O engenheiro fiscal da Desenvolvimento Rodoviário S/A (Dersa) Edison Mineiro Ferreira dos Santos foi flagrado por grampo da Polícia Federal “bastante irritado” com uma mulher ligada ao consórcio Mendes Júnior-Islux – administrador do lote 1 do Trecho Norte do Rodoanel paulista. As obras são alvo da Operação Pedra no Caminho, que prendeu na quinta-feira, 21, o ex-diretor-presidente da estatal paulista Laurence Casagrande Lourenço, que foi secretário de Logística e Transportes do Governo Alckmin (PSDB).

A Pedra no Caminho investiga desvio de recursos públicos em obras do Rodoanel Norte. As investigações apontam que aditivos contratuais, relacionados principalmente à fase de terraplenagem da obra, incluíam novos serviços para efetuar a remoção de matacões (rochas) misturados ao solo. Edison foi alvo de mandado de prisão temporária ordenado pela juíza Maria Isabel do Prado, da 5ª Vara Federal.

No relatório, a PF afirma que o diálogo é “relevante”. A mulher, segundo a investigação, usou “linha telefônica cadastrada em nome da empresa Consórcio Mendes Júnior-Islux”.

“A mensagem principal é clara: Edison havia pedido o envio de um projeto para Evandro, ao que tudo indica funcionário do Consórcio Mendes Júnior. Porém, segundo o que informa a mulher não identificada, Evandro havia se negado, pois não estaria mais no contrato”, relata a Federal.

Segundo a PF, “Edison se demonstra bastante irritado com a negativa e pede para a mulher não identificada informar a Evandro que foi Pedro da Silva quem pediu para mandar o referido projeto”. Pedro da Silva, ex-diretor da Dersa, foi preso na Pedra no Caminho.

“A interlocutora informa que vai enviar e-mail com esse recado para Evandro. Nesse momento, Edison a interrompe e avisa de maneira enfática “não, não, não… isso não pode ser por e-mail querida”. Finaliza o diálogo criticando a negativa de maneira incisiva”, registra a PF.

Edison atendeu o telefonema às 9h52, do dia 29 de maio de 2017. A conversa durou dois minutos e 24 segundos. Em um momento, a mulher fala: “Tá ok. Vou mandar o e-mail pra ele, então, conforme falado.”

O engenheiro da Dersa repete “não” por três vezes. “Não, não, não, isso não pode ser por e-mail.” “Ah tá”, retorna a interlocutora.

Defesas

A reportagem não conseguiu contato com a defesa de Edison Mineiro Ferreira dos Santos. O espaço está aberto para manifestação.

Daniel Bialski, que defende Pedro Paulo Dantas do Amaral Campos, gestor do Centro de Operações do trecho Norte da Dersa envolvido nas investigações, ressalta que a “prisão é desnecessária”.

“Não podemos esquecer que a custódia em qualquer modalidade é uma exceção e não há demonstração de que era imprescindível. Pedro é exemplar funcionário de carreira na Dersa, com elogios e sem qualquer mácula. Ele prestará todos os esclarecimentos necessários, já que não praticou qualquer ilicitude e aguardará a revogação da medida imposta” diz Bialski.

O criminalista Eduardo Carnelós, que defende Laurence Casagrande, diz que sua prisão “é ilegal, injusta.” “Por que o sr. Laurence não foi ouvido antes? Tem cabimento prender antes de ser ouvido? Ele teria prestado todos os esclarecimentos. Depois, eles poderiam confirmar ou não as informações dadas por ele.”

“O sr. Laurence Casagrande é alvo de uma grande injustiça. Ele é um profissional exemplar, uma vida patrimonial absolutamente correta. É uma pessoa metódica, foi auditor da Kroll. Em seu depoimento na Polícia Federal (…) ele respondeu a todas as questões que lhe foram feitas pela Polícia Federal. E entregou documentos que demonstram não ter havido ilegalidade em seus atos”, escreveu.

“Tão logo o meu cliente tomou conhecimento, por matéria publicada em revista semanal, de que era alvo de investigação, peticionamos ao Ministério Público Federal pedindo acesso aos autos. Não fomos atendidos e, hoje, fomos surpreendidos com a prisão do sr. Laurence.”

“Além disso, o sr. Laurence só foi autorizado a entrar em contato comigo por volta de 8h30 da manhã, ou seja, duas horas e meia depois que a Polícia Federal chegou à residência dele.”

“Na Dersa, Laurence Casagrande impôs uma regra segundo a qual todo contrato superior a 10% do capital social da empresa, obrigatoriamente, tem que passar pelo Conselho de Administração. A Diretoria não pode aprovar.”

“É importante ressaltar que tudo o que se refira ao Rodoanel tem que passar pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento, o BID, o qual deve manifestar sua não objeção. Tudo sempre foi realizado de acordo com as regras internacionais, as regras de contratação. De modo que quando há desentendimento entre as partes, o contratante pode fixar preço a título precário, porque as medições são provisórias. Só é definitivo no encerramento do contrato para não interromper a obra.”

“As empreiteiras estavam ameaçando paralisar as obras, criou-se um impasse, por isso houve um momento em que se decidiu fazer aditamento. Isso tudo com o aval do BID, obrigatório passar pelo BID antes, e decidido pelo Conselho de Administração da Dersa.”

“A Dersa encomendou um estudo do IPT. O Instituto de Pesquisas Tecnológicas foi lá e demorou para fazer esse trabalho. Uns 7 ou oito meses depois, o IPT diz que isso não é devido por causa de formações geológicas previsíveis na Serra da Cantareira.”

“A Dersa determinou o estorno dos pagamentos, o que é previsto no contrato também.”

“As empresas, valendo-se de regra contratual, também padrão pelas normas do BID, recorreram a uma espécie de câmara de arbitragem para âmbito técnico, a Junta de Conflito, na qual cada parte indica um perito e esses dois indicam um terceiro, que vai ser o presidente. Isso tem efeito suspensivo. Não pode fazer o estorno das quantias pagas. Suspende a decisão de estorno.”

“Só neste ano saiu parecer final da Junta de Conflito no sentido de que os pagamentos eram devidos. A Dersa, ainda sob a presidência do sr. Laurence, pediu esclarecimentos para a Junta, tentando reverter. A resposta saiu em 23 de abril, mantendo o parecer. O parecer e a resposta ao pedido de esclarecimentos foram apresentados pelo sr. Laurence, para juntada ao inquérito.”

O presidente nacional do PSDB, Geraldo Alckmin, reitera seu total apoio às investigações. Se houve desvio, Alckmin defende punição exemplar. Caso contrário, que o direito de defesa prevaleça. Com relação ao caso mencionado pela reportagem, o ex-governador de São Paulo reforça que todas as informações solicitadas foram prestadas pela Dersa ao TCU, que ainda não julgou o caso.

A Dersa – Desenvolvimento Rodoviário S/A se manifestou dizendo que a empresa e o Governo de São Paulo “são os maiores interessados acerca do andamento do processo. Havendo qualquer eventual prejuízo ao erário público, o Estado adotará as medidas cabíveis, como já agiu em outras ocasiões”.

A OAS também emitiu nota: “Agentes da Polícia Federal estiveram nesta na sede da OAS em São Paulo, numa operação de busca e apreensão de documentos relativos a obras do Rodoanel paulista, das quais é responsável pelos Lotes 2 e 3 do trecho Norte. Um ex-executivo da empresa que esteve à frente do projeto – fora dos quadros da companhia desde 2016 – também teve prisão temporária decretada.”

“Em razão desses acontecimentos, a nova gestão da OAS esclarece à opinião pública, aos nossos colaboradores, aos nossos credores e aos nossos fornecedores que considera relevante não deixar pairar dúvidas ou suspeitas sobre os negócios anteriores à sua chegada ao comando da empresa. Em razão disso, os atuais gestores da construtora têm prestado às autoridades todos os esclarecimentos a respeito de atividades e contratos sobre os quais haja questionamentos – no projeto do Rodoanel em particular e em todos os outros que realiza.”

“A OAS já firmou acordos com o Cade e vem trabalhando com outros órgãos fiscalizadores para acertar contas com o Estado e o povo brasileiro. A nova gestão da OAS entende que colaborar para elucidar tais questionamentos é um imperativo para dar continuidade a suas operações de acordo com os mais elevados padrões de ética e transparência corporativa, único caminho possível para recuperar o lugar de excelência que sempre ocupou na engenharia do país.”

O Governo de São Paulo disse que “determinou à Corregedoria-Geral da Administração a abertura de sindicância para apurar os fatos hoje revelados. Laurence Casagrande renunciou à presidência da Cesp para poder se defender. No seu lugar assume interinamente o diretor financeiro Almir Fernando Martins”.

O criminalista Marcelo Leonardo, constituído pela empreiteira Mendes Junior, disse que ainda não teve acesso aos autos da Operação Pedra no Caminho. “Como ainda não tivemos acesso aos autos não temos nada a declarar por enquanto.”

A CESP – Companhia Energética de São Paulo disse em nota que “não vai se pronunciar porque os fatos, alvos da operação, não aconteceram no âmbito da Empresa, nem no período em que o sr. Laurence Casagrande Lourenço preside a Companhia.”