Há um ditado em Brasília que diz que Lula dobra, mas não quebra. E essa tem sido a definição do ex-presidente em suas andanças em busca do apoio que vem do chão de asfalto, em especial o que atravessa o caminho de um seleto grupo que transita no coração financeiro da capital paulista. Os farialimers. E há quem diga que essa aproximação já está em curso. O mercado financeiro tem olhado com mais simpatia para o petista que, apesar de não ter realizado um encontro direto com esse perfil de dono do capital, tem mandado sinais de que ainda há espaço para dobrar. Lula, por exemplo, tem falado mais abertamente de reformas estruturantes e controle da dívida pública. Do outro lado dessa negociação pesou um fator pouco explorado, mas decisivo para que os interesses liberais continuem circulando mesmo em um governo de esquerda. E o nome do fator é Congresso Nacional, que ainda será, majoritariamente, formado por conservadores.

A expectativa do mercado financeiro é que a chamada “esquerda militante”, basicamente formada por legendas como PDT, PSB, PSOL e PT, eleja no máximo 140 deputados federais e 14 senadores, o que garantiria a maioria absoluta de parlamentares opositores. Caso se configure essa formação, é muito provável que o PT e seus aliados diretos não consigam a presidência de nenhuma das Casas Legislativas, o que favoreceria o andamento de pautas que, mesmo a contragosto do presidente, podem avançar. Privatizações e marcos regulatório estão entre as principais demandas para discussão na Câmara independentemente da vontade do chefe do Executivo.

Também contribuiu para a essa bandeira branca dos entes do mercado o fato de Lula ter afirmado que, caso ocupe a Presidência, irá tocar em assuntos delicados para melhorar a situação fiscal do Brasil. Na terça-feira (9), por exemplo, ele esteve ao lado de Geraldo Alckmin em um evento da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Por lá, o petista falou sobre temas quiméricos para o empresariado e o setor financeiro: dar andamento a uma nova versão da reforma tributária e pensar em otimização do Estado por meio de uma reforma administrativa. Temas que sempre foram tratados com mais reservas pelo PT. Uma fonte próxima ao candidato à vice-presidência, Geraldo Alckmin, confirmou à reportagem que Lula tem se mostrado aberto às indicações econômicas trazidas pelo ex-tucano. E quem está por trás dessa formulação são dois dos pais do Plano Real. Pérsio Arida e André Lara Resende têm ajudado na construção de uma pauta que também tenha apelo para o mercado financeiro, além dos empresários. E parece ter dado algum resultado, já que Lula afirma que esses assuntos entrarão na rota do governo logo após sua posse, caso seja eleito.

RESISTÊNCIA E se entre os industriais, as varejistas e os agentes financeiros Lula tem conseguido se aproximar, agora chegou a hora de acenar para a categoria empresarial mais distante do petista: os empresários do agronegócio. Segundo Lula, o plano é abrir um diálogo franco com eles. “Nós queremos debater. Queremos apenas a chance de conversar com o agronegócio”, afirmou no evento de terça-feira. “Até aqueles mais raivosos. Só precisa fiscalizar para ver se não estão armados.” O agro será o nicho do empresariado em que o petista encontrará maior resistência. Mas flexibilidade nunca foi um problema para Lula, e ele mostrou isso na Fiesp quando, ao derrubar uma caneta, fez questão de não deixar que ninguém a pegasse. “Parece que eu não posso nem pegar uma caneta. Se eu não posso pegar a caneta, não posso ser presidente. Preciso mostrar vigor aqui para vocês.” E parece ter mostrado. Vigor e flexibilidade.