Por Lisandra Paraguassu

BRASÍLIA (Reuters) – O texto do acordo entre Mercosul e União Europeia está sendo avaliado pelos quatro países do bloco sul-americano e pelos europeus, e não há ainda uma decisão sobre se será ou não assinado como foi fechado em 2019, ainda sob a Presidência, no Brasil, de Jair Bolsonaro, mas há o temor de, se houver a decisão de revisão formal, o acordo volte mais uma vez à estaca zero.

“Tudo tem que ser examinado, e é muito complexo, não é um acordo simples. Tem que ser examinado, tem que ser visto, tem que ser avaliado. Isso leva tempo, não se faz da noite para o dia. Se o acordo for julgado positivo, se ele for um acordo que traz vantagem, para os dois lados, idealmente, não tem porque não assinar. Mas se não for, a gente tem que conversar, tem que ver”, disse o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, em conversa com jornalistas da imprensa estrangeira.

Em negociação por 21 anos, o anúncio do fechamento do acordo foi feito em junho de 2019, poucos meses depois do início do governo de Jair Bolsonaro. Diplomatas envolvidos por anos nas negociações avaliaram à época, que a decisão foi mais política que comercial, e passou a incluir pontos que até ali eram vistos como difíceis para o Brasil, como a abertura de compras governamentais aos europeus –algo que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já levantou por várias vezes que gostaria de rever.

No entanto, de acordo com uma fonte ouvida pela Reuters, há receio em tentar revisar pontos do texto pelo temor de que se termine por começar a negociação do zero novamente. “Se pedimos a revisão das compras governamentais, os europeus pedem para rever questões de agricultura, e se começa tudo de novo”, disse.

+ Marina Silva defende que em segunda fase, reforma tributária considere mecanismos de baixo carbono

Essa não é a intenção do governo brasileiro. Lula já disse, mais de uma vez, que pretende ver o acordo ratificado em seu mandato.

Quase quatro anos depois de acertado, no entanto, a ratificação não avançou, nem no Brasil e na Argentina, nem na maior parte dos países europeus. Frente à política ambiental do governo Bolsonaro, que resultou em um aumento de desmatamento na Amazônia, os europeus passaram a cobrar novas medidas ambientais.

A questão ambiental, inclusive, causou a primeira saia justa entre os negociadores. Na primeira reunião técnica dos negociadores europeus e sul-americanos dessa nova fase, no início de março, em Buenos Aires, os europeus apresentaram uma “side letter”, um documento diplomático tratando da questão ambiental.

Esse tipo de documento, segundo uma fonte diplomática, normalmente é usado para pedir esclarecimentos sobre pontos de um acordo. Mas a UE o usou para fazer exigências de compromisso ambiental para o Brasil.

O conteúdo da carta foi publicada no final de março pelo site Político europeu, e as exigências foram confirmadas à Reuters pela mesma fonte diplomática. Seu ponto principal é a exigência de um compromisso do Brasil de não reduzir as chamadas Contribuições Nacionalmente Determinadas acordadas pelo Brasil no Acordo de Paris sobre Mudanças Climáticas, e nem a meta de reduzir o desmatamento pela metade até 2025.

O conteúdo –e o posterior vazamento do documento – que os dois lados atribuem ao outro– não pegou bem no Itamaraty. O incômodo foi de que, além de usarem para as cobranças um instrumento diplomático que não era para isso, os europeus fizeram exigências no mesmo tom em que o governo de Jair Bolsonaro era tratado.

“Não é o mesmo governo, eles sabem disso. É um governo que já fez compromissos públicos contra o desmatamento e está agindo”, disse a fonte.

tagreuters.com2023binary_LYNXMPEJ350Y0-BASEIMAGE