A alcunha “país do futuro” pode estar desacreditada, mas ainda há muitos que enxergam oportunidades de investimento no Brasil. O francês Laurent Caron, 37 anos, não imaginava que seu futuro profissional estivesse aqui quando curtia a lua de mel no arquipélago de Fernando de Noronha. Era sua primeira viagem ao Brasil e Laurent ainda galgava cargos de liderança na subsidiária espanhola do Google, onde trabalhou de 2007 a 2015. Hoje, ele divide, com o compatriota Gilles Conan, a direção na operação brasileira da indústria alimentícia Norac Foods, dona das marcas Ateliê e Paderrí.

Fundada em 1992 por Bruno Caron, pai de Laurent, a Norac desembarcou aqui em 2012, num saudoso cenário socioeconômico promissor e convidativo. Com uma oferta diferenciada de sanduíches naturais e saladas prontas para o consumo, a Norac encontrou a fórmula para o sucesso aliando sua marca Ateliê do Sabor aos então incipientes supermercados de vizinhança das redes Carrefour Express e Minuto Pão de Açúcar. “Chegamos num momento em que o varejo estava buscando uma oferta para os consumidores que queriam praticidade e produtos mais naturais, para uma dieta balanceada”, diz Laurent. “O investimento que fizemos no Brasil foi o primeiro fora da França”.

O Brasil era um mercado estratégico para uma companhia que ainda tinha pouca penetração mundial, embora já tivesse relevância em diversos mercados da Europa. Em novembro de 2013, a Norac Foods inaugurava uma planta em Ibiúna, interior de São Paulo, que demandou um investimento inicial de R$ 55 milhões. Com área de 9,3 mil metros quadrados, a operação tinha capacidade para produzir 35 milhões de itens por ano. Na ocasião, Bruno, o fundador, afirmou que apenas uma fábrica dificilmente seria suficiente para atender o mercado do estado de São Paulo, com 45,5 milhões de habitantes. O momento da expansão demorou, mas aconteceu. No mês de julho de 2018, a fábrica recebeu uma ampliação de 3 mil metros quadrados. Foram investidos R$ 40 milhões para a construção, instalações e novos equipamentos. “É um investimento grande para o grupo e mostra a aposta que estamos fazendo no País”, diz Laurent.

A aposta é entrar em uma categoria que ainda não tinha sido explorada pela empresa, a de pães e bolos, por meio da marca Paderrí. A estratégia por trás da bandeira inaugural é repetir o sucesso da Ateliê do Sabor, que agora só atende pelo primeiro nome. Nos últimos anos, a Ateliê encontrou um ‘oceano azul’ para navegar nas gôndolas dos supermercados. “Temos uma mudança social importante em curso. Como as pessoas trabalham muito, moram em casas menores e não têm empregada doméstica, ficou natural passar em lojas de conveniência para comer algo depois da jornada de trabalho”, diz Eduardo Terra, presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC). “Isso já acontece muito em países como Japão e Inglaterra”.

Como resposta aos avanços dos aplicativos de entrega, como Rappi, iFood e Uber Eats, os supermercados tradicionais reforçaram ofertas com opções de comidas prontas e saudáveis. “Nós imaginávamos que com a crise e o aumento do desemprego, a categoria de alimentação saudável teria uma retração, já que os produtos eram mais caros e as pessoas comeriam menos fora do lar”, diz Angélica Salado, analista da consultoria Euromonitor. “Mas aconteceu justamente o contrário. E a Ateliê foi uma das marcas que conseguiram puxar essa tendência de refeições prontas e saudáveis.”

DESAFIOS LOGÍSTICOS Com Paderrí, a Norac volta às origens já que, na França, a empresa lidera o mercado de panificação. Ela entra, no entanto, em um mercado extremamente pulverizado e com presença de grandes redes e supermercados com marcas próprias. “É uma nova aventura para o grupo”, diz Laurent. “Esse é um mercado que já existe no Brasil, com atores grandes e estruturados. Mas essa atividade de pães e bolos faz parte do nosso DNA.” Dentre os sete produtos iniciais da marca no País, estão receitas tradicionais francesas como brioche, crepes e o doce ‘madeleine’.

Em março, a nova marca já chegava a 800 lojas, enquanto a Ateliê está presente em mais de dois mil pontos de venda nas regiões Sudeste e Sul. Sobre o faturamento da empresa no Brasil, Laurent desconversa. Diz que cresceu de maneira sustentável ao ritmo de dois dígitos nos últimos anos. A operação global da Norac Foods registrou em 2018 uma receita líquida de € 886 milhões, com 5,7 mil funcionários espalhados por Europa, Brasil e Estados Unidos. Em 2013, em visita ao Brasil, Bruno Caron projetava um faturamento anual acima de R$ 100 milhões para a operação local.

Um desafio para a companhia é crescer nacionalmente devido às complexidades logísticas do Brasil. Com 273 empregados no País, a Norac Foods conta com uma fábrica no interior de São Paulo, um centro de distribuição no Rio de Janeiro e uma frota de 28 caminhões que entregam os produtos diretamente nas lojas. Como os itens da marca Ateliê são perecíveis, com vida útil de apenas uma semana, a empresa foi obrigada a reforçar a operação com veículos próprios. No início deste ano, a companhia buscou um parceiro logístico para levar seus produtos aos três estados do Sul. “Existe um desafio logístico para ganhar escala, principalmente em estados mais distantes das linhas de produção. Esse é o maior desafio para a Norac no Brasil hoje”, afirma Angélica Salado, da Euromonitor. Essa empreitada, no entanto, será menos difícil com Paderrí, que conta com produtos que não são refrigerados. A nova marca mostra que a francesa Norac está empenhada para encontrar, pouco a pouco, a receita para a multiplicação dos seus pães no Brasil.