O mundo está repleto de grandes e magníficas joalherias. Nenhuma como a Maison Chaumet. Erguida na Place Vendôme (leia quadro), um dos pontos comerciais mais sofisticados de Paris, essa histórica boutique de luxo foi totalmente restaurada durante a quarentena imposta pelo coronavírus e, com o relaxamento do confinamento na França, acaba de reabrir suas portas. E o momento é de celebração. A Chaumet está comemorando nada menos do que 240 anos de existência, o que faz da casa a joalheria mais antiga em funcionamento do planeta.

A reforma transferiu todos os escritórios administrativos da empresa para outro prédio, abrindo mais espaço na sede histórica para os ateliês, que ganharam amplas bancadas dispostas ao lado das janelas, favorecendo a iluminação do local e proporcionando uma belíssima vista da Place Vendôme. Ali,os renomados designers da Chaumet fazem surgir verdaderias obras-primas da joalheria. O edifício é, por si só, uma preciosidade. Além de sua beleza arquitetônica, foi palco de grandes episódios vividos por personagens históricos.

Desde que foi erguido, o prédio teve suas salas e paredes como testemunhas da presença de artistas de toda a Europa. Um dos seus frequentadores mais célebres era Chopin. Hoje, na sala em que o fenomenal pianista polonês tocou sua última mazurka há um piano Pleyel, marca preferida de Chopin. Quem também costumava visitar o local era o imperador Napoleão Bonaparte.

BELEZA ÁRABE Inspirado em mesquitas, os anel Sheherazade é feito de ouro, esmalte e safiras e custa US$ 113 mil cada. (Crédito:Divulgação)

Amigo e admirador do fundador da joalheria, o ourives Marie-Étienne Nitot, o homem que levou a França a se tornar uma potência na Europa costumava, entre uma batalha e outra, ir à loja comprar joias. Nessas ocasiões, o baixinho valente estava quase sempre acompanhado de uma de suas mulheres: a primeira, a imperatriz Joséphine, e a segunda, Marie-Louise. Não raro, ele encomendava peças exclusivas a suas amadas. Têm o selo da Chaumet, por exemplo, um exuberante conjunto de colar, broches e brincos – feitos de camafeus e pérolas –, produzido para Joséphine, em 1811, e duas pulseiras com pedras preciosas que o imperador mandou fazer para Marie-Louise. Já na segunda metade do século 19, a joalheria se tornou a preferida de outro ícone da cultura francesa, o escritor Honoré de Balzac.

Personagens e histórias à parte, a Maison Chaumet notabilizou-se por criar espaços fabulosos e autênticos tesouros em forma de joias. Para comemorar seus quase um quarto de milênio de fundação, não poderia quebrar a tradição. A recente reforma faz parte desse pacote. A sala das tiaras, por exemplo, dobrou o número de modelos em exibição: de 132 para 264. São todas peças que pertenceram a nobres, aristocratas e integrantes da realeza. Dispostas numa sala com paredes de azul-celeste, as tiaras parecem brilhar como estrelas numa noite sem Lua. Outra novidade na arquitetura interna da loja são as áreas com vastos espaços para circulação e contemplação das peças, resultado da remoção de algumas paredes que havia entre as salas.

Vale ressaltar, também, os painéis dourados que adornam algumas paredes e os tapetes com cores e texturas que harmonizam com as joias expostas em cada setor dessa espécie de loja-galeria. Afinal, são elas – as joias – as grandes estrelas da casa. A coleção criada especialmente para o aniversário de 240 anos da grife é composta por dezesseis anéis, todos inspirados em monumentos ao redor do mundo. “Faz parte de uma tradição chamada anéis de casa”, explicou o embaixador global da Chaumet, Bertrand Bonnet Besse.

Nos distantes séculos 18 e 19, era costume na Europa Oriental o homem dar a sua noiva um anel feito no mesmo formato da residência do casal, como uma promessa de que ela seria bem cuidada. A Chaumet adaptou essa ideia para os dias de hoje e fez surgir peças fabulosas, como o anel Sheherazade, cujo design remete a uma mesquita. Produzido em ouro amarelo, esmalte e safiras, tem cúpula de lápis-lazúli – rocha azulada de origem indiana – e custa US$ 113 mil.

MONUMENTO NO DEDO Apesar da rara beleza e do preço pouco modesto, Sheherazade está longe de ser a maior preciosidade da casa. O mais celebrado anel da nova coleção reproduz um monumento francês, menos badalado do que a Torre Eiffel e o Museu do Louvre, mas também encantador: o Grand Palais. Confeccionada com diamantes, esmeraldas, ouro e cristais, a peça, batizade de Oriane, tem parte superior que se abre, fazendo surgir um espaço onde é possível guardar pequenos objetos. A joia, que é a maior e mais cara entre os lançamentos da grife, custa US$ 400 mil. Uma excelente ideia, aliás, é aproveitar que você está em Paris para conhecer a construção que inspirou o designer a criar o Oriane. Sem dúvidas, o Grand Palais merece uma visita. Também chamado de Grand Palais des Champs-Elysées – por ficar nessa que é uma das regiões mais famosas da capital francesa –, integra o belo conjunto arquitectônico formado pelo Petit Palais e a Ponte Alexandre III. Sua construção foi iniciada em 1897, para que o prédio ficasse pronto a tempo de sediar a Exposição Universal de 1900. Ou seja, o Grand Palais já nasceu com a arte em seu DNA.

O prédio é marcado pelo estilo arquitetônico Beaux-Arts, típico da Escola de Belas Artes de Paris, e reflete o primor da decoração sofisticada e ornamentação nas fachadas de pedra. Os maiores destaques são sua estrutura de ferro e aço aparente, o uso de concreto armado e, principalmente, sua grande cobertura envidraçada, algo considerado inovador para a época. Numa de suas entradas, lê-se uma frase que descreve muito bem o propósito que marcou a criação desse histórico edifício: “Monument consacré par la République à la gloire de l’art français”. Em bom português: “Monumento consagrado pela República à glória da arte francesa”. E assim continua até hoje. Seja apresentando exposições com obras de artistas de todo o mundo ou em forma de uma jóia, na fabulosa sede da Maison Chaumet. Agora, é só esperar a pandemia passar para poder admirar tudo isso in loco.

A Praça da realeza

Se é para falar das grandes joalherias com lojas em Paris, não dá para deixar de destacar a fabulosa Place Vendôme. Ali, estão os principais fabricantes de joias do mundo, como Boucheron, Cartier e, claro, Chaumet. A praça é rica em histórias e personagens. O poeta, escritor e romancista Victor Hugo é um deles. Conta-se que esse ilustre francês, autor dos clássicos Les Misérables e Notre-Dame de Paris, adorava caminhar por suas ruas forradas de pedras.

Divulgação

No início do século 18, o rei Luís XV era frequentemente visto caminhando entre suas mansões. A presença da realeza na Place Vendôme não era nada incomum. Pelo contrário. A praça foi construída no século 17, com seu formato octogonal, para ser uma espécie de bairro da alta nobreza. Bailes a céu aberto e grandes jantares eram realizados na praça com alta constância. Não raro, com a presença de reis e rainhas. Considerada uma preciosidade da arquitetura clássica francesa, suas construções têm fachadas idênticas, que a circundam de forma simétrica e harmoniosa. Em seu centro, fica a Coluna Vendôme. Com 44 metros de altura, foi encomendada pelo imperador Napoleão Bonaparte, para ser um marco da sua vitória de Austerlitz, em 1805.

Nessa mesma época, ourives e joalheiros começaram a se instalar na Place Vendôme, atraindo os clientes famosos e abastados das redondezas. O movimento ganhou tanta força, que a praça virou o mundialmente célebre centro de grifes de joias que é hoje.