A nova Lei de Falências entra em vigor neste sábado, 23, com a promessa de dar maior agilidade ao processo de recuperação judicial (RJ) no País, mas também cercada por incertezas provocadas pelos vetos aplicados pelo presidente Jair Bolsonaro a medidas que beneficiariam as empresas em situação de dificuldade. Um dos poucos consensos entre governo e advogados é que as mudanças passam a valer em um momento decisivo, dada a expectativa de aumento no número de pedidos de recuperação por causa da crise da covid-19.

Em 2020, houve 1.179 pedidos de recuperação judicial no Brasil, segundo dados do Serasa Experian. O número é 15% menor do que o observado em 2019, apesar dos efeitos negativos da pandemia sobre as empresas. A queda deve ser analisada com cautela porque a calamidade motivou o governo a adotar medidas de socorro a companhias em dificuldade e levou bancos e outras instituições a serem mais flexíveis em negociações de débitos. Tudo isso ajudou a conter a onda de falências e pedidos de recuperação.

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Na avaliação do governo, o efeito econômico sobre as companhias ainda está por vir. Por isso, a entrada em vigor da lei ocorre num “bom timing”, segundo um técnico ouvido pela reportagem. Em julho do ano passado, a Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia estimou que 3.513 empresas poderiam entrar em recuperação judicial diante da severidade da crise.

A reforma na Lei de Falências deve facilitar a recuperação das empresas que ainda são viáveis e tornar mais célere e eficiente a liquidação daquelas que estão condenadas a desaparecer. Alguns dos instrumentos mais importantes são as maiores possibilidades de o devedor acessar novos financiamentos, uma maneira de garantir seu fluxo de caixa, e a facilitação da negociação de dívidas com a União (veja como fica ao lado).

Hoje, mais de 6,8 mil empresas estão em recuperação judicial no País, segundo dados do Banco Central. Só a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) contabiliza oficialmente R$ 109,6 bilhões em débitos dessas empresas inscritos na Dívida Ativa da União (DAU), instância que reúne as dívidas que já passaram da fase de questionamento administrativo. Mas o número deve ser maior porque nem todas as companhias que requisitam a proteção junto a seus credores informam esse fato ao governo federal. Estimativas apontam que o débito total dessas empresas pode chegar a R$ 200 bilhões.

Regularização

O problema é que boa parte das dívidas de empresas em dificuldade não é regularizada. Enquanto a Dívida Ativa registra cerca de 30% das inscrições em situação regular (em pagamento ou parceladas), entre as companhias em recuperação esse porcentual é de apenas 9%.

Com a medida, o governo também busca corrigir uma distorção dos atuais processos de recuperação judicial, em que a cobrança de débitos tributários acaba ficando à margem do processo e com muitas empresas usando esse expediente para abandonar suas obrigações.

Para a advogada Taísa Oliveira, da área de Direito Contencioso do KLA Advogados, a nova lei vai tornar os processos de insolvência mais rápidos, seguros e eficazes, pois prevê uma única prorrogação do “stay period”, como é chamado o período de 180 dias em que as execuções contra o devedor são suspensas (enquanto hoje são comuns mais de uma prorrogação, prolongando o processo) e prevê a possibilidade de aprovação do plano de recuperação por termo de adesão, sem necessidade de assembleia geral dos credores – o que deve reduzir o tempo necessário até a deliberação definitiva sobre o plano.

Dois pontos importantes da lei, porém, ainda precisam ser decididos pelo Congresso. Bolsonaro vetou dois dispositivos que poderiam beneficiar empresas em dificuldades. Um deles tirava a trava para o uso de créditos de prejuízo fiscal ou base de cálculo negativa da CSLL no abatimento de tributos devidos sobre o ganho de capital na venda de ativos. O outro veto que causou polêmica foi feito ao artigo que buscava esclarecer um entendimento hoje já firmado na Justiça, de que não incide PIS/Cofins sobre descontos obtidos sobre valores devidos pela empresa a seus credores (que, na contabilidade, são considerados receitas). Como esses descontos costumam ser grandes numa negociação da empresa em recuperação judicial, a tributação incidente pode ser significativa.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.