Enquanto os bombeiros procuram desaparecidos na lama, moradores de Vila dos Milagres, comunidade pobre da cidade de Recife, mal conseguem pregar o olho: temem novos deslizamentos como os que deixaram mais de 100 mortos na região nos últimos dias.

“A gente tem filho, tem criança, tem tudo dentro de casa. A gente tá dormindo mais de 2 horas, 3 horas da manhã com medo que a barreira caia por cima das casas”, disse nesta quarta-feira (1) à AFP Cláudia do Rosário, parada na porta de sua casa humilde com telhado de zinco e paredes cor-de-rosa manchadas de umidade.

A poucas ruas dali, as chuvas torrenciais do fim de semana passado provocaram deslizamentos de terra que devastaram tudo em seu caminho e soterraram várias casas.

Se voltar a chover intensamente, como prevê o Instituto Nacional de Meteorologia para as próximas horas, teme que ocorra o mesmo com a sua.

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Os moradores afetados “chamaram a CODECIR lá para dentro e nunca vieram. Eles querem que aconteça a mesma coisa que aconteceu lá, aconteça aqui, para que eles puderem vir, é?”, queixa-se ela, de 43 anos e desempregada.

A comerciante Maria Lúcia da Silva, de 37, também se mostra preocupada.

“Quando começa a chover a barreira cede, cede, cede e a gente e aqui a gente tamo tudo ‘aperreada’. Já ligou para CODECIR, a CODECIR disse que veio, mas não resolveu até agora não resolveu nada. Eles passam o protocolo, a gente liga novamente e dizem que a demanda é lá dentro do “Buracão”, disse Silva em alusão à localidade mais afetada.

Ali, onde ocorreram os deslizamentos, bombeiros, garis e outros funcionários trabalhavam nesta quarta em busca de três pessoas que continuavam desaparecidas, constatou um cinegrafista da AFP.

A Prefeitura de Recife afirma que abriu linhas telefônicas e de WhatsApp para que os moradores reportem incidentes e que nesta quarta-feira esteve presente no bairro com mais de 200 funcionários de “limpeza, assistência social, defesa civil e saúde”, além de ter montado um abrigo em Vila dos Milagres para dar assistência médica, roupas e artigos de primeira necessidade aos afetados.

Até o momento, o governo pernambucano registrou um total de 106 mortos, nove desaparecidos e mais de 6.600 desalojados.

Entre a noite de sexta-feira e a manhã de sábado, o volume de água atingiu 70% do esperado para todo o mês de maio em alguns pontos da capital regional.

As imagens de Recife evocam o drama ocorrido em fevereiro em Petrópolis, na região serrana do estado do Rio de Janeiro, onde morreram 233 pessoas após chuvas torrenciais e deslizamentos.

Os especialistas atribuem este tipo de tragédias a uma combinação de fortes chuvas – exacerbadas pela mudança climática – e à construção de grandes comunidades com casas precárias em áreas de risco íngremes.

O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais do Brasil (Cemaden) estima que no Brasil 9,5 milhões de pessoas vivam em áreas de risco para deslizamento ou inundações, muitas delas em comunidades pobres, sem saneamento básico.