Era terça-feira, 6 de fevereiro, 18h44. Aproximadamente 2,3 milhões de pessoas grudadas nas telas de seus computadores ao redor do mundo contavam regressivamente em suas mentes: três… dois… um… Há tempos o lançamento de um foguete não chamava tanto a atenção do planeta. Construído pela SpaceX, o Falcon Heavy, que é o maior foguete já feito desde o Saturn V, da Nasa, que levou as missões Apolo à Lua, decolou, levantando uma imensa nuvem de fumaça e fogo, rumo a Marte, o seu destino final. Por trás disso, estava o empresário Elon Musk, um dos homens mais inovadores de seu tempo, considerado por muitos analistas o novo Steve Jobs, o visionário e carismático fundador da Apple.

O lançamento do Falcon Heavy provou que Musk pode ser comparado a Jobs em outro quesito: o do marketing. Assim como o criador do iMac, do iPod, do iPhone e do iPad, o dono da fabricante de foguetes SpaceX se preocupou com os mínimos detalhes do espetáculo. Um modelo Roadster, da montadora de carros elétricos Tesla, outra empresa que Musk criou, era o único objeto dentro da enorme área disponível do foguete. Ao volante do bólido, um boneco viajava ao som da canção Space Oddity, do cantor britânico David Bowie (1947-2016). No painel do carro, a mensagem “Don’t panic” (Não entre em pânico, em português) fazia referência ao livro O Guia do Mochileiro das Galáxias.

As imagens do automóvel vermelho correram o mundo, tanto no espaço, como pela internet. O streaming ao vivo foi o segundo mais visto da história do YouTube – ficou atrás apenas do salto do paraquedista austríaco Felix Baumgartner, que pulou de um balão na estratosfera, em evento promovido pela fabricante de energéticos Red Bull. Mais de 200 mil menções foram feitas no Twitter. Pelo menos sete mil artigos foram escritos a respeito do evento histórico. No Twitter, Musk escreveu: “Aparentemente, há um carro na órbita da Terra”, anexando um vídeo. No Instagram, publicou a foto do chip do foguete com a inscrição: “Feito na Terra por humanos”. “Quando se fala em marketing, é comum pensar apenas na divulgação de um produto. Mas Musk faz mais do que isso. Ele se comunica de uma maneira não tradicional e por meios não tradicionais”, afirma Marcelo Pontes, líder acadêmico da área de marketing da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). “Mandar um carro ao espaço transmite uma mensagem de desempenho e inovação. Se a ideia era reforçar a marca, ele conseguiu.”

Lançamento revolucionário: o Falcon Heavy, da SpaceX, é o maior foguete já lançado ao espaço desde o Saturn V, que levou as missões Apolo à Lua. Elon Musk dá seu primeiro passo para levar adiante seu plano de colonizar Marte (Crédito:AP Photo/John Raoux)

Alguns símbolos deste ambiente criado por Musk são óbvios, outros nem tanto. David Bowie não apenas compôs Space Oddity, uma das músicas mais emblemáticas sobre a corrida espacial dos anos 1960 e 1970. Ele também interpretou no filme O Grande Truque, de 2006, o inventor Nikola Tesla (1856-1943), nascido na antiga Iugoslávia, responsável pela criação da Corrente Elétrica Alternada, quem dá nome à montadora de carros elétricos de Musk. Toda essa simbologia são detalhes que fazem diferença na forma como as marcas se relacionam com seus seguidores e que chamaram tanta atenção quanto o lançamento perfeito do Falcon Heavy e o pouso sincronizado dos propulsores, no Centro Espacial Kennedy, da Nasa, em Cabo Canaveral. “Como acontecia com Steve Jobs, cada evento protagonizado por Musk é aguardado ansiosamente”, diz Milad Kalume Neto, consultor automotivo da Jato Dynamics. “A Tesla produz um marketing perfeito. Mas ainda precisa provar a que veio.” Apesar de valer US$ 58,2 bilhões, mais do que Ford e Fiat, a Tesla teve prejuízo de US$ 2,2 bilhões em 2017. Além disso, o Model 3, seu carro mais barato, enfrenta problemas de produção e está com entregas atrasadas.

O sucesso do lançamento do Falcon Heavy foi o primeiro passo significativo do plano de Musk de levar pessoas à Marte, após diversos fracassos, que resultaram em explosões de foguetes. Nunca uma nave tão poderosa, de uma empresa privada, havia sido enviada ao espaço. O foguete, que custou US$ 500 milhões, é um monstro. Tem 70 metros de altura e capacidade para carregar mais de 64 toneladas. São 27 motores que têm uma força equivalente a 18 jumbos 747, da Boeing, um dos maiores e mais icônicos aviões do planeta. Ele possui propulsores reutilizáveis, que voltam à superfície terrestre. Cada lançamento tem custo previsto de US$ 90 milhões. A viagem até a órbita do Planeta Vermelho vai demorar aproximadamente seis meses. Depois, ele vagará pelo espaço por milhões de anos. Se conseguir concluir seu plano de colonizar Marte, Musk poderá encontrar mais uma vez o seu Roadster.