Uma olhada no site da Cúpula das Américas, que vai até a sexta-feira (10) em Los Angeles, EUA, torna evidente que o tema “Construindo um futuro sustentável, resiliente e equitativo” foi levado a sério pelos curadores do evento. Assuntos como resiliência climática, biodiversidade, inclusão social e governança dominam a agenda. É para esse evento que o presidente Jair Bolsonaro e seus asseclas embarcaram a bordo do Airbus A330 da Força Aérea Brasileira na quarta-feira (8). Antes mesmo de chegar ao destino, o presidente já havia encarnado o vilão do encontro.

Se a imagem do Brasil já era ruim devido ao avanço do desmatamento e a outros crimes ambientais, agora a situação ficou ainda mais crítica com a notícia do desaparecimento do indigenista Bruno Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips, colaborador do The Guardian. Como nada no Brasil de ultimamente é tão ruim que não possa piorar, a fala de Bolsonaro afirmando que ambos podem até ter sido executados mostra o descompromisso do governante com a empatia, com a vida humana e, claro, com as questões ambientais.

Biden quebra o gelo com Bolsonaro na Cúpula das Américas

Para os brasileiros, nada disso é novidade. Não há nada no E (ambiental), no S (Social) e no G (Governança) que Bolsonaro preze ou respeite minimamente.

Na agenda ambiental, o desmanche e a politização das entidades de proteção ambiental como Ibama e ICMBio são bastante graves, mas não chamam tanta a atenção internacional como a série de crimes ambientais. Na lista, ataques a indígenas, mineração ilegal e desmatamento desenfreado da floresta Amazônica. Assuntos que eram acompanhados de perto por Bruno e Dom, agora desaparecidos. Ao jornalista inglês, por sinal, Jair Bolsonaro respondeu com a sua grosseria habitual quando perguntado sobre como o governo brasileiro mostraria para a Europa uma preocupação séria com relação ao meio ambiente. “Primeiro você tem que entender que a Amazônia é do Brasil, não é de vocês”. E emendou que “nenhum país do mundo tem moral para falar da Amazônia”. E não respondeu à pergunta.

Para o pilar social, os índices são igualmente desastrosos. No País que exporta mais de US$ 120 bilhões (2021) em alimentos, 33 milhões de pessoas estão passando fome, das quais 14 milhões entraram para a estatística no último ano. Os dados fazem parte do relatório Olhe para a Fome, divulgado pela rede Penssan com apoio da Oxfam Brasil e outras organizações na quarta-feira (8). Dentre as razões apontadas estão o aprofundamento da crise econômica, segundo ano da pandemia de Covid-19 e a continuidade do desmonte de políticas públicas que promoviam a redução das desigualdades sociais da população.

Por fim, nem mesmo em governança o Brasil chega com alguma moral à Cúpula das Américas. Em uma prometida reunião com o presidente Joe Biden o assunto será a democracia brasileira e as eleições deste ano. Na pauta, a preocupação americana com os sucessivos ataques proferidos por Bolsonaro ao sistema eleitoral brasileiro, reconhecido, até agora, como um dos mais seguros do mundo.

Cabe ao Brasil a vergonha de ser representado por um chefe de Estado que encarna, por vontade própria, a figura do presidente anti-ESG.