”, disse Farache. Comprar músicas, ou direitos intelectuais ficou mais popular depois da crise financeira de 2008. Naquele momento, grandes investidores institucionais começaram a buscar alternativas que tivessem menos correlação com as ações e os juros. “O surgimento de plataformas de investimento contribuiu para democratizar esse mercado”, afirmou Farache. É possível comprar algumas notas musicais da sua canção favorita com cerca de R$ 10 mil.