Os serviços de entrega do iFood dispararam desde que as medidas de isolamento social decorrentes da pandemia de Covid-19 obrigaram o fechamento de restaurantes. O que poderia ser uma ótima notícia para Movile, controladora do iFood, está sendo visto com cautela. Com as restrições impostas pela atual conjuntura, a empresa revisou suas prioridades, que agora estão resumidas nestes três pontos: a saúde de colaboradores, parceiros e clientes; a sustentabilidade do negócio; e a liderança nas ações para minimizar os impactos da pandemia na sociedade.

Recém-anunciado como novo CEO da companhia, Patrick Hruby, que já passou por empresas como Google e Facebook, assume em um momento delicado. “Temos duas crises em paralelo, uma de saúde e outra econômica, então a incerteza é alta”, afirmou à DINHERO logo após assumir o comando da Movile. O executivo diz que os planos e as ambições de longo prazo continuam no radar. Mas estão em modo de pausa no momento. O foco agora é outro. “O problema é que temos de tomar 100% de decisões com 50% das informações.”

Além do iFood, estão sob seu guarda-chuva na Movile a Playkids (plataforma de conteúdo infantil), Sympla (promoção de eventos), Wavy (serviços de conexão e mensagens) e as fintechs Zoop e MovilePay. Antes de ser anunciado como comandante da companhia, Patrick passou cinco meses como executive in residence, conhecendo todas as unidades de negócios para se aprofundar em suas operações.

Bagagem não falta. Ele já trabalhou na Deloitte e ExxonMobil antes de permanecer sete anos no Vale do Silício durante seu contrato com o Google. Na gigante de Mark Zuckerberg, outros sete anos como vice-presidente de vendas de pequenas e médias empresas para América Latina. A experiência atualmente é usada para enfrentar uma situação imprevisível. “Qualquer um que fale que consegue prever o que vai acontecer nos próximos três meses está equivocado”.

O CEO reuniu os 4 mi funcionários da Movile em teleconferência na semana passada para comunicar as novas diretrizes. Prioritariamente, cuidar da saúde dos trabalhadores, de seus familiares e dos parceiros. Colocou milhares de colaboradores em home-office. E, no caso do iFood, atenção especial aos entregadores, que receberam álcool em gel e material informativo. São 140 mil por meio de operadores logísticos (terceirizados), além dos mais de 200 mil que atuam diretamente nos restaurantes. Houve aumento da demanda por entregas desde a segunda quinzena de março. Mas a empresa vê como consequência do momento, não uma oportunidade, já que será difícil manter esse crescimento depois que passar a pandemia.

Em segundo lugar nas prioridades da Movile está a sustentabilidade do negócio. As contratações estão paralisadas. A despesas não essenciais também. Por outro lado, não há cortes previstos. “Estamos em período crítico, em que não sabemos o futuro. Temos de ter forte cuidado”, disse.

O terceiro pilar da companhia atualmente é assumir papel de liderança em seu ecossistema para minimizar o impacto econômico e social. Afinal, está em jogo também a sobrevivência da própria Movile. Para manter saudável sua cadeia de relações, a companhia fez parceria com o Itaú e com a Rede e criou um fundo de R$ 2,5 bilhões para antecipar os recebíveis aos bares, lanchonetes e restaurantes. Assim, colabora para atenuar o fluxo de caixa desses empreendedores.

PRIORIDADE NA SAÚDE: Entregadores do iFood, startup que registrou forte aumento na demanda desde o início da pandemia, estão recebendo atenção especial da empresa, com material informativo e álcool gel para evitar contágio. (Crédito:Newton Menezes)

FUNDOS Para os entregadores parceiros independentes, o iFood criou dois fundos solidários, mas o dinheiro é bem menor. Somam R$ 2 milhões: R$ 1 milhão para dar suporte àqueles que necessitem permanecer em quarentena; e outro R$ 1 milhão para atender a necessidade grupos de risco em permanecer em isolamento, pois os entregadores com mais de 65 anos e outros mais expostos têm a conta automaticamente inativada durante 30 dias. A startup também disponibilizou gratuitamente um plano de vantagens em serviços de saúde — com descontos de até 80% em clínicas médicas, laboratórios e farmácias.

“Estamos mais presentes na sociedade para conseguir atravessar essa crise. Tem a questão social e de sustentabilidade, mas tem a manutenção da estrutura do negócio”, afirmou. “O que fazemos agora vai ajudar a definir que empresa vamos ser quando sair dessa crise e que sociedade vamos habitar.”

O sonho da Movile, de impactar 1 bilhão de pessoas no mundo com suas plataformas, continua. O objetivo de ser uma companhia brasileira que pode fazer frente a gigantes do exterior também permanece. O foco na inovação, em negócios que tenham Inteligência Artificial em seu DNA, os investimentos nas fintechs, o olhar ativo em novidades dos setores de educação e saúde também permanecem. Mas isso tudo fica para depois. Agora, a marca está em modo pause. Vai apertar o play assim que o coronavírus for deletado. “E quem sabe transformar a Movile numa emprega global de tecnologia. Mas antes temos de passar por esse momento difícil.”