México e Estados Unidos vão lançar um novo acordo de cooperação antidrogas em face da fracassada ofensiva militar implantada há 13 anos. O anúncio será feito durante uma visita ao país vizinho do secretário de Estado americano, Antony Blinken.

O novo acordo substituirá a Iniciativa Mérida, encerrada pelo presidente de esquerda Andrés Manuel López Obrador. Segundo ele, o país não quer mais armas, nem helicópteros, para subjugar os poderosos cartéis.

No cargo desde 2018, López Obrador pede investimentos em comunidades carentes expostas ao crime, uma política que também seria uma forma de conter a crescente migração em condição ilegal para os Estados Unidos através do México.

O pacto “marca um novo começo” e “desafia nosso governo a criar as condições para a prosperidade”, disse uma autoridade americana na quinta-feira (7), sem detalhar o alcance do acordo.

No âmbito da Iniciativa Mérida, Washington desembolsou US$ 3,3 bilhões em assistência militar e serviços de consultoria.

O objetivo é “aproveitar o trabalho que realizamos no passado e trazê-lo para uma era moderna”, disse a mesma fonte, referindo-se ao “Marco Bicentenário México-Estados Unidos para Segurança, Saúde Pública e Comunidades Seguras”.

– Estratégia fracassada –

Após um café da manhã com López Obrador, Blinken se reunirá com o chanceler mexicano, Marcelo Ebrard, para selar o acordo durante o primeiro Diálogo de Segurança de Alto Nível.

Isso culminará dez meses de discussões sobre medidas contra o crime transfronteiriço, segundo o governo do presidente Joe Biden, que vincula esses esforços ao respeito pelos direitos humanos. Este é um ponto crítico no México, devido às inúmeras violações cometidas durante a guerra às drogas.

“A prioridade no México é reduzir os homicídios e a violência”, afirmou Ebrard antes da visita.

Desde 2006, o México, país de 126 milhões de habitantes, acumulou mais de 300.000 assassinatos, a maioria atribuídos ao crime organizado, e cerca de 90.000 desaparecidos.

Os Estados Unidos garantem, no entanto, que a Iniciativa Mérida fortaleceu a cooperação, o profissionalismo e a transparência das agências mexicanas de aplicação da lei.

“O objetivo de forjar uma nova estratégia comum não será fácil”, disse à AFP o presidente do “think tank” Inter-American Dialogue, Michael Shifter, para quem a Iniciativa Mérida estava “morta”.

“Se medido em função da redução do tráfico de drogas e da violência no México, ou do fluxo de armas dos Estados Unidos, claramente fracassou”, avaliou.

– Boas intenções –

No início de agosto, o governo mexicano processou nove grandes fabricantes e dois distribuidores de armas por comércio “negligente e ilícito” que incentiva o tráfico de drogas e a violência em seu território.

O México afirma que entre 70% e 90% das armas ilegais apreendidas são procedentes dos Estados Unidos.

No novo plano, Washington se compromete a “trabalhar para enfrentar o fluxo de armas para o México”, disse a autoridade americana.

O México afirma que as políticas antidrogas aplicadas até agora não surtiram os resultados esperados.

“O objetivo principal que se teve por muitos anos foi capturar os narcotraficantes, e o que aconteceu?”, apontou Ebrard.

A nova abordagem enfatiza, no entanto, que a perseguição de criminosos continuará.

A queda de grandes barões como Joaquín “El Chapo” Guzmán causou a fragmentação dos grandes cartéis em múltiplas gangues que agora dependem de um “portfólio criminoso mais diversificado”, diz o centro de pesquisas Insight Crime.

O crime organizado não só aproveita os mais de 3.000 km de fronteira para fornecer drogas ao maior mercado consumidor do mundo, como também está envolvido no tráfico de armas e de pessoas, roubo de combustível, sequestro, extorsão, lavagem de dinheiro e corrupção de autoridades.

Os esforços conjuntos foram afetados pela pandemia da covid-19 e por episódios como a captura nos Estados Unidos, em outubro de 2020, do general Salvador Cienfuegos, ex-ministro da Defesa mexicano, por supostos vínculos com o tráfico de drogas.

Após um acordo incomum, Washington deportou Cienfuegos ao México e entregou supostas provas contra ele para um eventual julgamento, mas o Ministério Público mexicano as indeferiu em meio às acusações de López Obrador de que a DEA (na sigla em inglês) havia fabricado as provas.

Posteriormente, o governo promoveu uma reforma que limitou a atuação de agentes estrangeiros no México.

Cauteloso ante o discurso pró-legalização das drogas, López Obrador acredita que os Estados Unidos poderiam apoiar seus programas de desenvolvimento em comunidades vulneráveis.

Embora as tensões orçamentárias em Washington tenham atrapalhado essa meta, o México desempenha um papel fundamental na contenção da crise migratória que complica a vida de Biden. López Obrador poderia tirar proveito dessa situação em outras questões, diz Shifter.