Estratégia de ampliar base para além do voto da esquerda tem como principal carro-chefe a presença do ex-tucano Geraldo Alckmin na chapa. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva oficializa neste sábado (07/05), em São Paulo, o lançamento da sua pré-candidatura à Presidência da República. Oficialmente batizada como movimento “Vamos Juntos Pelo Brasil”, a chapa vai reunir sete partidos, entre legenda grandes, como o PT e PSB, médias como Solidariedade, e de menor porte (PSOL, PCdo B, entre outras).

Apesar do número considerável de partidos, esta não é a maior chapa já reunida por Lula. Em 1994, ele também disputou o Planalto com o apoio de sete siglas. No entanto, a novidade em 2022 é que a chapa reúne partidos que não estão necessariamente à esquerda, como o Solidariedade, chefiado por Paulinho da Força, que apoiou o impeachment de Dilma Rousseff em 2016.

Dessa forma, o ex-presidente vem tentando montar um arco mais amplo de aliados para se posicionar como uma alternativa atraente contra o presidente de extrema direita Jair Bolsonaro. Lula ainda tenta atrair apoio do MDB e PSD, legendas de centro-direita.

O carro-chefe dessa estratégia de ampliar o voto para além da esquerda é Geraldo Alckmin, ex-tucano hoje filiado ao PSB que será candidato à vice-presidência pela chapa. Antigo adversário de Lula, o ex-governador, de perfil conservador, começou uma aproximação com o petista no fim do primeiro semestre de 2021, um lance que inicialmente provocou incredulidade entre observadores políticos.

A jogada de agregar um vice de um espectro político diferente não é uma novidade para Lula, que em 2002 foi eleito tendo o empresário José Alencar como companheiro de chapa. Mas a formação de uma chapa com um antigo adversário político – Lula e Alckmin se enfrentaram nas eleições presidenciais de 2006 – é uma das escolhas mais ousadas e excepcionais que Lula fez em sua carreira política.

Chapa Lula-Alckmin une esquerda sem conseguir atrair ‘frente ampla’

Nesta primeira semana de maio, Lula minimizou os ataques que trocou com Alckmin no passado, que perduraram até a eleição de 2018. “Você não acha que o gesto do Alckmin vir ser meu candidato a vice é uma demonstração inequívoca que aquilo faz parte de um passado que eu acho que as pessoas decentes desse país não querem lembrar? Você não acha que o fato do Alckmin ter se filiado ao PSB, aceitado convite para ser meu vice, fazer um programa de governo junto e governar esse país não é um gesto extraordinário de quem quer deixar para lá o passado?”, disse Lula.

Deixadas as antigas diferenças para trás, Lula também expôs o que tem em mente. “Alckmin agrega experiência, agrega um setor da sociedade que durante muito tempo não votou no PT ou não quis votar no PT. O Alckmin agrega pessoas que pensam diferente de nós em muitas coisas”, afirmou Lula nesta quinta-feira em entrevista à Rádio CBN Campinas.

Em dezembro, a pesquisa Datafolha apontou que a entrada de Alckmin na chapa de Lula poderia aumentar a possibilidade de voto no petista para 16% dos eleitores. No entanto, para 70% dos entrevistados a aliança com o ex-governador não mudaria a intenção de voto.

Resistência

Apesar de Lula manter uma liderança incontestável dentro do PT, a estratégia de trazer Alckmin à chapa desagradou parte da militância, descontente de ver o ex-presidente se aliando com um conservador. De certa forma, o roteiro de resistência ao nome entre a militância repete o roteiro que se seguiu após a indicação de José Alencar em 2002, quando o empresário chegou a ser alvo de vaias quando seu nome foi anunciado num evento oficial.

Vinte anos depois, um documento divulgado pela Articulação de Esquerda, uma das correntes mais à esquerda dentro do PT, chamou Alckmin de “golpista, neoliberal, um empecilho programático e um Temer em potencial” – fazendo referência ao antigo vice de Dilma, Michel Temer, de direita, que se voltou contra a então presidente no fim de 2015.

Mas as correntes do PT que não disfarçam a insatisfação com a presença do ex-tucano não demonstraram força para barrar a indicação. Em abril o Diretório Nacional do partido aprovou a chapa por 68 votos a 16.

Também não se esperam durante o lançamento da pré-candidatura, neste sábado, cenas contra Alckmin como as vaias sofridas por Alencar em 2002. Valter Pomar, líder da Articulação de Esquerda, disse ao jornal Folha de S.Paulo que estará no evento e que pretende deixar novas críticas para depois.

O deputado federal Rui Falcão, que também reclamou da composição da chapa em janeiro, afirmou igualmente ao jornal que a questão está “resolvida”: “Eu me posicionei, e a maioria do partido foi em outra direção. Está resolvido internamente. Já estive ao lado de Alckmin em eventos. Queremos que ele venha para agregar à campanha. Não quero mais discutir essa questão, todo mundo sabe qual vai ser o resultado. Me inclua fora dessa”, disse Falcão.

Lula também demonstrou estar ciente que ainda há insatisfação com Alckmin em suas fileiras. Nas últimas semanas, no que parecem ter sido gestos para aplacar os setores mais à esquerda, ele adotou temas que agradam essas alas. No fim de abril, para assegurar o apoio do PSOL, o PT concordou em incluir em seu programa 12 pontos reivindicados pela pequena legenda de esquerda. Entre eles, a revogação da reforma trabalhista e do teto de gastos, e veto à privatização da Eletrobras.

Dificuldades

Embora Lula tenha assegurado a presença de Alckmin e sua chapa, e feito gestos para agradar setores insatisfeitos, isso não significa que tudo esteja saindo conforme as expectativas iniciais, segundo observadores da imprensa brasileira.

Em abril, Alckmin, num evento de centrais sindicais, acabou assumindo um papel de tentar agradar apoiadores de esquerda ao afirmar: “A luta de vocês, a luta sindical, deu ao Brasil o maior líder popular deste país: Lula. Viva, Lula! Viva os trabalhadores do Brasil.”

Nos bastidores, a declaração foi encarada como um exemplo nítido de como Alckmin ainda não encontrou na chapa o papel para o qual foi originalmente convocado: agregar votos de centro e de direita.

“O voto de esquerda a gente já tem, o Alckmin não precisa ecoar Lula chamando as pessoas de companheiros, concordando com tudo. Ele precisa atrair o voto da direita moderada, precisa voltar a falar para a bolha dele”, disse um coordenador da campanha ao blog da jornalista Andréia Sadi.

O jornalista e consultor de comunicação Thomas Traumann, que atuou como porta-voz de Dilma, também fez uma avaliação similar em seu blog. “Passados quatro meses de convivência da dupla, nenhuma ideia liberal na economia ou conservadora nos costumes foi incorporada ao discurso lulista. Por enquanto, Alckmin parece mais empenhado que a relação dê certo – e isso inclui reforçar publicamente a sua fidelidade a Lula – do que o contrário”, escreveu.

Mas, segundo a jornalista Sadi, há sinais de que a campanha esteja reagindo. Após o lançamento oficial da pré-candidatura, neste sábado, a expectativa é que Lula e Alckmin se dividam na procura de votos. O conservador Alckmin deve ser escalado para encontros com representantes religiosos, do agronegócio e também eleitores do Sudeste – o ex-tucano foi governador de São Paulo de 2001 a 2006.

Contudo, mesmo os novos planos não são livres de percalços: nesta sexta-feira, a campanha anunciou que Alckmin está com covid-19. Assim, ele deve participar de forma virtual do lançamento da chapa.

jps (ots)