Foi publicada na segunda-feira, 8, no Diário Oficial da União, uma medida provisória que, embora tenha passado quase despercebida, deve abrir as portas do mundo virtual para o governo brasileiro. Em poucos artigos, o texto faz alterações na Lei 8.666, instrumento jurídico que regulamenta as compras públicas, acabando com a obrigatoriedade das tradicionais licitações. Com isso, a partir do segundo semestre parte dos negócios feitos pela União poderá ser feita on line. É coisa de gente grande. A administração federal ? com seus ministérios, autarquias e fundações ? gastou, sozinha, R$ 8,5 bilhões em 1999. Sem contar os 24 Estados e milhares de municípios brasileiros, que movimentam mais alguns bilhões. O plano de ação na Internet já está armado e a idéia é simples: utilizar a rede para diminuir os custos das transações, a burocracia e até o preço final dos produtos comprados. A exemplo do que faz a iniciativa privada, o governo irá criar um megaportal, com links para os órgãos federais. As concorrências públicas passarão a ser publicadas nesta página e os fornecedores poderão enviar propostas pela própria rede. A decisão final da licitação será anunciada também na Web.

O endereço desta página de negócios com o governo ainda não foi definido, nem a data de entrada de cada um dos ministérios. ?É uma medida gradual, que pretende levar transparência e modernização ao governo?, explica Ricardo Luiz Tortorella, assessor especial do Ministério do Planejamento e coordenador do projeto. A grande novidade é que o sistema funcionará como um grande leilão. O governo diz o que quer comprar e os fornecedores apresentam os preços. A partir daí, começa uma espécie de leilão reverso: aquele que oferecer o melhor preço, leva. Experiências semelhantes obtiveram redução de até 20% no valor total de compra. No Brasil, no entanto, o sistema só será utilizado para um grupo de bens e serviços comuns ? os chamados padronizáveis, que correspondem a um terço do total de gastos do governo. ?Obras e campanhas publicitárias, por exemplo, estarão fora deste novo sistema?, lembra Tortorella.

Por enquanto, o projeto da União diz respeito somente às compras realizadas pelo governo federal. Mas, ao que tudo indica, São Paulo poderá ser o primeiro Estado a entrar na rede. Em três meses, está previsto para estar no ar a Bolsa Eletrônica do Governo (BEG). O projeto, coordenado pela Secretaria da Fazenda, prevê que aquisições de materiais e serviços básicos serão feitas através da Internet, movimentando um total de R$ 4 bilhões. Desde 1998, o governo paulista conta com cadastros eletrônicos de compras e fornecedores. ?Em três meses, queremos migrar todo o serviço para a rede?, afirma Walter Soboll, chefe da Coordenadoria Estadual de Controle Interno. Além de agilizar e desburocratizar, criando mais facilidade nas negociações, o sistema vai aumentar o número de fornecedores e reduzir custos. ?Até o valor do processo de compras, que sai caro para o governo, deverá ser menor?, lembra Soboll.

A iniciativa não é inédita. Na América Latina, países como México, Chile e Argentina já estão com projetos adiantados. Nos Estados Unidos, o serviço é pioneiro. Só para se ter uma idéia, o Pentágono tem uma página com 30 mil fornecedores, que recebem informações diárias do que o governo americano necessita comprar ? e podem fazer suas propostas on line. ?Todo instrumento que torna a administração pública mais transparente e em favor da população é louvável?, avalia o conselheiro do Tribunal de Contas do Município, Roque Citadini.