Quando Ferruccio Lamborghini tinha apenas três anos de idade, um fato marcou para sempre a sua vida. No Grande Prêmio de Fórmula 1 realizado em San Marino, cidade italiana vizinha de Bologna, onde nasceu e cresceu, o tricampeão mundial Ayrton Senna morreu após bater a sua Williams na curva Tamburello. De 1994 para cá, Ferruccio procurou conhecer em detalhes o que fez de Senna um ícone. Deste então, ele adotou o brasileiro como inspiração. “Senna é meu ídolo”, disse ele, em entrevista à DINHEIRO na sua primeira visita ao Brasil, realizada no início de abril.

Sua única exigência foi visitar o túmulo do herói. “Infelizmente, não o conheci, porém tento me inspirar diariamente no seu jeito de pensar e nos seus princípios, também para os negócios.” Neto de Ferruccio Elio Lamborghini (1916-1993), fundador da lendária marca italiana de carros superesportivos, ele chegou a tentar a carreira de piloto de motovelocidade (venceu o campeonato italiano Moto2, em 2012), mas abandonou as pistas para assumir os negócios da família. Ele é o vice-presidente da Tonino Lamborghini, empresa criada por seu pai em 1981 para comercializar artigos de luxo, como perfumes, relógios, roupas, vinhos e smartphones, com faturamento anual de US$ 350 milhões.

O plano mais recente do herdeiro da Lamborghini é recolocar a marca da família no mercado automotivo. Desde a década de 1970, a grife de veículos deixou de ser um negócio da família. Primeiro, foi transferida para investidores suíços. Na época, a indústria automobilística passava por um período difícil por conta da crise do petróleo. Nesses quase 50 anos, a companhia já passou pelas mãos da americana Chrysler, por um grupo de investidores da Indonésia e hoje está sob o comando do grupo Volkswagen, que está trazendo para o Brasil o novo modelo Urus. Mas a família Lamborghini vai voltar a acelerar. “As rodas nunca deixaram nossa família”, diz Ferruccio.

O projeto de Ferruccio é bem diferente do que foi criado por seu avô, que competia com Enzo Ferrari para ver quem fazia o melhor superesportivo. Desde o ano passado, ele cuida da revitalização da marca Town Life, uma empresa de microcarros (como o Smart, que comporta o motorista e o acompanhante) fundada, em 1997, por Tonino. A aposta é em um carro elétrico, que já está em produção na Ásia, em parceria com a GPCC Korea, uma empresa coreana de desenvolvimento de veículos movidos a eletricidade. No mercado asiático, o Town Life custará entre US$ 12 mil e US$ 14 mil.

E, mais do que um negócio lucrativo, os veículos elétricos podem representar um novo marco para a Lamborghini. Mas, assim como seu avô, Ferruccio não escapará da rivalidade, mesmo que agora muito distante, com a Ferrari, que anunciou no início deste ano, no Salão de Detroit, nos Estados Unidos, o lançamento de um carro elétrico para concorrer com a Tesla, de Elon Musk. “O mundo contemporâneo está obrigando as marcas a se reinventarem”, diz Silvio Passarelli, consultor do mercado de luxo. “Empresas de alta performance esportiva começarem a trabalhar com alternativas de motorização, que sejam mais ecológicas, é um sinal de que elas estão entendendo o significado do novo luxo.”

Além da paixão da família pelas quatro rodas, Ferruccio acrescentou seu gosto pessoal nos negócios e decidiu colocar a marca sobre duas rodas. A scooter Iso Motor Lamborghini está sendo produzida e comercializada na Coreia do Sul e na China. Esse primeiro modelo atinge velocidade máxima de 80 quilômetros por hora e é capaz de rodar 65 quilômetros com uma única carga. O modelo híbrido, com gasolina, pode ter autonomia para percorrer uma distância de até 150 quilômetros. Com preços entre US$ 2 mil e US$ 4 mil, a Iso Motor pode ser recarregada em tomadas de 220 Volts e leva até quatro horas para atingir carga total. “Creio que o mercado da América do Sul, em particular o Brasil, possa ser chave para nós”, disse o empresário italiano.

Ferruccio veio ao Brasil para prospectar potenciais investidores para seus projetos, mas não forneceu muitos detalhes de seus planos. Ele considera a possibilidade de instalar uma fábrica no País. Para isso, ele disse estar de olho na aprovação do Rota 2030, o novo programa de incentivo para montadoras que vai substituir o Inovar-Auto. Enquanto os projetos a motor ganham velocidade, Ferruccio cuida das dezenas de produtos licenciados com a marca da família (confira quadro), como o smartphone Alpha-One, um aparelho de US$ 2,5 mil.

Seu maior atrativo não está ligado à configuração, que é inferior as da Apple e da Samsung, mas ao material utilizado: uma liga metálica semelhante ao titânio, que deixa o aparelho mais leve e resistente a choques. Os artigos de luxo com o nome da marca ainda são, é verdade, o principal negócio da família. Mas Ferruccio sonha em resgatar a história criada por seu avô. E está trabalhando para que isso aconteça. “Quando se tem algo no seu sangue, nas suas raízes, você não esquece”, diz o herdeiro da Lamborghini.