Os assassinatos representam hoje quase a metade (47,8%) das causas de morte de jovens de 15 a 29 anos no Brasil. E a taxa de homicídios por 100 mil pessoas nessa faixa etária cresceu 17,2% entre 2005 e 2015, após ter começado a apresentar sinais de estagnação na década passada. Nos últimos dez anos, 318 mil jovens foram vítimas de homicídio no País – o que corresponde a mais de três casos por hora.

Essas são algumas das constatações do Atlas da Violência 2017, relatório do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que toma por base o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde.

Segundo o levantamento, em 2015 aconteceram 31.264 homicídios de jovens no Brasil – e esse é o fator preponderante para as mortes desse público, ante outras causas, como acidentes de trânsito e doenças em geral. Os pesquisadores destacam que até a década passada parecia que essa tendência de vitimização juvenil vinha perdendo força, uma vez que entre 2000 e 2010 o incremento na taxa de mortes havia sido de 2,5%, ante 20,3% nos anos 1990 e 89,9% em 1980. “Contudo, os últimos dados disponíveis nos mostram um recrudescimento do problema”, descreveram os especialistas.

Vulnerabilidade social, explicitada também pelas deficiências na educação básica, ajudam a entender o cenário, dizem os pesquisadores. “Relega-se à criança e ao jovem em condição de vulnerabilidade social um processo de crescimento pessoal sem a devida supervisão e orientação, e uma escola de má qualidade, que não diz respeito aos interesses e valores desses indivíduos. Quando o mesmo se rebela ou é expulso da escola, faltam motivos para uma aderência e concordância deste aos valores sociais vigentes e sobram incentivos em favor de uma trajetória de delinquência e crime.”

A porcentagem de homicídios como causa de morte entre os jovens sobe ainda mais se o recorte for feito para pessoas de 15 a 19 anos: 53,8%. “O que se observou nos dados é um futuro da nação comprometido”, escrevem os pesquisadores. A taxa de assassinatos na faixa etária é de 60,9, ante 28,9 da média brasileira geral.

Por Estado, o quadro é considerado heterogêneo, com São Paulo conseguindo reduzir 49,4% dos homicídios de jovens entre 2005 e 2015, enquanto no Rio Grande do Norte a elevação registrada foi de 292,3%. Ainda sem solução permanece o caso de Luiz Ivan Bezerra de Araújo. Paraplégico, ele foi morto aos 28 anos, na porta de casa, na periferia de Natal. Luiz Ivan integra o grupo de homens negros, pobres e sem acesso à educação regular. Sem emprego fixo, passou a consumir drogas e suspeita-se que ele também traficava. “Os assassinos não foram presos até hoje. O inquérito foi concluído, mas ninguém acabou indiciado. É um crime sem solução, que deixou marcas em nós, que ficamos vivos”, disse o irmão da vítima, Rafael Araújo.

Perto dos 60 mil

A análise do Ipea confirmou os números totais de homicídios em 2015: 59.080 – uma leve queda ante os 60.474 registrados em 2014, mas com 2 mil casos a mais ante 2013. Uma média estimada do que se mata no País em três semanas chega a ser mais elevada do que todos os ataques terroristas somados no mundo nos primeiros cinco meses de 2017, que deixaram 3.349 vítimas.

O cenário é classificado como uma “tragédia diária de contornos inimagináveis”. “Tal índice revela, além da naturalização do fenômeno, um descompromisso por parte de autoridades nos níveis federal, estadual e municipal com a complexa agenda da segurança pública.”

População negra é a mais afetada

“A gente sabe que a violência tem cor também. O negro é o que está mais vulnerável. De cada 100 homicídios, 71 são de negros”, apontou a diretora executiva do Fórum, Samira Bueno. “Tem outro fator: a taxa de homicídios entre não negros caiu 12,2%, enquanto que a de negros aumentou 18,2%.” O relatório mostra que 111 municípios, 2% do total, respondem pela metade dos assassinatos em todo o território; 10% das cidades concentram 76,5% das mortes.

O Ministério da Justiça informou que “auxilia Estados e municípios com medidas de coordenação”, além de recursos financeiros, e disse que os Estados têm uma “parcela muito grande” em fornecer a segurança no modelo federativo vigente, mas diante do avanço da criminalidade tem atuado também na área de integração. O ministério acrescentou que há necessidade de modificação na legislação, além da integração de banco de dados e inteligência policial. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.