O governo britânico ameaçou, nesta quinta-feira (27), encerrar em junho as negociações pós-Brexit com a União Europeia, se não houver um progresso rápido, excluindo o alinhamento às regras comunitárias exigidas por Bruxelas em troca de um acordo de livre-comércio vantajoso.

A publicação do mandato de negociação britânico confirmou as profundas divergências com Bruxelas antes mesmo do início, na próxima segunda-feira (2), das complexas negociações, após a saída do Reino Unido do bloco europeu no final de janeiro.

A Comissão Europeia, instituição que negocia em nome dos 27 países do bloco, afirmou que continua se preparando para um fracasso das negociações.

“Antecipamos essa possibilidade e continuamos nos preparando para isso, mas ainda é cedo para dizer o resultado das negociações”, afirmou a porta-voz comunitária Dana Spinant.

Apesar da dificuldade da tarefa, britânicos e europeus têm dez meses para chegar a um acordo sobre seu novo relacionamento. Isso deve acontecer antes do final, em 31 de dezembro, do período de transição, durante o qual o Reino Unido continua a aplicar as regras europeias.

“Isso deixa tempo suficiente, embora limitado, para que o Reino Unido e a UE cheguem a um acordo”, disse o Executivo liderado pelo premiê conservador Boris Johnson.

Por falta de perspectivas sérias de acordo em junho, Londres ameaça se retirar das negociações, elevando o espectro de um “no deal” com consequências econômicas potencialmente desastrosas para os dois lados do Canal da Mancha.

Esses anúncios derrubaram a libra imediatamente em relação ao euro.

– “Nenhuma obrigação” –

Um dos obstáculos é a exigência de Bruxelas de que o Reino Unido continue a cumprir determinadas regras da UE a longo prazo, em particular no que se refere a auxílios estatais, meio ambiente, leis trabalhistas, ou tributação, em troca de uma abertura muito ampla do mercado europeu – em particular, sem imposto aduaneiro para mercadorias.

“O governo não negociará nenhum acordo em que o Reino Unido não tenha controle sobre suas próprias leis e vida política”, afirma em seu mandato divulgado dois dias depois da aprovação pela UE de seu próprio documento.

“Isso significa que não aceitaremos nenhuma obrigação para nossas leis se alinharem às da UE, ou que as instituições europeias, incluindo o Tribunal de Justiça, sejam competentes no Reino Unido”, insistiu, declarando, porém, que deseja uma “cooperação amigável” entre duas partes “soberanas e iguais”.

O objetivo dos 27 é evitar uma concorrência desleal à sua porta. Já o governo de Boris Johnson alega que o objetivo do Brexit era, precisamente, garantir a “independência econômica e política” do Reino Unido, mesmo que isso implique mais barreiras comerciais.

O país quer ter controle sobre seus próprios regulamentos de auxílio estatal, mas disse estar aberto a “compromissos recíprocos de não enfraquecer, ou reduzir, o nível de proteção” existente na legislação trabalhista, ou no meio ambiente.

Outro ponto de discórdia é a questão sensível da pesca. A UE quer “manter um acesso recíproco” às águas territoriais das duas partes.

Esta é uma posição difícil de aceitar para Londres, apesar do aviso da UE condicionando a conclusão de uma parceria comercial a um acordo sobre pesca.

Insistindo em sua vontade de se tornar novamente “um Estado costeiro independente” no final de 2020, os britânicos pretendem negociar anualmente com a UE o acesso às suas águas, como Noruega e Islândia fazem hoje.

Boris Johnson disse, repetidamente, que quer um acordo comercial básico, como o que a UE negociou com o Canadá, que preservará a autonomia econômica de seu país.

Difícil, considera Bruxelas: acessar o mercado único exige respeitar suas regras; e o Reino Unido é um caso especial por causa dos laços profundos criados durante cinco décadas de adesão à UE, seu primeiro parceiro comercial.

As duas partes disseram estarem prontas para a possibilidade de falta de acordo, o que implicaria que as relações econômicas entre Bruxelas e Londres passarão a ser regidas pelas regras da Organização Mundial do Comércio (OMC) – muito menos vantajosas, porque definem direitos aduaneiros para as mercadorias.