Desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) decidiram na quarta-feira (3) pela anulação do júri que condenou quatro pessoas no caso do incêndio na Boate Kiss, que ocorreu em Santa Maria (RS) em janeiro de 2013 e deixou 242 pessoas mortas e 636 feridas, a maioria jovens universitários.

No julgamento, dois dos desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) votaram pela anulação do júri, um votou contra. Dentre os principais argumentos, a escolha dos jurados foi a que mais pesou na decisão dos desembargadores, que citaram problemas na quantidade de sorteios e que os prazos em relação ao processo não foram respeitados.

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Os quatro réus – dois sócios da boate e dois membros da banda que tocava no local quando o incêndio aconteceu – foram condenados no final de 2021 por homicídio simples com dolo eventual, recebendo as seguintes penas:

  • Marcelo de Jesus dos Santos, vocalista da banda – 18 anos
  • Elissandro Callegaro Spohr, sócio da boate – 22 anos
  • Luciano Augusto Bonilha Leão, auxiliar da banda – 18 anos
  • Mauro Lodeiro Hoffmann, sócio da boate – 19 anos

Ao fim da sessão, os quatro réus foram colocado em liberdade. Marcelo Santos e Luciano Leão deixaram o Presídio Estadual de São Vicente do Sul e Elissadro Spohr e Mauro Hoffmann deixaram a Penitenciária Estadual de Canoas, onde cumpriam suas penas.

De acordo com o advogado criminalista Guilherme Suguimori Santos, do escritório Vilutius, Abissamra e Suguimori, após essa decisão “certamente haverá uma série de recursos do ministério público aos tribunais superiores buscando a alteração desse resultado, sendo que imediatamente houve o envio de petição do Ministério Público ao Supremo Tribunal Federal (STF) na tentativa de garantir que os acusados continuem presos apesar da anulação”.

“Caso o ministério público não consiga reverter a decisão do TJ-RS, todo o procedimento de julgamento de júri deverá ser refeito em primeiro grau, com um novo julgamento. O estado atual, portanto, é o de que o julgamento não teve validade e deve ser refeito, não havendo mais condenação vigente contra os acusados”, afirma Suguimori.

Para ele, a soltura dos acusados era inevitável: “A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que os mantinha presos baseava-se em garantir a execução imediata da condenação, efetivando a decisão dos jurados. Com a anulação de todo o julgamento, não existe condenação a ser garantida, o que altera o cenário concreto do caso e torna inaplicável a argumentação do Supremo. De forma simples: a decisão do Supremo estava garantindo a execução de uma condenação que deixou de existir”, conclui.

O advogado criminalista também critica a intervenção do STF no caso e diz que a indignação e sofrimento das vítimas e familiares “não podem ser ignorados”. “A comoção social gerada por uma grande tragédia como essa influencia de uma maneira ou outra o julgamento. É bastante discutível que o caso tenha sido classificado como um crime doloso contra a vida. Também é de uma legalidade extremamente questionável a intervenção do STF para garantir a prisão dos acusados, da forma como ocorreu.  São exemplos que demonstram que grandes casos deveriam ter um maior rigor com a obediência às regras, pois são naturalmente suscetíveis a distorções e ilegalidades, mesmo que impulsionadas por um sentimento nobre”, conclui Suguimori.