O império de Luiza Helena Trajano começou a ser construído na década de 1950 por sua tia, também Luiza, que abriu um comércio para vender eletrodomésticos para as famílias da cidade de Franca e região, no interior paulista. O conceito era simples: dar acesso a muitos o que era privilégio de poucos. Essa mesma essência norteou o Magazine Luiza por décadas até chegar ao atual momento com 1.481 lojas, 160 mil sellers em seu marketplace, 45 milhões de usuários no superapp e faturamento de R$ 56 bilhões em 2021. Tornou-se referência em ações digitais e em inovação. É com esse mesmo preceito e alinhada a tendências de mercado que agora coloca em prática uma nova linha de negócio: aluguel de produtos. “Oferecer acesso não precisa ser mais na forma de compra”, disse Vinicius Porto, diretor de experiência do cliente do Magalu. “Precisamos vender solução e conveniência, não somente produtos.”

O serviço de locação VaiVolta está em fase piloto, em parceria com a Housi, primeira plataforma de moradia por assinatura do mundo. Por enquanto, apenas usuários da flagship Bela Cintra e da unidade Housi da Paulista, ambas em São Paulo, poderão alugar equipamentos e produtos disponíveis no Magalu pelo site vaivolta.net. “Até o fim do ano estará em toda a capital paulista”, afirmou Porto.

A quantidade de produtos disponíveis ainda está restrita a cerca de 35, mas também vai escalar em breve. Hoje são disponibilizados frigobar, micro-ondas, purificador de água, furadeira e caixa de ferramentas. Quer fazer uma festa em casa e não tem uma caixa de som? Também é possível alugar no Magalu. Gostaria de chamar os amigos para um dia de diversão? Videogame está na prateleira da loja virtual para ser usado e depois devolvido. “Olhamos os itens que têm desembolso alto, com frequência de uso baixa. Esses possuem mais característica de sucesso nesse modelo”, disse o executivo responsávelo pelo projeto.

APOIO As quase 1,5 mil lojas físicas do Magalu podem funcionar como pequenos centros de distribuição no projeto de serviços de locação de produtos que a varejista implanta. (Crédito:Divulgação)

O desafio maior está na complexidade da logística reversa. Em que estado os produtos vão retornar para serem usados por outros consumidores? Fazer isso com algumas centenas de produtos é algo relativamente fácil para uma empresa com a estrutura do Magalu. Mas e centenas de milhares? A companhia tem o pé no chão. Por isso vai amadurecer o processo até dezembro deste ano e fazer um balanço do que deu certo e errado. Obviamente a rentabilidade do negócio, apesar de não ser o core da rede varejista, será avaliada. “É promissor, mas vamos com cautela.”

Lembremos que iFood e Uber, dois gigantes da tecnologia com forte atuação no Brasil, começaram pequenos e avançaram por etapas. Exemplos a serem seguidos pelo Magalu. Joga a favor da companhia a malha de quase 1,5 mil lojas, que podem funcionar como pequenos centros de distribuição desses produtos a serem alugados, e as milhares de assistências técnicas parceiras, que darão apoio na manutenção e troca de peças dos aparelhos. “Os produtos têm de estar sempre aptos para o próximo cliente. A experiência das pessoas tem de ser boa.”

TENDÊNCIAS O modelo está amparado em três tendências principais detectadas pelo setor de P&D do Magalu, composto por dois times antenados a espectros de médio (12 a 24 meses) e longo (24 meses para frente) prazos. A primeira é relacionada ao consumo, em que a economia compartilhada tem ganhado espaço. Segundo projeção da auditoria e consultoria PwC, esse segmento vai movimentar US$ 335 bilhões em todo o mundo em 2025. As áreas de hospedagem, com o Airbnb, e de transporte, com o Uber, já são relevantes. Outras vertentes têm avançado, como brinquedos, vestuário e máquinas. Para o consumidor, as vantagens de alugar em relação a comprar são, em sua maioria, os preços atrativos, a redução de desperdício e o combate ao consumo excessivo. É o hábito mais consciente sendo despertado.

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“Precisamos vender solução e conveniência, não somente produtos” Vinicius Porto Diretor de CX

A outra tendência é a de “experimentar para adquirir depois”, segundo Vinicius Porto. Quem nunca se arrependeu de comprar um produto que, logo em seguida, mostrou-se desnecessário? Alugar antes pode ser uma opção para não se arrepender depois. O aspirador robô pode se enquadrar nessa categoria.

A terceira inclinação do mercado que levou o Magalu a lançar o VaiVolta tem a ver com a parceria junto a Housi. Há um movimento para moradias cada vez menores em grandes centros urbanos, habitadas principalmente por jovens. O modelo estúdio é um bom exemplo. Nele, a prioridade é o conforto individual em um ou dois locais principais, que podem ser o quarto e a sala. O que pode ser compartilhado está fora do imóvel, como cozinha e área de serviço. Nesse tipo de apartamento diminuto, não há muito espaço para guardar coisas. Aí vem a pergunta: será que as pessoas precisam ter tudo em casa? A resposta pode estar no serviço de locação do Magalu. “A contratação de bens vai-e-volta atende à rotina doméstica, principalmente do coliving”, afirmou Porto.