Com dólar a R$ 5,40 na máxima do dia, o Ibovespa mais uma vez não conseguiu aproveitar a carona do exterior, com o refluxo da aversão global a risco levando S&P 500 e Nasdaq a novas máximas históricas intradia – pico renovado também no fechamento para o índice de tecnologia -, em sessão positiva desde cedo nos mercados da Europa e da Ásia.

Refletindo fatores internos, associados ainda à perspectiva para o fiscal em meio ao acirramento de crise política e institucional, o índice de referência da B3 caiu 0,49%, a 117.471,67 pontos, entre mínima de 117.062,04 e máxima de 118.445,18, saindo de abertura a 118.052,54 pontos nesta segunda-feira. No ano, acumula agora perda de 1,30%, cedendo 3,55% em agosto. O giro financeiro ficou em R$ 30,8 bilhões na sessão.

“Os mercados lá fora estiveram animados, com alta desde a sessão da Ásia, após o governo chinês informar não ter havido novos casos de coronavírus no país. Entre as commodities, grande destaque para a recuperação dos preços do petróleo. O evento mais aguardado da semana virá na sexta-feira, com o encontro anual de Jackson Hole, do Federal Reserve”, diz Bruno Madruga, head de renda variável da Monte Bravo Investimentos.

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Na China, foi a primeira vez desde julho que não houve nenhum caso local de covid-19, “o que mostra uma possível estabilidade no surto da doença”, diz Túlio Nunes, especialista de finanças da Toro Investimentos, chamando atenção também, no país, para “avanços nas aprovações de abertura econômica, após polêmicas no que tange à regulação”.

Nesta segunda, com alta acima de 5% para o Brent e o WTI, o desempenho positivo de Petrobras (ON +3,35%, PN +1,58%), assim como das ações de grandes bancos (Santander +1,34%, Itaú PN +1,07%), contribuiu para que uma correção mais forte no Ibovespa fosse evitada na contramão do exterior. Na ponta negativa do Ibovespa, destaque para queda de 6,08% em Lojas Americanas, à frente de Americanas ON (-4,25%) e de Eneva (-4,21%). Na face oposta, Embraer subiu 5,28%, CVC, 4,39%, e PetroRio, 3,61%.

Aqui, o enfraquecimento político do governo mantém o mercado na defensiva quanto ao fiscal, em meio a uma reforma de IR polêmica – com votação remarcada para esta semana na Câmara, após adiamentos – e formação, hoje, de uma frente de governadores contra ameaças percebidas à democracia.

Nesta segunda-feira, o governador de São Paulo, João Doria, afastou um comandante da PM por simpatia aos apelos por insurgência, fator que deve ganhar relevância à medida que se aproxima o 7 de setembro, especialmente tensionado este ano pelo acirramento da disputa entre o presidente Bolsonaro e a cúpula do Judiciário. “Investidores locais mantêm o foco na crise de confiança instalada pelo presidente Jair Bolsonaro e por temores de piora das contas públicas com as eleições no ano que vem”, observa em nota a equipe de análise da Terra Investimentos.

“A taxa de câmbio está precificando muito mais o risco político, o risco fiscal. Se esses riscos forem atenuados, o que não é muito visível nesse momento, a taxa de câmbio tenderia a valorizar um pouco, mas por enquanto o cenário ainda está em fase mais difícil. Estamos num ponto de inflexão, um ‘turning point’ no cenário econômico: aquele cenário que era de expectativa por crescimento maior, principalmente no quarto trimestre, ainda existe, mas está perdendo intensidade”, diz Nicola Tingas, economista-chefe da Acrefi (Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento).

Em participação em evento nesta segunda-feira, o ministro da Economia, Paulo Guedes, reconheceu que o ambiente de antecipação das eleições prejudica a economia, causando muito barulho, mas nenhum fundamento, segundo ele, indica que o País esteja fora de controle. “Espero que excessos de uma parte ou de outra sejam moderados. Precisamos moderar os excessos para garantir a recuperação econômica, que está praticamente garantida. Muito tem se falado do déficit, sobre a possibilidade de descontrole fiscal, mas os fundamentos continuam indicando que estamos fazendo o trabalho certo”, disse o ministro.