Não é qualquer homem capaz de bater um rato chamado Mickey. Ou um morcego híbrido conhecido por Batman. Mas na internet não tem para ninguém. Há mais páginas dedicadas ao bigodudo Mario (915 milhões), personagem da Nintendo, do que à criatura da Disney (425 milhões) ou ao homem-morcego da DC (690 milhões). No mundo dos videogames, então… Ali ele apareceu como coadjuvante, em 1981, e só ganhou protagonismo em 1985. No entanto, tornou-se a série mais vendida da história, de acordo com o Guinness World Records, com mais de 600 milhões de unidades. Tal currículo fez Mario ser o maior embaixador da marca Nintendo, gigante japonesa que acaba de fazer 130 anos.

Seu fundador e primeiro presidente, Fusajiro Yamauchi, começou a fabricar cartas de hanafuda, espécie de baralho japonês, em Kyoto. Foi um sucesso. Ao lançar a empresa, dia 23 de setembro de 1889, ele estava perto de fazer 30 anos. Em pouco tempo, na entrada do século 20, a Nintendo já era a maior do país na fabricação das cartas de baralho. Em 1902, foi pioneira ao fabricar modelos de estilo ocidental. O produto, inicialmente pensado para exportação, foi também sucesso no mercado local. Em 1929, depois de 40 anos presidindo a companhia, Yamauchi, que não tinha filho homem, passou o comando para o genro, Sekiryo Kaneda (que posteriormente adotou o sobrenome Yamauchi). Ele vai presidi-la por 20 anos.

Empresas com esse tipo de trajetória são carregadas de resiliência. Em sua vida de 130 anos, a Nintendo mandou bem nos primeiros 60. E depois precisou se comportar com cabeça de startup, apostando muito e errando igualmente muito. Até voltar a ser uma corporação que cultua o universo dos jogos (e é cultuada nele). Essa segunda fase teve à frente outro nome emblemático, Hiroshi Yamauchi, bisneto do fundador. Ao assumir a companhia, no começo de 1950, aos 22 anos, foi responsável por algumas loucuras – a Nintendo entrou no ramo de arroz instantâneo, companhia de táxi e até hotéis de baixa fama e alta rotatividade –, mas também por uma genialidade – inserir a marca no mundo dos brinquedos e jogos eletrônicos. Em 1963.

Foi sob Hiroshi que a empresa lançou na metade dos anos 80 um console (NES) que, em muitos países, fez a marca Nintendo virar sinônimo de videogame. Em dois anos, entre 1985 e 1987, o NES revolucionou a indústria vendendo globalmente 60 milhões de unidades. A partir disso personagens icônicos como Donkey Kong, Zelda e Mario (e seu irmão, Luigi) povoaram casas do mundo inteiro. Todos, aliás, criados por uma lenda dos games, o designer de jogos Shigeru Miyamoto – até hoje membro do board da empresa. Zelda (em 2º) e Mario (1º) foram eleitos há três anos pela publicação Business Insider os dois melhores videogames da história. O terceiro colocado, Pokémon, também pertence à Nintendo.

Hiroshi deixou a presidência em 2002 (morreu em 2013 como um dos homens mais ricos do Japão). Foi sucedido por Satoru Iwata, outro visionário. Com ele a marca lançou os consoles Nintendo DS e Wii, focando numa estratégia que remetia mais aos baralhos do começo da história da empresa do que ao mundo dos videogames: jogos para todas as idades e todos os gêneros. Iwata foi o quarto presidente da companhia em 126 anos, até 2015, quando morreu. Depois dele vieram Tatsumi Kimishima (2015-2018) e o comandante atual, Shuntaro Furukawa.

No relatório da empresa para investidores, a Nintendo se define como companhia que se “dedica principalmente a desenvolvimento, fabricação e venda de produtos de entretenimento”. Traduzindo: cuida do seu business de ponta a ponta. Isso significa investir constantemente em inovação. No último ano fiscal, encerrado em março, a área de P&D usou US$ 632 milhões, cerca de 6% da receita e quase 36% em relação ao lucro. A receita somou US$ 10,9 bilhões (13,7% maior que a do ano anterior) e o lucro líquido foi de US$ 1,7 bilhão (alta de 38%). Ainda assim, ela atua num segmento altamente volátil. “O processo de desenvolvimento é complicado, inclui muitas incertezas e não há garantia de que todos os novos produtos e serviços serão aceitos devido às constantes mudanças nas preferências dos consumidores”, diz seu relatório para investidores. Mas para quem já viveu 130 anos nada parece assustar.
A Nintendo leva os negócios brincando.