Os líderes do protesto democrático no Sudão concordaram em interromper sua campanha de desobediência civil e retomar as negociações com a junta militar, informou o mediador etíope nesta terça-feira (11).

A notícia do suposto acordo, que ainda deve ser confirmada pelos militares, foi divulgada quando um alto diplomata americano se preparava para viajar para Cartum com o objetivo de pressionar os generais no poder para que detenham a repressão contra os manifestantes.

“A Aliança para a Liberdade e Mudança acordou interromper a desobediência civil a partir de hoje”, anunciou Mahmud Drir, mediador desde que o primeiro-ministro de seu país, Abiy Ahmed, viajou para o Sudão na semana passada.

“Ambas as partes também acordaram retomar logo as discussões” sobre a transferência do poder para uma administração civil, acrescentou.

O movimento de protesto afirmou em comunicado que está em contato com pessoas para “retomar o trabalho na quarta-feira”.

O mediador etíope explicou que “em um gesto de boa vontade” os militares aceitaram “libertar todos os presos políticos”.

Na noite desta terça-feira, o Conselho de Segurança das Nações Unidas condenou firmemente a violência no Sudão e pediu à Junta Militar e ao movimento de protesto que trabalhem juntos para encontrar uma solução para a crise.

O Conselho de Segurança fez um apelo a todas as partes para que continuem “trabalhando juntos por uma solução consensual para a atual crise”, e manifestou seu apoio aos esforços diplomáticos dirigidos pela África.

Os protestos no Sudão começaram em dezembro, quando o preço do pão triplicou e, na sequência, evoluiu para um movimento político.

Após a destituição do presidente Omar Al-Bashir por parte dos militares em 11 de abril, milhares de manifestantes que estavam acampados em frente ao quartel-general do Exército se recusaram a deixar o local, passando a exigir a transferência de poder para os civis.

Com o fracasso das negociações entre os manifestantes e o Conselho Militar, porém, a manifestação foi violentamente dispersada em 3 de junho. Em reação, os líderes dos protestos convocaram um movimento de desobediência civil no domingo (9).

Desde 3 de junho, a repressão no Sudão deixou 118 mortos e mais de 500 feridos, principalmente nesta data, relata o Comitê de Médicos, ligado ao movimento.

– Um protesto bem sucedido –

Os manifestantes declararam que a ação de desobediência civil foi um sucesso.

“Isso mostra claramente o que podemos fazer, e de um modo pacífico”, disse Ishraga Mohamed, um dos líderes do movimento de protesto.

Lojas e empresas estavam fechadas nesta terça-feira (11), em Cartum, capital do Sudão, no terceiro dia de um movimento de desobediência civil

Alguns ônibus públicos com passageiros a bordo circulavam em algumas zonas da capital, mas os bairros de negócios de Cartum estavam quase sem circulação, de acordo com um jornalista da AFP.

Os paramilitares das Forças de Apoio Rápidas (RSF) acusados de terem tido um papel importante na repressão de 3 de junho patrulharam as ruas em suas caminhonetes com suas metralhadoras.

O país ficou praticamente isolado do mundo até a madrugada desta terça-feira, quando a conexão de Internet da Sudatel, o principal provedor do país, voltou a ser estabelecida.

Os RSF são considerados pelo movimento de protesto e especialistas como une uma “nova versão” das milícias Janjawid, denunciadas por atrocidades na região de Darfur (oeste), cenário de uma guerra civil desde 2003.

Nesta terça-feira, nove pessoas foram mortas no povoado de Al Dalij, em Darfur, segundo o comitê de médicos que apontou como os Janjawid como responsáveis.

– EUA pede para conter a repressão –

O máximo diplomata de Estados Unidos para África se preparava para viajar nesta quarta-feira ao Sudão para promover o diálogo entre os militares e os representantes do protesto, segundo o Departamento de Estado.

Tibor Nagy, o vice-secretário de Estado para África, pedirá “o fim dos ataques contra os civis” e instará ambos os lados “a trabalhar para a criação de um ambiente que permita” retomar o diálogo, segundo a mesma fonte.

Os Estados Unidos condenaram na semana passada os ataques contra os manifestantes, assim como outros países do Ocidente, embora os aliados árabe de Washington como Egito, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos manifestaram seu apoio aos militares.