A palavra-chave no momento para o setor hoteleiro no Brasil, após meses de sufoco com o isolamento social imposto pela pandemia da Covid-19, é resiliência. Se pousadas e hotéis foram um dos primeiros segmentos a sentir a fuga dos clientes a partir do crescimento de casos do novo coronavírus, a retomada deve ser em ritmo bem lento. Quem não fechou as portas pela ausência de hóspedes e receio de frequentar um ambiente, em tese, movimentado, teve de desligar a tomada por determinação do poder público – a partir de decretos municipais, como ocorreu em São Paulo e Rio de Janeiro. Para se ter uma ideia do tamanho do buraco, a Confederação Nacional de Bens, Serviços e Turismo (CNC) estima perdas da ordem de R$ 122 bilhões.

Nesse cenário, quem perdeu mais foram os pequenos hotéis, os chamados independentes, normalmente de gestão familiar, com menos fôlego para enfrentar longos períodos de baixa procura por hóspedes. E é justamente nessa baixa que a Atlantica Hotels, maior operadora hoteleira multimarcas da América Latina, planeja crescer nos próximos meses. Desde o início do isolamento social por conta da pandemia, o aumento de consulta para conversões, que na prática significa adesão às marcas do grupo – são 22 bandeiras, do budget ao luxo –, cresceu 20%. E apesar de a perspectiva de fechar o ano com queda de 45% sobre o faturamento de 2019, de R$ 1,2 bilhão do ano passado, o grupo tem o ambicioso plano de alcançar receita de R$ 2 bilhões até 2025, com novas aquisições. Até lá, o trabalho é garantir a rentabilidade, ainda que em tempos de crise. “A gente precisa estar preparado, ao longo dos próximos meses, para conseguir navegar de uma forma que aguente a pressão de caixa e pressão por resultado”, disse Eduardo Giestas, CEO da Atlantica.

Com 131 hotéis no País e 22,5 mil quartos disponíveis, o grupo planeja fechar o ano com aumento próximo a 10% em empreendimentos inaugurados ou agregados, com mais 13 hotéis incorporados às bandeiras da marca Atlantica, que somará mais 2 mil leitos. Até agora, três unidades hoteleiras já foram abertas. Do total previsto, sete serão no modelo de conversão. “O que torna uma rede como a nossa interessante é, nesse momento de retomada, associar à segurança a uma bandeira de uma grande rede com padrões reconhecidos”, afirmou Giestas. Benefícios de escala, para reduzir custo com fornecedores, e conseguir reduzir a dependência de plataformas virtuais de vendas de hospedagens também são as razões, segundo o presidente da rede. Isso ajuda a explicar o aumento do interesse pelas conversões de pequenos hotéis familiares para uma rede internacional. E a perspectiva, segundo o executivo, é que a crise econômica aumente esse índice de conversões.

RESISTÊNCIA Ainda que com baixa ocupação, a rede tomou a decisão de manter os hotéis abertos nas cidades onde não havia decreto determinando o fechamento. Para o CEO, o custo de parar a operação seria maior do que manter o hotel em atividade, mesmo sem atingir um limite satisfatório. Em abril, a média de ocupação da rede era de 14% – o ponto de equilíbrio financeiro está entre 32% e 50%, de acordo com tamanho e região da unidade hoteleira. “A gente decidiu manter hotéis abertos porque, mesmo com resultado negativo, reabrir depois é pior e causa perda de conexão com a demanda”, disse o dirigente da Atlantica Hotels.

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Os últimos três meses, no entanto, têm sido de recuperação na presença de hóspedes. Em junho, a taxa de ocupação foi de 22%, saltando para 25% em julho. Agosto chegou à casa de 30%. A expectativa é de que, no último trimestre deste ano, com 100% dos hotéis em funcionamento, a ocupação alcance 40%, bem acima do pico da crise, mas ainda longe do registrado no ano passado, quando a rede fechou com 60% dos quartos ocupados.

O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (Abih), Manoel Linhares, afirmou que os hotéis, de uma forma geral, ainda têm enfrentado dificuldade para realizar a travessia da crise. “Na hotelaria não há estoque. A cada noite não vendida, essa receita não volta. Não se paga a conta somente com os oito dias de fim de semana por mês”, disse o executivo. “Muitos não vão suportar.” Ainda que com a retomada gradual, o CEO da Atlantica Hotels acredita que a recuperação da receita deva ocorrer somente no fim de 2021, quando os números deverão se aproximar aos de 2019. “A disponibilidade de vacina e a queda das taxas de transmissibilidade vão gerar mais confiança ao turista durante o próximo ano”, afirmou. “Os hotéis têm feito ótimo trabalho quanto à segurança. Agora precisamos mostrar isso ao hóspede.”