Separados por 2.660 quilômetros, o advogado pernambucano Marcos Alencar e o seu colega paulista Gustavo Granadeiro tentam todos os dias uma explicação para aquilo que os dois consideram um novo tipo de excesso da Justiça Trabalhista brasileira. Graças à internet e a um convênio batizado de Bacenjud entre o Banco Central e o Poder Judiciário, qualquer juiz no País, incluindo os trabalhistas, pode se sentar à frente do computador ligado à rede e após alguns comandos bloquear a conta corrente de uma empresa, complicando toda a cadeia produtiva, dos fornecedores aos funcionários. A tecnologia que deveria servir para agilizar o rito do pagamento das indenizações aos trabalhadores está prejudicando o processo de defesa das empresas sérias. ?Podem existir excessos, mas há como contê-los dentro da própria Justiça?, afirmou à DINHEIRO o presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Vantuil Abdala.

Os advogados pensam exatamente o contrário. Na avaliação deles, desde que o BC permitiu essa operação, que consiste no preenchimento de um formulário eletrônico que é enviado diretamente aos bancos encarregados do bloqueio da conta em 48 horas, os juízes ficaram menos suscetíveis para ouvir os argumentos de defesa das empresas. ?Há uma deturpação clara desse instrumento?, afirma Marcos Alencar. Opinião semelhante tem seu colega de São Paulo. ?Às vezes, a defesa da empresa só existe quando o dinheiro está bloqueado?, diz Gustavo Granadeiro. Antes desse recurso tecnológico, adotado a partir de 2000, os juízes podiam pedir o bloqueio das contas para garantir o pagamento de indenizações. Como o processo era demorado, os magistrados se preocupavam em ouvir com mais calma os dois lados. Tanto que o número de ofícios via correio que chegavam ao BC não atingia 300 por dia. Hoje ultrapassam 2 mil pela rede. ?Tudo está mais ágil?, diz João Goulart, chefe do Departamento de Informação do BC.

O TST não sabe qual o volume de recursos bloqueados no País porque esta é um informação que os bancos não liberam. Os advogados estimam em centenas de milhões de reais que saem do caixa dos clientes e ficam parados nas instituições financeiras. O que chama atenção é o volume que essa massa de execuções trabalhistas pode atingir. Em média, uma indenização é de R$ 15 mil e como há 1,7 milhão de ações à espera de uma sentença judicial, o dinheiro bloqueado pode chegar à impressionante marca de R$ 25 bilhões. Para fugir do alcance da tecnologia, as empresas com problemas trabalhistas estão utilizando um recurso criativo. Elas abrem uma conta voltada para essa finalidade e na hora do bloqueio informam ao juiz o número dessa conta que na maioria dos casos tem poucos recursos. Dessa forma se protegem da ação judicial.