Os bilionários Warren Buffett e Luis Barsi têm um ponto em comum. Ambos erigiram suas fortunas comprando ações que pagavam bons dividendos e reinvestindo esses recursos com sabedoria por muito tempo. “No longo prazo, os dividendos rendem mais que as aplicações de renda fixa”, diz Barsi. “Renda fixa é o mesmo que perda fixa.” Enquanto amealhava sua fortuna, o brasileiro teve uma vantagem em relação ao americano Buffett. No Brasil, os dividendos são isentos de impostos. Já nos Estados Unidos, eles são tributados como a renda, com alíquotas que variam de 10% a 39,6%.

Torres de transmissão: setor de energia é generoso com os minoritários, ao lado das concessionárias de rodovias (Crédito:Shutterstock)

No que depender dos candidatos, a vantagem comparativa dos investidores brasileiros vai acabar. Ciro Gomes (PDT), Marina Silva (Rede) Geraldo Alckmin (PSDB) e Henrique Meirelles (MDB) já disseram publicamente que estudam o fim da isenção. Gomes foi, como de hábito, o mais estridente na defesa da taxação. Em uma entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, no fim de maio, ele criticou duramente a isenção. “O Itaú acabou de pagar R$ 9 bilhões em dividendos para quatro (sic) famílias”, disse ele, sem pronunciar os nomes das três famílias que controlam o banco: Villella, Setubal e Moreira Salles.

Ganhos de longo prazo: Luis Barsi fez fortuna reinvestindo dividendos (Crédito:Gabriel Chiarastelli)

O que sustenta essa proposta é uma tentativa de reduzir a desigualdade tributária nas diferentes faixas de renda. No Brasil, o apetite do Leão é muito menor para os mais ricos. Segundo um estudo do economista e ex-Secretário de Política Econômica Bernard Appy, 28 milhões de contribuintes apresentaram declarações de Imposto de Renda no ano-base de 2017. Desse total, 68 mil, ou 0,24%, eram ricos e tinham renda mensal superior a 160 salários mínimos, ou R$ 152 mil. No entanto, diz Appy, 70% dos rendimentos desse grupo vieram de dividendos e outras fontes, como heranças, que pagam menos imposto. “Quanto maior a renda, maior a fatia de rendimentos isentos no rendimento total”, disse ele, em um evento no fim de junho. “Temos um problema aí.”

Os profissionais do mercado avaliam que a tributação dos dividendos é uma questão de tempo, não importando quem vença as eleições de outubro. “Não será algo para 2018 nem para 2019, mas provavelmente os dividendos já estarão sendo tributados no fim do próximo mandato presidencial”, diz Álvaro Frasson, analista da corretora Spinelli. Frasson e outros analistas realizaram um estudo sobre o impacto da taxação dos dividendos no mercado. Dependendo da alíquota, a queda das ações poderá chegar a 30% no dia do anúncio da decisão (observe o gráfico “A profundidade da mordida”). Além do impacto momentâneo, a instituição da tributação pode reduzir a atratividade de companhias tradicionalmente generosas na remuneração dos minoritários, como empresas elétricas e concessionárias de rodovias (observe o quadro ao final da reportagem).

Questão de tempo: para Álvaro Frasson, da corretora Spinell, a tributação dos proventos poderá entrar em vigor ainda no próximo mandato presidencial (Crédito:Divulgação)

Mesmo nos Estados Unidos, a questão é controversa. Em 2003, o então presidente americano George W. Bush propôs isentar os dividendos de impostos, com a justificativa de que tributar esses ganhos seria penoso para os cidadãos mais idosos, que contavam com os proventos das empresas para complementar sua aposentadoria. A proposta, porém, não prosperou. Segundo Frasson, o impacto de uma eventual tributação sobre os dividendos não é para já e ainda não está expresso nos preços das ações. “Essa discussão teria de ser conduzida de maneira mais ampla, incluindo a tributação da renda da pessoa jurídica”, diz ele.

O analista lembra que o Brasil criou uma jabuticaba fiscal, os Juros sobre Capital Próprio, conhecidos no mercado pela sigla JCP. São quase iguais aos dividendos. A diferença é que o investidor paga imposto de 15% sobre o valor recebido e eles servem para reduzir o lucro tributável da empresa, diminuindo o Imposto de Renda e a Contribuição sobre Lucro Líquido (CSLL) a pagar. “Dependendo da alíquota que incidir sobre o dividendo, pode ser mais vantajoso pagar apenas JCP”, diz ele.