No horário nobre da TV, a propaganda traz a promessa de solução para os problemas das empresas que mais sofrerão durante a crise provocada pela Covid-19. Os três maiores bancos privados do País (Itaú, Bradesco e Santander) afirmam compreender as dificuldades financeiras e oferecem ajuda para superar este momento desafiador. No mundo real, pelo menos por enquanto, não é esse o cenário encontrado. O pequeno e médio empresário que pede socorro aos bancos não tem encontrado gerentes prontos a atendê-lo. Pelo contrário, as linhas de financiamento trazem juros ainda maiores, devido ao risco de empréstimos para empresas que logo poderão estar mais fragilizadas. Na terça-feira 31, em carta endereçada ao Banco Central do Brasil, representantes de associações do varejo, shopping centers e lojistas se queixavam do “aumento expressivo” dos juros, que em alguns bancos chega a 70%.

Paulo Solmucci, presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), demonstra a preocupação do setor, um dos mais afetados pelo isolamento social imposto pela Covid-19. “Com os bancos privados, encontramos muitas dificuldades, inclusive aumento da dívida em até 50%”, afirma. No dia 16 de março, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) anunciou que os cinco maiores associados (o que inclui também as instituições públicas Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal) estariam abertos e comprometidos em atender pedidos de prorrogação por até 60 dias de vencimentos de dívidas de clientes pessoas físicas e micro e pequenas empresas para os contratos vigentes, desde que em dia e limitados aos valores já utilizados. “Recebemos depoimentos de empresários que se deparam com a dúvida do gerente em relação à informação. Alguns gerentes disseram não saber da decisão da Febraban”, afirma Solmucci. Ele diz ainda que as negociações com os bancos públicos têm sido mais positivas.

Em uma carta aberta aos “senhores banqueiros”, assinada pelo “setor de bares e restaurantes”, o tom é de súplica: “Estamos pedindo ajuda real, verdadeira, que nos levante sem nos subjugar, que nos dê força e dignidade”. O apelo prossegue com uma lista de pleitos: crédito para capital de giro, taxas próximas à Selic, carência de um ano para o primeiro pagamento e prazos acima de 48 meses.

Questionada pela reportagem de DINHEIRO sobre as práticas adotadas por seus associados, a Febraban respondeu por meio de nota que “cada banco define, a partir de critérios próprios, quais linhas de crédito serão passíveis de prorrogação”. Também fica a cargo de cada instituição as definições do processo para solicitação de renegociação, os juros praticados e demais detalhes, incluindo prazos e carências.

Apesar dos relatos de dificuldades dos empresários, os gigantes do setor financeiro se defendem, afirmando que há certo exagero no tom das queixas. O Bradesco informou que está à disposição para prorrogar por 60 dias as prestações de financiamento de seus clientes, que a taxa de juros inicialmente contratada será mantida e que haverá a cobrança proporcional dos juros para o período restante da operação. O Itaú Unibanco divulgou que recebe mais de 10 mil solicitações diárias e que já prorrogou mais de 140 mil contratos de crédito para pessoas físicas e jurídicas desde o anúncio da medida. Já o Banco do Brasil está prorrogando o pagamento das duas próximas parcelas, que serão migradas para o final do cronograma do financiamento.

André Friedheim: Para o presidente da Associação Brasileira de Franquias, a solução para encontrar juros menores pode estar nas fintechs. (Crédito:kandrade )

Para a Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), não está definido como as agências vão se conectar com a instituição bancária para efetivar uma renegociação. A entidade também entende que será necessária a criação de um fundo garantidor de crédito para atender a todo o setor empresarial. “O ideal era o Tesouro e o Banco Central poderem comprar títulos de empresas privadas, assim como está acontecendo nos EUA”, diz Fernando Pimentel, presidente da Abit. Para ele, essa medida consegue ajudar na liquidez bancária para garantir a sustentação da empresa endividada. A ideia parece fazer sentido até para a autoridade monetária. O Banco Central informou que será enviada ao Congresso Nacional uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para dar ao BC o poder de fazer diretamente compras de títulos privados, sem a necessidade de intermediação por uma instituição financeira.

“O ideal era o Tesouro e o Banco Central poderem comprar títulos de empresas privadas, assim como está acontecendo nos Estados Unidos” Fernando Pimentel, Presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil.

FINTECHS Enquanto uma solução com os bancos tradicionais não evolui, o vácuo pode ser preenchido por organizações menores e mais inovadoras, caso das fintechs. A Associação Brasileira de Franquias (ABF) recomenda buscar um diálogo com as instituições e priorizar a gestão do caixa, ao mesmo tempo em que se buscam alternativas. “A ideia é tentar manter a operação ativa mesmo que de forma parcial e, dependendo do porte da operação e estrutura do negócio, as fintechs e alternativas de crédito privado podem também servir como opções”, afirma André Friedheim, presidente da ABF.

O Conselho Monetário Nacional (CMN) autorizou as fintechs a conceder empréstimos com recursos do BNDES e emitir cartões de crédito. As mudanças valem para sociedades de crédito direto (SCD) e as de empréstimo entre pessoas (SEP). Como não há uma previsão de quanto tempo a crise vai durar, a tendência é que as fintechs também passem pelo obstáculo financeiro de dar liquidez a toda a demanda. Desde o dia 26 de março, as fintechs também podem ceder carteiras para outros fundos além dos fundos de direito creditório (Fidcs). Num momento de crise tão acentuada como a que estamos vivendo, toda ajuda é mais do que desejada. É necessária.

Paulo Solmucci: O presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes diz ter dificuldade em negociar com bancos privados. Segundo ele, muitos ainda desconhecem recomedações da Febraban. (Crédito:Divulgação)