A diarista Maria do Carmo Silva, de 41 anos, vive nas ruas de São Paulo há dois anos. Por causa do isolamento para evitar a disseminação do novo coronavírus em 2020 e 2021, as faxinas caíram. Maria não conseguiu mais pagar o aluguel de R$ 400 em Ermelino Matarazzo, na zona leste. Por isso, decidiu ir para o centro em busca de mais oportunidades. O motivo maior de seu desespero é que ela não está sozinha: precisa de renda e cuidados para sua filha de cinco anos. As duas acabaram morando na Comunidade do Moinho, na região central, em albergues oferecidos pela Prefeitura, e até embaixo do Minhocão.

Por causa da previsão do tempo desta semana, Maria decidiu deixar a filha na casa de uma amiga, no Moinho. Ela vai ficar em um quarto com outras cinco crianças e mais três adultos. Só Maria vai ficar na rua. “A gente fica com medo de que ela pegue doença”, diz a mãe. Maria tem uma barraca com poucos pertences, entre eles, uma mochila rosa, com desenho das Meninas Superpoderosas, preferido da filha. “Acho que ela vai ficar lá essa semana. Vai ser frio a semana toda, né?”.

Nesta quarta-feira, 18, a cidade registrou a madrugada mais fria do ano, com 6,6ºC registrados na estação do Mirante de Santana, do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), entre 6h e 7h da manhã. Segundo o Centro de Gerenciamento de Emergências (CGE) da Prefeitura de São Paulo, a sensação chegou a ser negativa, com – 4º C na zona sul.

Por causa da semana com avanço da massa de ar frio pelo Brasil, a Prefeitura montou dez tendas provisórias e criou 2 mil vagas em abrigos, além das cerca de 15,1 mil existentes, para dar conta da demanda de sem-teto. A crise econômica e a pandemia fez aumentar em 230% o número de barracas identificadas por recenseadores da Prefeitura entre 2019 e 2021. No censo anterior, havia 2.051 pontos abordados com barracas improvisadas, no ano passado foram computados 6.778 pontos.

O Estadão encontrou Maria na noite desta terça-feira, 17, minutos antes da separação das duas em uma das tendas emergenciais montadas pela Prefeitura na Praça Marechal Deodoro, um dos pontos de atendimento da Operação Baixas Temperaturas, da gestão municipal.

As atendentes se sensibilizam com a presença da mãe e da filha e capricharam na porção de sopa das duas. Não adiantou muito porque uma parte acabou derramando no moletom da menina enquanto ela comia com vontade.

Como tantos outros, Maria planeja sair da rua e voltar a morar de aluguel. Conta, feliz, que as patroas estão voltando a chamá-la para as limpezas diárias, em média de 120 reais. Ela recusa um pedido para uma foto. Ela, que não responde se usa crack ou álcool, diz que não quer aparecer nessa situação.