O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revisou sua projeção de crescimento do Produto Interno Bruto da agropecuária em 2020 de 2,0% para 1,5%. As estimativas revistas, do Grupo de Conjuntura da Diretoria de Estudos e Políticas Macroeconômicas (Dimac), estão na Seção sobre economia agrícola da Carta de Conjuntura do terceiro trimestre, divulgada nesta terça-feira, 25, no site do Ipea.

A piora no desempenho da produção de carne bovina é a principal responsável pela revisão para baixo na projeção. “Apesar da melhora das estimativas para o valor adicionado da lavoura, que aumentou de 3% para 3,6%, a revisão para baixo do PIB agropecuário de 2020 deve-se à piora da previsão para o desempenho do setor pecuário, cuja estimativa anterior era de estabilidade e agora é de queda de 2,8%, em especial devido à significativa queda na produção de carne bovina”, diz um trecho da seção publicada nesta terça-feira.

O desempenho negativo da produção de carne bovina foi afetado tanto por fatores de oferta quanto demanda. No lado da oferta, a produção já havia começado 2020 em baixa, antes mesmo da pandemia de covid-19, por causa de ajustes em relação ao forte crescimento do fim de 2019 – explicado, por sua vez, pela demanda da China, em função de perdas na produção chinesa causada pela peste suína africana (PSA).

Ao mesmo tempo, “o efeito adverso do coronavírus sobre a demanda doméstica, que absorve cerca de 75% da produção, afetou uma possível retomada do segmento no primeiro semestre, apesar da forte alta das exportações a partir de maio. Abril, que já é um mês típico de menos abate, teve queda acentuada em 2020 em decorrência do isolamento social e da consequente mudança nos tipos de corte mais consumidos no mercado doméstico”, diz a Carta de Conjuntura. E mesmo que a reabertura das atividades impulsione a demanda doméstica no segundo semestre, “a recuperação tende a ser menos acentuada, fazendo com que a quantidade de carne bovina se mantenha num nível abaixo ao observado em 2019”.

Já o aumento na projeção para o valor adicionado da lavoura foi puxado pela supersafra de grãos em 2020. Segundo o Ipea, entre os principais produtos da lavoura brasileira – soja, cana-de-açúcar, milho e café -, apenas o milho tem estimativa de queda na produção em 2020 e, mesmo assim, “após fechar 2019 com uma forte alta e safra recorde”. Na pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de julho sobre a safra de 2020, houve “revisão positiva para a soja e o milho, o que ampliou nossa previsão de alta no valor adicionado da lavoura”, diz outro trecho da Carta de Conjuntura.

Apesar do impacto da demanda doméstica sobre a pecuária, os pesquisadores do Ipea destacam como a demanda externa tem sido importante para sustentar o bom desempenho do PIB da agropecuária, apesar da recessão provocada pela covid-19. As exportações brasileiras de produtos do agronegócio cresceram 11%, em valor, no primeiro semestre, nos cálculos do Ipea.

“A principal razão desse comportamento é o destino desses produtos. A China, que registrou o primeiro caso de Covid-19 em dezembro de 2019, iniciou o ano com um lockdown severo, que afetou diversos setores da economia do país. No final do primeiro trimestre, quando as políticas de isolamento social foram flexibilizadas, a China aumentou a demanda para repor seus estoques, o que favoreceu bastante o comércio com o Brasil”, diz outro trecho da Carta de Conjuntura.

O bom desempenho do setor agropecuário, que deverá ser o único a registrar variação positiva no PIB de 2020, deverá se repetir no próximo ano. A primeira projeção dos pesquisadores do Ipea para o PIB da agropecuária de 2021 aponta crescimento de 3,2%. Para essa estimativa, foram usados as projeções de safra da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO, na sigla em inglês) e, no caso da pecuária, modelos econométricos próprios.

No próximo ano, segundo as estimativas do Ipea, o crescimento do valor adicionado na lavoura deverá moderar para 3,2%, enquanto a pecuária deverá se recuperar da queda esperada para este ano com um avanço de 5,0% em 2021. “Estimativas preliminares da Conab apontam que, no próximo ano, o milho e a soja – culturas que vêm batendo recordes desde 2019 – apresentarão crescimento de 9,1% e 10,5%, respectivamente”, escrevem os pesquisadores.

Em relação ao comércio exterior, a demanda chinesa deverá continuar dando as cartas, mas avanços no entendimento entre China e Estados Unidos para dar uma trégua na disputa comercial entre os dois países, como o anunciado nesta terça-feira, 25, podem afetar as exportações de soja. A safra americana de soja que ainda terminará de ser colhida em 2020 também poderá ser recorde e, conforme lembram os pesquisadores do Ipea, a primeira fase do acordo comercial entre China e Estados Unidos estabelece aumento nas compras chinesas de produtos americanos.