Para o presidente da empresa líder em bancassurance no País, com receita projetada de R$ 1 bilhão este ano, as fintechs têm papel decisivo para reduzir a concentração bancária e fomentar o empreendedorismo em um ambiente macroeconômico de inflação e juros altos.

Criada a partir da Par Corretora, que por 45 anos vendeu seguros apenas para clientes da Caixa, a Wiz Soluções se desvinculou do banco estatal, au­­mentou seu portfólio de produtos com a oferta de consórcios e tem crescido ao firmar novas parcerias e joint ventures. No primeiro trimestre, o faturamento foi 88,7% maior que o do mesmo período de 2021. À frente da reformulação da estratégia da companhia está o engenheiro Heverton Pei­xo­to, 38 anos, há quatro no cargo de CEO. Nesta entrevista à DINHEIRO, ele falou sobre o que garantiu os bons resultados e destacou as oportunidades que o sistema financeiro pode oferecer para ajudar o País a crescer.

DINHEIRO — A receita da Wiz cresceu 88% no primeiro trimestre deste ano em comparação com 2021. O que esse resultado significa para você?
Heverton Peixoto — Foi a primeira demonstração numérica de tudo o que a gente vem trabalhando nos últimos quatro anos. No final de 2018, assinamos um contrato com a Caixa que mudava completamente a realidade da companhia. Traçamos um plano estratégico de cinco anos para chegar a faturamento anual de R$ 1 bilhão, com a Caixa respondendo por 25% da receita. Definimos que a Wiz seria o conglomerado mais completo do mercado de seguridade, com uma cultura ágil, dinâmica jovem, e que seríamos referência em bancassurance no Brasil. Em três anos, conseguimos entregar 100% do planejamento iniciado em 2019. Está nítido para dentro e para fora da companhia que aquele desenho, que parecia uma loucura, é algo real.

O que foi decisivo para alcançar esse resultado de forma antecipada?
Todo mundo acha que o grande mérito foi do desenho da estratégia de negócio. Isso é um engano. Porque ela era utópica e sofreu muitas adaptações. Nós vencemos pela estratégia de pessoas. Quando redesenhamos nossos valores e atitudes, implementando uma cultura ágil, meritocrata e bastante autonomia, a gente ganhou o jogo. A nossa estratégia de gente tem
um nome: Wiz Way, o jeito de ser Wiz. Isso foi decisivo.

Essa reinvenção seria possível sem a troca de pessoas que ocupavam cargos de direção, como ocorreu na sua gestão?
Nós não temos muito orgulho de admitir que nenhum diretor atual da companhia ocupava cargo de direção há quatro anos. Infelizmente, todos os diretores foram substituídos na atual gestão. Porém, havia muitos talentos em todos os níveis da empresa. Gente boa e boa gente, como bem definiu um dos nossos parceiros. Gente boa por ter alta performance e boa gente por ter bom coração para comprar essa jornada. Isso virou um mantra aqui dentro. O que eu aprendi é que existem pessoas assim em todas as organizações. E que a nossa função como líder não é querer saber como está a grama do vizinho. O mais importante é entender onde estão esses bons corações e permitir que eles assumam a companhia. Ao fazer isso você resolve o problema da atração e da retenção, pois dá oportunidade para quem está na companhia e pode entregar mais.

“Só existe meritocracia se houver as mesmas condições de largada. Isso significa promover a educação e, ao mesmo tempo, dar acesso a produtos financeiros equivalentes aosde quem tem alto poder aquisitivo” (Crédito:Istock)

De que forma isso mudou a sua visão como gestor de pessoas?
Aos 30 anos, ainda com a cabeça de engenheiro, eu acreditava que o importante era o monitoramento, o acompanhamento, o direcionamento. Seguia aquela crença de que o olho do dono é que engorda o gado. Isso é uma falácia. O que faz uma empresa crescer é propósito. A Wiz tem hoje 16 operações independentes, 12 CNPJs que possuem seus próprios CEOS. É humanamente impossível para alguém sentado na minha cadeira querer acompanhar, controlar e comandar todas as pessoas envolvidas nas nossas operações, com 22 mil vendedores. Por isso tiramos essas palavras do nosso dicionário. Não queremos comandado, controle, acompanhamento. Queremos dar direção, suporte e método, para que cada um consiga entregar o seu melhor.

Além das pessoas que ajudaram a alcan­­çar o resultado, a Wiz cresceu a partir de parce­rias, aquisições e joint ventures. Como a empresa atraiu essas oportunidades?
No início desse processo de expansão, lá em 2019, foi muito importante ir ao mercado mostrar as nossas competências, especialmente o nosso DNA de vendas. Hoje, isso mudou muito: a Wiz é buscada pelo ecossistema. E nosso maior filtro para firmar parcerias é a adequação cultural, que engloba valores, o modelo de negócios e o alinhamento de sonhos e desejos. Hoje a gente diz não para muitas empreitadas e projetos. Muito mais até do que os acionistas gostariam. Mas quando a gente diz não para alguma empresa é olhando para as pessoas, para os valores, para a forma como ela pensa.

E quanto às que vocês disseram sim? Quais fizeram diferença para o crescimento da Wiz?
Temos alguns negócios que são muito importantes para os números e para a escalabilidade da Wiz. Por isso são os mais lembrados, caso dos bancos BMG e BRB [Banco de Brasília]. Mas existem outros que foram fundamentais para o nossa trajetória de aprendizado e crescimento. É o caso da LG (Lugar de Gente), nossa sócia na plataforma de soluções de RH ben.up, uma empresa que nasceu agora em abril e que vai mudar a forma como o RH protege, cuida e dá benefícios e seguros para os funcionários. O DNA de cuidado da LG com os clientes é marcante e a ben.up vai deixar um traço na nossa história lá na frente. Por meio dela, os funcionários de qualquer empresa têm acesso a todos os produtos do mercado de seguros e previdência a um custo menor.

A Wiz também firmou parcerias com grandes bancos para a venda de produtos como seguros e consórcios. Quais as vantagens desse modelo?
As parcerias da Wiz com Banco do Brasil, Itaú, Santander e Banrisul têm o foco no não correntista. A gente monta a estratégia de venda de produtos de seguridade e consórcio para clientes que eles não conseguem acessar porque não estão em suas carteiras. É uma tendência, pois quem ficar pescando só no seu aquário vai ser atacado, canibalizado e não vai conseguir se defender. A Wiz possui duas estratégias, com duas empresas, para acessar o não correntista e o correntista, que é a nos­sa prioridade. É aí que gen­te se destaca como referência em bancassurance [termo em inglês que descreve a relação entre um banco e uma companhia de seguros na qual os caixas são pontos de venda e de contato com o cliente]. Ninguém tem o nosso conhecimento em marketing, vendas, tecnologia e nem a estratégia de fazer sociedades. Nossas grandes empreitadas para esse novo bancassurance são as joint ventures com o Grupo Omni [que tem 4 milhões de clientes e encerrou 2021 com uma carteira de R$ 5,5 bilhões] e Paraná Banco [com carteira de R$ 6 bilhões em crédito consignado], anunciadas no primeiro trimestre.

Essas parcerias ajudam a reduzir a concentração bancária, que é tão prejudicial para a economia e para os negócios?
A gente acredita que o nosso país precisa de igualdade de oportunidades. Esse é nosso pilar principal. Nossa pegada social gira em torno disso. Não é assistencialismo. Só existe meritocracia se houver as mesmas condições de largada. Isso significa promover a educação e, ao mesmo tempo, dar acesso a produtos financeiros de forma que as pessoas das classes C, D e E tenham as mesmas condições de quem tem alto poder aquisitivo. Principalmente no acesso ao crédito. Como? Ajudando nossos parceiros a se rentabilizar na oferta de produtos de seguro para que a gente possa reduzir tarifas e o spread de crédito. A Wiz nasceu para dar acesso a seguros, mas já está dando acesso a crédito por meio de operações como antecipação do décimo-terceiro e do saque do FGTS.

“Se as instituições financeiras se modernizarem e conseguirem oferecer outros produtos de que seus clientes precisam, vão melhorar a rentabilidade e reduzir o spread. Isso vai permitir acesso ao crédito” (Crédito:Istock)

Como baratear o crédito em um cenário de juros básicos de quase 13% ao ano?
A primeira coisa que a gente precisa entender é que se as instituições financeiras se modernizarem e conseguirem oferecer outros produtos de que seus clientes precisam, elas vão poder melhorar a rentabilidade e reduzir o spread. É isso que vai permitir o acesso ao crédito. As instituições financeiras buscam retorno. E elas precisam buscar esse retorno oferecendo outros produtos — que podem incluir desde marketplaces de itens de consumo até serviços de telemedicina. O segundo ponto é que o custo do crédito deriva também de inadimplência, riscos e fraude. Quanto mais as instituições financeiras entendam que o mercado segurador consegue mitigar riscos, mais elas estarão protegidas e menor o custo de emprestar dinheiro. Por exemplo: o maior índice de inadimplência do empréstimo consignado é a morte. Só que a morte pode ser protegida por um produto que o cliente tem a possibilidade de contratar, que é o seguro de vida. E o terceiro pon­to é que precisamos de um mercado financeiro mais aberto e mais tecnológico. Open banking e open insurance são expressões que o mercado precisa tirar dos livros e trazer para a prática. Isso vai colocar o cliente no centro e reduzir as taxas de crédito.

O que impede que isso ocorra na prática?
No open insurance ainda carecemos de regulação e da correção de muitas falhas do modelo original, que não foram pensadas para proteger o cliente, algo que se faz urgente. No open banking, existe a necessidade de as instituições abraçarem o tema de verdade e colocar no pilar do cliente. Elas ainda estão esperando que a demanda parta do cliente para que então façam a oferta. Ninguém está oferecendo oportunidade de ganho. Quando isso ocorrer, os ganhos para os clientes se darão tanto em termos de redução de custos quanto na transparência da relação que eles mantêm com o banco.