O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes aplicou uma nova multa de R$ 2,6 milhões contra o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) na quarta-feira (20). Com a nova punição, noticiada pela colunista de O Globo, Malu Gaspar, o parlamentar já soma R$ 4,3 milhões em multas. De acordo com Moraes, ele teria desrespeitado as medidas cautelares impostas pelo STF 175 vezes ao não usar tornezeleira eletrônica e ao conceder entrevistas sem autorização judicial, por exemplo.

O caso é polêmico porque Silveira, que é aliado de Jair Bolsonaro (PL), recebeu um indulto individual (ou graça) do presidente após ter sido condenado a 8 anos e nove meses de prisão por incitar violência exatamente contra os ministros do STF. Isso gerou uma espécie de queda de braço entre os poderes Executivo e Judiciário, representados por Bolsonaro e Moraes, respectivamente.

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Em sua decisão, Moraes afirma que Silveira ainda pode ser condenado a pagar multas porque elas têm relação com o desrespeito a medidas cautelares impostas pelo STF. “As condutas do réu, que insiste em desrespeitar as medidas cautelares impostas nestes autos e referendadas pelo plenário do STF, revelam o seu completo desprezo pelo Poder Judiciário, comportamento verificado em diversas ocasiões e que justificam a fixação de multa”, afirmou o ministro na nova decisão.

Para Guilherme Suguimori Santos, advogado criminalista pela Universidade de São Paulo (USP) e sócio do escritório Vilutis, Abissamra e Suguimori, existem duas questões fundamentais.

“A primeira é a manutenção das cautelares, mesmo após a graça concedida pelo presidente. O decreto presidencial e o instituto do indulto individual (a graça) estão sendo questionados judicialmente por partidos de oposição. Isso irá provocar uma discussão sobre os limites do perdão presidencial e da discricionariedade desse tipo de ato”, afirma Suguimori. “Além disso, a defesa de Daniel Silveira vem pedindo ao Supremo que reconheça a extinção de punibilidade e revogue as cautelares de forma retroativa, extinguindo as multas, mas a corte vem reafirmando que, até que exista decisão final sobre a validade do decreto presidencial, serão mantidas todas as cautelares impostas a Daniel Silveira na ação penal 1044“, completa.

Ou seja, mesmo com a graça concedida ao parlamentar, o STF entende que os efeitos das cautelares devem continuar e que qualquer violação ao seus temos está sujeita à aplicação de punições.

“A segunda é o efeito que a graça teria em relação às multas aplicadas pelo descumprimento das cautelares, já que elas não são relacionadas à pena imposta à Silveira, mas à violação das medidas impostas durante o processo. Por isso, o STF vem entendendo que, mesmo com a graça (o que extingue a pena de prisão), as multas seguem válidas. Isso porque o perdão presidencial, ainda que seja considerado válido, não retira o caráter ilícito dos fatos nem faz desaparecer a condenação. Embora deixe de cumprir a pena imposta, a graça não declara inocente a pessoa que a recebe, ou seja, não é equivalente a uma absolvição”, afirma Suguimori.

O advogado criminalista, no entanto, avalia que deve existir uma proporcionalidade entre a medida cautelar imposta e as multas aplicadas no caso de seu descumprimento com a sanção que seria aplicada ao final do processo, assim como o poder aquisitivo do acusado. “Por isso, parece certo que o Supremo será obrigado a discutir o ‘agigantamento’ resultante do acúmulo das diversas multas, avaliando sua proporcionalidade e razoabilidade”, conclui Suguimori.

Aplicação de multas no processo penal

Outro aspecto interessante deste caso é que, via de regra, as multas aplicadas pelo descumprimento de cautelares nos processos penais são bastante raras, de acordo com o advogado criminalista Bruno Salles Ribeiro.

“Existem dois tipos de multa. Uma pela sentença penal condenatória, que é um dos três tipos de pena (privativa de liberdade, restritiva de direito e multa), e outra pelo descumprimento de decisão judicial, chamada no processo civil de astreinte. A graça concedida ao Daniel Silveira só atinge a pena aplicada, não tem o condão de interferir na multa anterior, que dizia respeito ao não cumprimento de decisão judicial, sendo esse o entendimento de Moraes”, afirma Ribeiro.

Além disso, ele afirma que, normalmente, as multas aplicadas em processos penais são destinadas do Fundo Penitenciário Nacional. “Mas isso em relação à multa aplicada como pena. Sobre a multa aplicada como sanção pelo descumprimento de decisão, não há uma regra específica. Em regra, o descumprimento da medida cautelar acarreta na decretação da prisão daquele que descumpre, não a aplicação de uma multa”, conclui Ribeiro, o que torna o caso ainda mais singular.