A Olimpíada do Rio de Janeiro de 2016 se deu em clima de instabilidade. Em meio a uma crise política e econômica, Michel Temer foi à abertura como presidente interino, aguardando a confirmação do impeachment de Dilma Rousseff pelo Senado, e logo após o Brasil enfrentar um surto do vírus da zika. Tudo indicava que, para a Olimpíada de Tóquio, em julho deste ano, o enredo seria bastante diferente. As obras para os Jogos estão adiantadas. A Terra do Sol Nascente é conhecida por ser uma democracia estável, com a 11ª maior população e a terceira maior economia do mundo. Shinzo Abe é o premiê que comandou o país por mais tempo e chega fortalecido a seu oitavo ano no cargo. A primeira vez que Tóquio sediou o evento, em 1964, mostrou ao mundo que o Japão emergira da Segunda Guerra Mundial como uma nação pacífica e moderna. Seria a chance de, por meio de robôs e carros voadores, provar que continua na ponta da tecnologia mundial.

Mas agora paira a dúvida se a Olimpíada acontecerá tranquilamente. Se a situação política do país asiático é confortável, uma tempestade perfeita se forma na economia. Já são décadas de crescimento baixo devido ao envelhecimento da população, emigração de jovens talentos e muito dinheiro sendo poupado ao invés de ir para o consumo. No fim de 2019, a situação piorou. Uma alta da taxa do imposto de consumo, o IVA deles, causou grande efeito. Já era esperado que esse baque tarifário cortaria o crescimento do PIB para 2020 de cerca de 1% para abaixo de 0,5%. O governo previa balancear o impacto com mais investimentos, mas subestimou os efeitos da alta de impostos, que se somou à temporada de tufões e o enfraquecimento da demanda global.

A expectativa era que no quarto trimestre de 2019 a economia caísse 3,8%, mas o que se viu surpreendeu: o PIB encolheu 6,3% de forma anualizada. Foi o pior resultado desde 2014, quando houve outro aumento de impostos. O consumo privado caiu muito mais do que o governo previa (-11%) e as empresas baixaram em 14% os investimentos. Assim, era esperado um efeito de carregamento para o primeiro trimestre de 2020, com mais queda de negócios, e uma recessão técnica (quando ocorrem dois trimestres seguidos de diminuição do PIB). O acordo comercial entre China e EUA poderia ajudar, mas o golpe final foi o surto do Covid-19, o novo coronavírus que se espalhou a partir da província chinesa de Wuhan.

Devido à proximidade com o epicentro da crise, o Japão é o terceiro país mais impactado. Até a quarta-feira 26 já eram 164 casos e uma morte. A Toyota, maior montadora do mundo, informou que suas 12 fábricas japonesas poderiam parar por falta de peças. A interrupção da chegada de turistas chineses também prejudicará.

Para piorar a situação, dúvidas quanto à realização da Olimpíada foram levantadas. Na terça-feira 25, Dick Pound, membro mais sênior do Comitê Olímpico Internacional (COI), disse que até o fim de maio seria decidido se os Jogos acabariam cancelados. Não poderia haver cenário pior. O país que quer se tornar uma potência maior do turismo global precisando desistir do seu maior evento em décadas. O comitê organizador, no entanto, negou essa possibilidade. “Não pensamos nisso”, disse Toshiro Muto, CEO do comitê. Aos trancos e barrancos, é bem provável que o chefe de estado japonês inaugure a sua Olimpíada em situação que não dá inveja aos anfitriões do evento em 2016…