Mais uma ação popular pediu à Justiça que barre a comemoração de 31 de março, ordenada pelo presidente Jair Bolsonaro aos quarteis das Forças Armadas. Nesta data, em 1964, um golpe militar derrubou o governo João Goulart e iniciou um regime ditatorial que durou 21 anos.

Na terça-feira, 26, um advogado e um defensor público federal também pediram que a Presidência se abstivesse de celebrar a data. A juíza federal da 6ª Vara de Brasília, Ivani da Silva Luz, mandou na quarta-feira, 27, intimar Bolsonaro sobre ação popular do advogado Carlos Alexandre Klomphas.

Em seu texto, a ação aponta para “lesão à Moralidade Administrativa e ao Patrimônio Histórico e Cultural Brasileiros”.

“Não é moralmente correto um ato que manda comemorar o início do mais longo regime de exceção da História do Brasil e um dos mais longos do mundo”, destaca.

“Comemorar a tortura, a exceção e a morte é provavelmente, uma das poucas condutas cuja imoralidade é passível de consenso.”

A ação é subscrita pelos advogados Carolina Looty de Paiva Dias, João Pedro Chaves Valladares Pádua, Júlia Alexim Nunes da Silva e Gabriel de Souza Riva Gargiulo. O documento foi enviado à Justiça Federal do Rio.

“A simpatia do presidente Jair Messias Bolsonaro pela Ditadura Militar que assolou o país entre 1964 e 1988 é declarada e de conhecimento de todos. É, desse modo, evidente que a expressão comemorações, nesse contexto, tem o sentido de enaltecimento e festejo – o que, aliás, é o sentido próprio do termo – e não de mera rememoração de fato relevante da História Nacional”, afirmam.

“Pretende-se, então, em respeito ao princípio da moralidade administrativa e do Estado Democrático de Direito, e em defesa dessa moralidade e do patrimônio histórico e cultural brasileiros, a suspensão e vedação à edição de qualquer ato que configure celebração dos eventos ocorridos no dia 31 de março de 1964.”

Na ação, os advogados destacam que, “durante a Ditadura Militar os crimes de tortura e homicídio foram usados como método”.

“Não eram arroubos de agentes do estado psiquicamente desequilibrados ou psicopatas. Havia planejamento de curto, médio e longo prazo da prática destes crimes para calar ou eliminar toda e qualquer forma de oposição”, apontam.

“No revisionismo histórico que lamentavelmente tem ganhado corpo na sociedade brasileira nos últimos anos é comum ler e ouvir que foram torturados ‘apenas’ os integrantes de organizações que aderiram à luta armada, o que não corresponde à realidade – e ainda que correspondesse não absolveria os criminosos. Foram torturados padres, freiras, crianças, artistas, professores, estudantes, jornalistas, camponeses, servidores públicos, etc.”

Entenda o caso

Na segunda-feira, 25, o porta-voz da Presidência da República, general Otávio Santana do Rêgo Barros, informou que a inclusão da data na ordem do dia das Forças Armadas, para comemoração dos 55 anos do golpe de 1964, já foi aprovada por Bolsonaro. A participação do presidente nesses eventos, porém, ainda não está confirmada.

“O presidente não considera 31 de março de 1964 um golpe militar”, disse o porta-voz. Segundo Rêgo Barros, na avaliação de Bolsonaro, sociedade civil e militares, “percebendo o perigo” que o País vivenciava naquele momento, se uniram para “recuperar e recolocar o nosso País no rumo”. “Salvo melhor juízo, se isso não tivesse ocorrido, hoje nós estaríamos tendo algum tipo de governo aqui que não seria bom para ninguém”, disse o porta-voz.

Questionado sobre como serão as comemorações, Rêgo Barros disse que ficará a cargo de cada comando. “Aquilo que os comandantes acharem, dentro das suas respectivas guarnições e dentro do contexto, que devam ser feitas”, disse. Não há previsão de que haja qualquer evento no Palácio do Planalto.

Cautela

Generais da reserva que integram o primeiro escalão do Executivo, porém, pediram cautela no tom para evitar ruídos desnecessários diante do clima político acirrado e do risco de polêmica em meio aos debates da reforma da Previdência no Congresso.

Em um governo que reúne o maior número de militares na Esplanada dos Ministérios desde o período da ditadura (1964-1985) – o que já gerou insatisfação de parlamentares -, a comemoração da data deixou de ser uma agenda “proibida”. Ainda que sem um decreto ou portaria para formalizá-la, a efeméride volta ao calendário de comemorações das Forças Armadas após oito anos.

Em 2011, a então presidente Dilma Rousseff, ex-militante torturada no regime ditatorial, orientou aos comandantes da Aeronáutica, do Exército e da Marinha a suspensão de qualquer atividade para lembrar a data nas unidades militares.