Embora não saibam exatamente o porquê, cada vez mais cientistas acumulam evidências de que a Sonata para Dois Pianos em Ré Maior de Mozart (conhecida como K448) ajuda a reduzir a atividade elétrica cerebral associada à epilepsia. Agora, um novo estudo publicado na revista acadêmica Scientific Reports confirma essa associação.

A equipe de pesquisadores analisou a hipótese de que ouvir a K448 por apenas 30 segundos poderia ativar redes neurais associadas a respostas emocionais positivas à música, reguladas pelo córtex frontal. Em caso positivo, a ativação dessas redes poderia contribuir na redução dos picos de atividade elétrica associados à doença entre pacientes com epilepsia refratária — forma da doença que é resistente a medicamentos.

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A forma refratária da epilepsia atinge cerca de um terço dos portadores do mal — que, ao todo, são 1% da população global. Além de convulsões e suas comorbidades associadas, pessoas com epilepsia também apresentam descargas epileptiformes interictais (IEDs), que são sinais biológicos identificadores da doença associados à frequência das crises e ao comprometimento da cognição.

As IEDs surgem do disparo sincronizado de neurônios envolvidos em redes epilépticas. Assim, as intervenções relacionadas com IED podem fornecer informações sobre novas terapias para epilepsia e suas comorbidades relacionadas. Uma delas, com boas evidências acumuladas, é o uso da música como uma forma não invasiva e não farmacológica de neuromodulação (regulação da atividade neural).

Mais estudos
Apesar de o estudo norte-americano ter trazido esperanças para o aperfeiçoamento de técnicas de tratamento da epilepsia com base em novas informações sobre a atividade neural dos pacientes, os autores destacam que muito ainda precisa ser estudado para que os dados possam ser usados. “Acredito que entender melhor como o cérebro reage à música fará com que, futuramente, possamos pensar nela como uma possibilidade de intervenção, não sozinha, mas incorporada a técnicas já utilizadas”, adianta Charyton.
Christian Muller, especialista em neurologia infantil e médico do Hospital Santa Lúcia, em Brasília, acredita que o trabalho é interessante, mas ainda precisa responder a mais perguntas. “O que eles mostram é uma alteração na onda cerebral que leva à convulsão, porém não tem como prever como serão essas alterações. Precisamos de mais pesquisas para saber como isso pode ser usado em tratamentos, de que modo traria resultados para evitar as convulsões”, destaca.
Muller também frisa que estudar a música e o efeito dela no organismo pode render muitos frutos, principalmente para resolver problemas relacionados ao cérebro. “Fica difícil definir essa pesquisa como boa ou ruim, mas o estudo é interessante principalmente por abordar esse tema que tem sido bem explorado na área médica, a musicoterapia. Trata-se de um recurso rico, utilizado também em tratamentos para dor” exemplifica.