“Isso é preto ou branco, não tem meio termo!”

Assim reagiu esbravejando o presidente de uma empresa, durante uma reunião de diretoria, quando o seu CMO – o responsável pelo Marketing – explicava as razões pelas quais o produto que haviam lançado estava tendo vendas cerca de 30% abaixo do previsto.

Por mais que o diretor Comercial tentasse explicar as mudanças nos hábitos do consumidor como uma das causas, o presidente repetia de forma veemente: “cliente gosta ou não gosta de um produto. É sim ou não. Compra ou não compra. Aprova ou não aprova. E, nesse caso, está claro que o cliente não aprovou. Esse argumento de mudança de comportamento é conversa fiada!”

Infelizmente, conheço muitos líderes empresariais cujo modelo mental é binário e reducionista. Ou seja, não tem campo para análises e nem de argumentação. Além disso, os pontos de vista são polarizados, não toleram o contraditório e acabam com postura e atitude radicalizadas.

Essa visão bipolar do mundo teve, no século passado, inspiração na Guerra Fria, quando só se admitiam duas forças, o Capitalismo ou o Comunismo; os Estados Unidos ou a União Soviética. Esse reducionismo não é mais apropriado, considerando a realidade multipolar em que vivemos, com a ascensão da China e outras potências asiáticas, além da consolidação da Europa. Por isso, talvez, os conservadores, saudosistas da Guerra Fria, atuem para desmantelar a União Europeia. Para estes, a multipolaridade é incômoda, pois estão acostumados a uma análise simplista da realidade: bom ou mau; amigo ou inimigo; comigo ou contra mim; nós ou eles.

Nas empresas, a percepção reducionista do mundo corporativo bate de frente com a realidade VUCA (da sigla em inglês para Volátil, Incerto, Complexo e Ambíguo) que nos atormenta. Aliás, aproveito para dizer que faltou um outro “V” (de veloz) a esse anacronismo, pois também não podemos ignorar a velocidade exponencial do surgimento de dados e fatos ao nosso redor.

Utilizando uma expressão que aprendi no interior de São Paulo, a visão binária, bipolar e reducionista, “não orna” com o momento atual. Podia até ser tolerada quando o mundo se movia em velocidade incremental, mas não combina com a realidade e ritmo em que vivemos.

Há quase 20 anos, aprendi com Jim Collins, autor do livro “Feitas para Durar, a respeitar a “Sabedoria do ‘E’”, em vez de me submeter à “Ditadura do ‘Ou’”. Ou seja, nem sempre precisamos escolher entre uma coisa ou outra. Na hora de tomar certas decisões, não é necessário ser escravo de uma alternativa ou outra. Podemos buscar convergência ou, até mesmo, uma terceira alternativa, numa espécie de “curva dos máximos”, usufruindo o melhor de cada proposta.

Por exemplo, não precisamos optar entre faturamento ou rentabilidade. Podemos alavancar a rentabilidade, enquanto aumentamos nossa fatia de mercado por meio da melhoria da eficiência operacional, que pode baixar custos e reduzir despesas. No varejo, não é mandatória a escolha entre lojas físicas e e-Commerce, como vejo alguns empreendedores aflitos para decidir. Podemos construir a solução “FiGital”, ou seja, física e digital ao mesmo tempo.

É importante mudarmos nosso modelo mental e sairmos de uma lógica que estreita horizontes e nos aprisiona em grades desnecessárias. Precisamos “juntar o ‘injuntável’”, expressão que tomo de empréstimo do querido e icônico líder, Ozires Silva, fundador da Embraer e um dos maiores empreendedores brasileiros.

O líder inspirador é um construtor de pontes, não de paredes. Busca sinergia e convergência, em vez de gerar divergências. Está se reduzindo o espaço para mentalidade binária, bipolar, reducionista e simplista, do “preto ou branco” e do “sim ou não”. O líder binário, cada vez mais, se revela ser primário. Hora de a liderança ir para um novo patamar. É preciso se transformar para ser um agente da transformação!