É… é dura a vida da BMW no Brasil. Mais uma vez, a quinta em apenas cinco anos, o comando da filial brasileira muda de mãos. Em um comunicado sucinto, típico desses momentos, a empresa informou que o presidente, Rudolf Niesner-Schefenacker, deixou a companhia devido a um ?desacordo na condução dos negócios do Grupo BMW?. Em seu lugar, assume André Müller Carioba, diretor de compras. Niesner-Schefenacker se despede da empresa menos de um ano após sua chegada. Por ?desacordo na condução dos negócios? entenda-se as trombadas com o chefe, Tom Purves, responsável pela subsidiária americana, a qual as operações brasileiras se reportam.

Trata-se de mais uma etapa na conturbada trajetória da BMW em território brasileiro. Em 1995, a matriz afastou a Regino Import, então representante da marca no País, e montou uma estrutura própria. O primeiro presidente nessa nova fase, o alemão Michael Turwitt, perdeu seu emprego arrastado por denúncias de fraudes na nomeação de concessionários. Antes de Niesner-Schefenacker ser contratado, em setembro de 1999, dois outros executivos ocuparam a cadeira de presidente.

O vaivém prejudicou profundamente os negócios. A empresa foi a segunda marca importada a desembarcar no Brasil após a abertura de mercado no início da década de 90, atrás apenas da Lada. Tinha tudo para ganhar a corrida contra seus concorrentes diretos, como a Mercedes-Benz. Com o passar dos anos e as constantes trocas de comando, perdeu o passo. Em 1996, vendeu mais de 3.400 automóveis. Em 1999, esse número caiu para menos de 1.500. É verdade que a queda não pode ser atribuída exclusivamente à gestão da companhia ? nesse período crises econômicas e mudanças nas alíquotas de importação também deram sua contribuição. Mas os concorrentes saíram-se melhor. Até mesmo a Audi, que no Exterior atua em outra faixa de mercado, conquistou espaços antes ocupados por sua prima alemã.

Mudar esse quadro era a missão de Niesner-Schefenacker. Oriundo da Mercedes-Benz e da Audi, ele, porém, enfrentou diversas frentes de batalha. A BMW tem uma estrutura peculiar. Quem manda nas operações brasileiras é a filial americana. Mas o relacionamento com o quartel-general da organização em Munique é importante, tanto por aspectos políticos (os acionistas estão lá) como por questões comerciais (a maioria dos veículos vendidos aqui é fabricada naquela cidade). Niesner-Schefenacker não teria conseguido se movimentar com desenvoltura nesse cenário. ?Não houve empatia entre ele e seus superiores?, diz um ex-executivo. ?Os chefões, volta e meia, queixavam-se da falta de informações sobre os negócios aqui.?

O destino de Niesner-Schefenacker teria sido definido há pouco mais de três meses. Na ocasião, em uma reunião com alguns dos subordinados, ele se queixou da falta de autonomia da filial. O assunto, inclusive, teria sido objeto de uma conversa áspera com Purves. Mais: há cerca de três meses, Carioba foi nomeado chairman da companhia, posição que acumulou com o cargo de diretor de compras. Para muitos (Carioba não se inclui entre eles), esse foi um sinal fortíssimo de que as coisas não iam bem para o lado de Niesner-Schefenacker.

Outra dificuldade foi tocar a estratégia de marketing, um dos calcanhares-de-aquiles da empresa no mercado brasileiro. A política de divulgação da marca já vinha sendo muito criticada pela matriz em função de sua timidez. A expectativa de uma postura mais agressiva não se confirmou com a chegada de Niesner-Schefenacker. Um exemplo prosaico ocorreu recentemente, em Campos do Jordão, a cidade mais badalada do inverno paulista. Enquanto todas as montadoras organizaram show-rooms no centro turístico, a BMW ergueu seu stand junto ao Horto Municipal, um local charmoso, porém afastado da agitação.

Carioba admite a necessidade de mudanças na política de marketing. ?Estávamos muito focados no marketing institucional e, agora, precisamos nos aproximar mais de nosso cliente?, diz ele. Não se espere grandes campanhas de massa para atingir os consumidores. ?Vamos reforçar nossa presença em eventos direcionados para esse público, como road shows, patrocínios de competições esportivas de golfe ou de hípica etc.?

Aos 49 anos, nascido no Rio de Janeiro mas criado na Alemanha, Carioba sabe também que terá de melhorar, e muito, o relacionamento com sua rede de concessionárias ? outro obstáculo com o qual Niesner-Schefenacker teria se deparado. O clima chegou a ficar tão tenso que, meses atrás, as revendas quase levaram o assunto aos tribunais. Desistiram, porém. ?Temos de estabelecer um clima de parceria?, diz Carioba. ?A participação dos revendedores é fundamental para ter mais agressividade no mercado. Não basta que as concessionárias tenham uma loja bonita e fiquem à espera de que os clientes venham bater à porta.? Uma no cravo, outra na ferradura ? em contrapartida, Carioba promete aumentar as opções de veículos no Brasil. ?A partir deste mês, iniciaremos a importação de novos modelos?, diz ele. ?Queremos também envolver os revendedores na elaboração do plano de vendas da empresa.? A principal dúvida, porém, persiste: a BMW entrará agora num período de continuidade e estabilidade? Nem mesmo Carioba responde. ?Eu continuo como chairman?, diz ele. ?Não sei se haverá também um presidente ou não, ou se a estrutura será alterada.? Enfim, é cedo para garantir que a máquina da BMW encontrou seu rumo por aqui.