Uma sessão de votação do Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF), em que possíveis impactos à Lava Jato estiveram no centro da discussão, foi interrompida por um pedido de vista do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Por 8 votos a 1, a maioria do alto colegiado do MPF caminhava para aprovar uma resolução que limita o recrutamento de procuradores para forças-tarefas e cargos da Procuradoria-Geral da República (PGR).

A proposta é da sub-procuradora Raquel Dodge, que deve concorrer à vaga de Janot na eleição que será realizada em julho.

A proposta, segundo Dodge, visa não sobrecarregar as procuradorias que cedem pessoal, mas ainda está sendo discutido possíveis regras de transição e de blindagem aos grupos de trabalhos já existentes, propostas em dois substitutivos (novas versões) do texto original.

A regra, que já tem maioria para aprovação, estabelece que nenhuma unidade possa ceder mais do que 10% do seu quadro total de procuradores. Nesta segunda-feira, 24, foram apresentados os substitutivos que podem preservar de impacto os grupos de trabalho já montados e podem dar um prazo de transição até o dia 3 de janeiro para a adaptação das unidades recrutadoras que teriam de devolver procuradores.

Janot, dizendo-se “perplexo” com os rumos que a discussão estava tomando antes da possível flexibilização da regra, afirmou que isso, sim, afetaria negativamente o grupo de trabalho Lava Jato na PGR e outros grupos de trabalhos criados com integrantes de outras procuradorias. Mas disse ver com “conforto” o que chamou de “recuo do colegiado”.

“Esse discurso de que não vai afetar a Lava Jato é um discurso que tem de ser recebido com muita ponderação, porque, na verdade, ninguém, a não ser aqueles que participam da investigação, ninguém conhece a complexidade, o alcance, a dimensão, do que representa essa investigação. Portanto vejo com mais conforto o recuo do colegiado no que se refere às exceções, aos critérios de transição, à flexibilização, e com o intuito de colaborar, como são duas propostas de substitutivo global, peço vista para aqui analisá-las”, disse o procurador-geral.

O único voto contra a resolução é de José Bonifácio de Andrada, vice-procurador-geral da República.

Recurso

O recrutamento de procuradores de outras unidades é um recurso amplamente utilizado para compor grupos de trabalhos relacionados a operações. Só no grupo de trabalho da Lava Jato na PGR, por exemplo, há nove procuradores cedidos por outras unidades.

Dos nove, sete poderiam ter de retornar às unidades originais caso a resolução não inclua uma blindagem aos grupos de trabalho já existentes. Apenas dois desses, por serem do Ministério Público do Distrito Federal e Terrotórios, estariam livres da hipótese de serem devolvidos. Mas uma devolução não seria incondicional e automática: só ocorreria com os procuradores de unidades que tiverem mais de 10% de seu quadro comprometido com o empréstimo para outras procuradorias. Nesse caso, haveria o retorno. Se o colegiado resolver preservar os grupos de trabalho já montados, nenhum deles precisaria retornar.

Há várias coordenadorias e secretarias da própria PGR que contam com pessoal cedido por outras unidades do Ministério Público Federal. Esses outros procuradores, em tese, não seriam contemplados nem mesmo pela blindagem às forças-tarefas de operações já em andamento.

Contra a resolução como um todo, Janot fez uma comparação com a mudança de combustível de uma nave espacial, ao afirmar que “é óbvio que, quando você mexe numa estrutura como um todo, isso interfere sim no seu trabalho”.

“Essa é uma questão que envolve inequivocamente o conflito de interesses entre vários membros da instituição, envolve o conflito de interesses entre unidades da instituição e inclusive o gabinete do procurador-geral da República”, acrescentou Janot.

Fortalecimento

Autora da resolução, a subprocuradora-geral da República Raquel Dodge é uma das candidatas à sucessão de Janot na PGR. Ela fala que essas novas regras poderão trazer um fortalecimento de outras unidades do Ministério Público Federal. E que não há impacto negativo na Lava Jato.

“A ideia é garantir um número mínimo em cada procuradoria. Se for eu a procuradora-geral, acatarei resolução. Acho que acataria com muita tranquilidade porque acho que é possível recrutar colegas de várias unidades”, disse a subprocuradora.

Raquel disse que a ideia da resolução veio de manifestações da Procuradoria da República no Distrito Federal (PR-DF) e na Procuradoria Regional da República na 1.ª Região (PRR-1). “Todos passaram no mesmo concurso. Acho que é regra clara, precisa estar posta”, comentou.