Não tente entender um app de sucesso global sem entender a trajetória do hábito humano de consumir arte de rua — conceito criado na Antiguidade, principalmente na Grécia e em Roma. De lá, as apresentações de talentos urbanos começaram a ficar itinerantes na Idade Média e ganharam locais específicos, como palcos, salões e teatros. As produções artísticas em suas mais variadas vertentes se espalharam pelo mundo e se adaptaram ao tempo e ao espaço. Inevitavelmente, alcançaram também as plataformas digitais, seja para divulgação dos trabalhos e disseminação da cultura, seja para gerar oportunidades e remuneração aos artistas. As redes sociais tornaram-se palco para essas atividades. Uma das vitrines para quem quiser mostrar suas habilidades é o Kwai, que possui 26 milhões de usuários no Brasil — onde iniciou sua operação recentemente e tem investido para atrair mais usuários.

O aplicativo de vídeos curtos é uma espécie de “praça pública” da internet, como definiu com exclusividade à DINHEIRO head de negócios internacionais da rede Tony Qiu, ex-CEO da 99. “O Kwai é para todos. O aplicativo possui uma comunidade de conteúdo única, com usuários extremamente criativos e ativos”, disse.

Criado há dez anos na China com o nome Kuaishou (como ainda é chamado por lá), o Kwai desembarcou no Brasil em 2018. Mas iniciou sua operação local, de fato, neste ano. Por aqui, é comandado por Mariana Sensini, contratada como country manager em dezembro, após passagens por Pinterest, Google e Globo. “Queremos estimular o consumo e a produção de todos os tipos de conteúdo”, disse a executiva.

Um dos principais desafios é implementar no Brasil ferramentas de monetização que já estão avançadas no território asiático e renderam à companhia um faturamento global de US$ 9,1 bilhões em 2020. O valor é 50,2% maior do que a receita de 2019. Atualmente, no País, uma das formas de monetização para os inscritos é pela campanha Kwai Golds, em que os usuários ganham dinheiro à medida que completam missões no aplicativo, como assistir a vídeos, fazer check-in diário ou convidar pessoas para a plataforma. Uma das novidades que estará em breve na plataforma para os brasileiros é o live-commerce, muito usado na China. Em transmissão ao vivo, o usuário vende serviços e produtos com auxílio de ferramentas tecnológicas que facilitam a venda e o pagamento. Para Rapha Avellar, empreendedor e especialista em marketing digital, essas soluções devem ser prioridade para a rede ganhar a confiança do mercado. “Para um grande anunciante é interessante empoderar suas mensagens com estratégia de mídia bem feita, que ainda não tem ali dentro. É um sério desafio”, afirmou.

DISPUTA O TikTok é concorrente direto do Kwai: ambos são de vídeos curtos e voltados para o público jovem . (Crédito:Divulgação)

CLASSES C E D Com 26 milhões de usuários ativos, o Kwai briga para ficar no Top 10 das redes sociais. O ranking é liderado pelo Facebook, com 130 milhões de usuários, segundo levantamento de 2020 da consultoria Resultados Digitais. Inicialmente, o app ganhou popularidade não como rede social em si, mas como ferramenta para editar vídeos e tratar fotos para envio por WhatsApp. “Virou padrão para as pessoas das classes C e D editarem coisas e enviar por mensagem”, afirmou Avellar. No mundo, o Kwai é o 13o em número de usuários, com 481 milhões, de acordo com o Statista. Seu principal rival é o conterrâneo TikTok, também de vídeos curtos, que está na 7a posição, com 689 milhões de inscritos ativos.

ESPORTES Para ganhar espaço por aqui, o Kwai investe principalmente nos setor esportivo, com patrocínios a eventos como o Campeonato Brasileiro de Futebol, a NBB (Novo Basquete Brasil) e parcerias com clubes. Também faz investimentos diretos em criadores de conteúdos. A plataforma vai investir US$ 10 milhões para apoiar influenciadores na América Latina, parte significativa no Brasil. Recentemente, anunciou o apresentador Fred, do canal Desimpedidos, do YouTube, como embaixador no Programa de Criadores de Esporte do Kwai. Ele dividirá suas experiências na criação de conteúdo para abrir novos caminhos aos talentos no mundo digital.

Apesar da forte presença no esporte, Mariana Sensini afirma que a rede é plural e não possui target definido, pois tem atuação também em gastronomia, notícias e outras verticais de entretenimento. “Queremos estimular o consumo e a produção de todos os tipos de conteúdo”, disse. Afinal, a praça do Kwai é pública e está aberta para quaisquer apresentações.

ENTREVISTA: Tony Qiu do Kwai
“Queremos traduzir as paixões e a cultura brasileira em conteúdo”

Divulgação

Com dezenas de redes sociais à disposição das pessoas, qual é o diferencial do Kwai?
O Kwai é para todos. Possui uma comunidade de conteúdo única, com usuários extremamente criativos e ativos. A plataforma possui um algoritmo inclusivo que proporciona uma melhor distribuição do conteúdo em comparação àqueles realizados por usuários que já têm um grande número de seguidores. Também conta com uma forte equipe de pesquisa e desenvolvimento que criou recursos líderes do setor. Por exemplo: o mecanismo de recomendação personalizado do Kwai fornece aos usuários uma ampla gama de criadores de conteúdo, motivando-os a criar continuamente vídeos novos e exclusivos.

Quais são as características do mercado brasileiro que atraíram o Kwai?
Os brasileiros têm uma relação muito próxima com a internet e a forma como expressam suas emoções on-line é única. Mais do que uma rede social, o Kwai é uma plataforma com criadores de conteúdo de todos os tipos, não apenas influenciadores já conhecidos em outras plataformas. A ideia é ajudar os criadores de conteúdo a se desenvolverem. Quando uma empresa decide operar em uma nova região, geralmente o faz copiando e colando. Mas no caso do Kwai, com a criação de conteúdo como seu foco principal, agora reconhecemos que era melhor começar no Brasil com uma estratégia localizada desde o início. Procuramos microecossistemas e queremos traduzir as paixões e a cultura brasileira em conteúdo e construir uma plataforma para o público brasileiro.

A empresa tem investido muito em marketing no Brasil, principalmente em patrocínios de eventos esportivos. Por que o foco inicial neste nicho?
Fizemos nossa primeira campanha de marca em abril deste ano usando o jeito que o brasileiro ri, “KKKK”, o que obviamente tem um grande apelo com a nossa marca. Agora queremos apoiar os criadores de conteúdo local com nosso Programa de Criadores de Esporte, de 12 meses, para apoiar os criadores de conteúdo esportivo da América Latina. Investiremos US$ 10 milhões para incentivá-los a criar novos conteúdos — e para atualizar suas produções com workshops e com uma equipe para ajudá-los em sua jornada.

TikTok é a rede que mais se assemelha ao Kwai e disputa diretamente os usuários. Esse concorrente apareceu depois, mas tem mais usuários hoje. Alcançar o TikTok é uma meta?
Acho que a maior diferença entre Kwai e TikTok está na missão e nos valores das corporações. Você pode notar que a missão do TikTok é inspirar a criatividade, ou seja, incentivar a inovação. Por outro lado, a missão do Kwai é ajudar as pessoas a descobrir o que precisam, no que são boas e melhorar o senso individual de felicidade de todos. Pessoalmente, acho que o Kwai é uma plataforma mais universal.