Cada vez que lê notícias sobre a queda da Nasdaq, o empresário Horácio Piva, presidente da Fiesp, lembra-se de uma máxima do investidor Warren Buffett. O investidor americano diz que, todas as noites, dorme tranqüilo por saber que, na manhã seguinte, bilhões de homens se barbearão com lâminas da Gillette, da qual é grande acionista. A brincadeira é uma síntese da crítica mordaz que Buffett sempre fez à euforia em torno da Nova Economia e ao descaso em relação ao mundo das fábricas. Hoje, os americanos se perguntam se o mergulho do país no mundo da tecnologia, em detrimento da produção, foi uma decisão acertada. Ou seja, qual vocação os Estados Unidos devem seguir daqui para a frente?

No Brasil, a pergunta é antiga, mas continua atual pelo simples motivo de que nunca foi respondida. As negociações para criação da Alca carimbaram um aviso de urgência no assunto. ?Nenhum país pode ser bom em todos os campos. Mas nenhum país pode deixar de ser muito bom em algum campo?, diz o consultor Stephen Kanitz. A China manteve os pés cravados na Velha Economia ? e cresce sem parar. A Índia preferiu o outro lado e conquistou fatias significativas no mercado de softwares.

Para uns, o Brasil deve caminhar rumo à Nova Economia, com produção de bens de alta tecnologia, investimentos em Internet e desenvolvimento de softwares. Para outros, a vocação é a indústria tradicional, com fabricação em alta escala, custos baixos e qualidade. ?O Brasil pode ser um país forte em setores de alto conteúdo tecnológico?, diz Júlio Almeida, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). Os números, segundo ele, fizeram opção clara pela Nova Economia. Juntos, os setores de ponta da indústria química, de bens de capital e de eletrônica são responsáveis por um déficit de US$ 12 bilhões na balança comercial. ?É aí que o Brasil tem que investir?, diz Almeida. ?São produtos de alto valor agregado com demanda no mundo.? O problema, diz o economista Luiz Belluzzo, é que ?quebramos elos intermediários da cadeia de produção. Temos matérias-primas e montamos o produto final. Mas os componentes, onde se concentra a tecnologia, não temos.? A lacuna é fruto, em sua opinião, do engessamento do real entre 1994 e 1999. ?Era mais barato importar do que produzir aqui?, diz.

A escolha pela Nova Economia parece tentadora, mas não é unânime. Para Kanitz, o futuro está, por assim dizer, no passado. ?Podemos ser imbatíveis em produtos populares?, diz. Segundo ele, a vocação de um país deve atender, em primeiro lugar, o próprio mercado consumidor. ?Temos uma população enorme com poder aquisitivo para comprar produtos baratos?, diz ele. ?Podemos desenvolver competência nesses itens.? Um exemplo é o automóvel de 1000 cc. ?Viabilizamos a produção em massa do carro popular?, afirma. Há outra vantagem na opção pela Velha Economia, diz Carlos Tilkian, presidente da Estrela. A cada ano, 1,5 milhão de jovens ingressam no mercado de trabalho. ?Devemos absorver esse contingente. A melhor alternativa são setores de mão-de-obra intensiva, como têxtil e calçadista?, diz ele. ?Há caráter de urgência na situação.? É a mesma urgência que o Brasil enfrenta para decidir qual é, afinal, seu papel na economia globalizada ? que não costuma ser tolerante com vacilações.