Não há espaço para ilusões. Nenhuma das empresas destacadas no Índice de Equidade Racial Empresarial 2021 já chegou lá. Muito longe disso. O grande mérito delas está em dar os primeiros passos (consistentes) de uma jornada que será longa e dura. E fazer isso em corporações que se debatem para entregar resultados não é tarefa modesta. Nesse contexto está a gigante alemã Basf. À frente da área que fomenta e multiplica as ações afirmativas da companhia está Karina Chaves, responsável por diversidade & inclusão para a América do Sul. “Todos somos diversos. O que a gente deve olhar é: quem ficou de fora? E a gente não quer que ninguém fique de fora”, disse à DINHEIRO.

Karina é um moto-perpétuo da questão. Apaixonada e engajada, sabe que processos tão estruturais de mudanças dependem da energia alocada. Não é um problema da Basf, mas de nossa sociedade. “No caso brasileiro, são 300 anos de escravidão e 130 anos de um racismo debaixo dos panos.” Agravado no caso da Basf pelas especificidades de um setor fundamentado nas carreiras Stem (acrônimo em inglês para Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática). Nelas, a presença de negros é mundialmente baixa. “Você olha para o lado, para cima e para baixo e dificilmente vê uma pessoa negra circulando aqui.”

Hoje, 20,7% dos mais de 4 mil funcionários se declaram pretos ou pardos. Eram 17,5% há três anos. A meta é chegar a 30%. Mas na faixa gerencial para cima ainda é de 6,1% (na diretoria chega a 7%). Um processo natural e que leva tempo. Hoje, os processos seletivos já devem ter pelo menos 30% de negros contratados. “É preciso que todas as lideranças entendam.” Porque, como diz Karina, as pessoas que abrem a vaga e contratam, aquelas que tomam a decisão do dia a dia, são o gerente, o coordenador, o supervisor. “Há lideranças muito mais comprometidas que outras.” E será assim mesmo. Essa é a inteligência da jornada.

Por esse motivo há várias frentes de combate à não equidade racial. Uma é a porta de entrada via programas de contratação de estagiários. Talvez seja a batalha menos difícil de todas. Desde 2018, a Basf não só ampliou parcerias com instituições de ensino superior para incorporar jovens profissionais negros — e qualificar internamente lacunas de formação, como o inglês ou processos de mentoria —, como criou o projeto Black Inclusion Group (BIG), formado por negros e não negros, e assim confrontar sem meias palavras a questão racial na empresa.

Para Karina, um passo decisivo é o letramento. “É a capacidade de se comunicar em seu contexto social.” Isso vai fazer com o tema da equidade nunca fique menor. “Há interseções”, disse Karina. “Por exemplo: a meta de 30% vale para mulheres e já atingimos. Mas é preciso fazer os recortes. Mulher preta, mulher trans, não adianta ser somente mulher branca.” Para ser contratada, a entrevista final foi com o próprio Manfredo Rübens, presidente da Basf para a América do Sul. Ela disse que trabalha para que um dia a cadeira dela não precise mais existir. Rübens respondeu que talvez isso demore gerações. Karina discordou e se diz mais esperançosa. “Eu não nasci antirracista. Aliás, descobri meu racismo no meio do caminho”, afirmou. “Por isso é preciso ter ações afirmativas.”

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