OS INVESTIDORES PARTIRAM EM debandada. Pelo quinto mês consecutivo, a indústria de fundos de investimento encerra o período com patrimônio líquido no vermelho. Em agosto, R$ 5,6 bilhões sumiram das carteiras, segundo a Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid). Os cotistas das categorias de renda fixa, ações e multimercados estão na dianteira dessa fuga, que no total acumula R$ 14 bilhões de diferença entre os resgates e a captação em 2008. Para explicar essa saída de recursos, não basta se debruçar sobre a rentabilidade ruim das categorias. É preciso esticar o pescoço e arregalar os olhos para os prêmios atrativos que os bancos começaram a oferecer nos Certificados de Depósitos Bancários (CDBs). Quem estava descontente com o retorno e preocupado com a volatilidade da renda variável, encontrou seu porto seguro nesses títulos privados.
O fenômeno de atratividade do CDB é simples de ser explicado. Para as instituições financeiras, a crise internacional fechou as portas para a captação de recursos no Exterior, enquanto o volume de crédito no mercado interno era crescente – chegou a 36,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Também ajudou a imposição, pelo Banco Central, de um novo recolhimento compulsório de 5% sobre os recursos das empresas de leasing (arrendamento mercantil). A medida foi adotada em fevereiro para conter a expansão do crédito e a inflação. Com a demanda crescente e a necessidade de dinheiro em caixa para financiar automóveis, imóveis e outros bens de consumo, os bancos passaram a emitir CDBs com juros mais altos para atrair os investidores em seus títulos. Deu certo. Em 2008, o estoque dos CDBs aumentou 58,5% e atingiu R$ 571,3 bilhões em agosto (veja gráfico). A rentabilidade média acumulada no ano é de 6,64%, segundo o BC. “A migração de dinheiro dos fundos para o CDB é vantajosa para os bancos”, diz Pedro Lerias, gestor de carteiras da Verax Serviços Financeiros.
Todos os lados ganham nessa oferta em quantidade farta. Por isso, a troca de investimentos acaba sendo automática e generalizada. Os fundos institucionais e de pensão e as grandes empresas são seduzidos pelos bons prêmios pagos para adquirir grandes quantidades de CDBs. A taxa melhorou até mesmo para os pequenos investidores, com aplicações a partir de R$ 1 mil. “O investidor insatisfeito com a performance ruim dos fundos está indo para o CDB”, conta Aquiles Mosca, estrategista de investimentos do Banco Real. A reversão da busca por esse tipo de investimento só acontecerá quando o apetite dos bancos pelo aumento de funding for saciado. E é pouco provável que isso ocorra antes do final do ano. “O risco e a volatilidade em alta tiram a disposição dos investidores de colocar seu dinheiro em fundos”, afirma Frederico Mesnik, sócio da Humaitá Investimentos.

A fuga dos investidores não pode ser creditada apenas à agressividade dos bancos com o CDB. Uma parte dos resgates está no mau humor dos investidores com o desempenho abaixo do esperado de seus fundos. E a maior bronca é com os multimercados, que perderam R$ 27,9 bilhões de patrimônio. No Banco Real, 20% dos R$ 800 milhões que migraram estavam, na prática, fugindo dos multimercados. Não foi muito diferente em outras instituições de grande porte. Explica-se: durante cinco anos, os gestores dos fundos se acostumaram com um cenário de Bolsa em alta e juro e câmbio em baixa. Era a estratégia chamada de “kit Brasil”, que permitia uma boa rentabilidade sem muita criatividade.
O nome pode ser pouco familiar para o investidor, mas os resultados foram sentidos no bolso. Era falsa a impressão de que os riscos dos multimercados eram pequenos. Com a virada do mercado e direções pouco claras dos ativos, os gestores não conseguiram cumprir com a promessa de trabalhar com qualquer tipo de cenário. “Os gestores terão que reaprender a operar dos dois lados”, diz Alexandre Póvoa, diretor do Modal Asset, gestora de R$ 760 milhões.

Nessa onda de resgates, sobrou até para o conhecido porto seguro dos investimentos. Os fundos de renda fixa estão R$ 22 bilhões mais leves no ano e R$ 44 bilhões no período de 360 dias. O duro golpe para a categoria ocorreu em abril. Com a mudança na forma de marcar o mercado (precificar os títulos pelo valor negociado, em vez do contábil) pela Andima, a rentabilidade dos fundos foi prejudicada num primeiro momento. Muitos ainda estão com rendimentos abaixo da variação do CDI, o índice de referência do mercado financeiro. Esse ajuste de metodologia foi benéfico, mas no curto prazo espantou os investidores que saíram em busca de maior rentabilidade. “O investidor não admite estar no vermelho na renda fixa”, diz Maurício Gentil, gestor da Meta Asset Management, gestora de R$ 492 milhões.

Os investidores farão o caminho de volta? Há quem acredite que sim. “Os fundos de ações e os multimercados voltarão a ser atrativos após o controle da inflação no Brasil e o fim da crise americana”, afirma Leandro Rassier, diretor da XP Investimentos. Esse é um cenário para o longo prazo, que não deve aparecer antes de 2009. “O investidor está mais arisco e será preciso mostrar a estratégia do fundo e não a performance passada”, diz Marcos Duarte, sócio da Pólo Capital. No curto prazo, novas ondas de resgate são esperadas. “O CDB continuará sendo um concorrente importante dos fundos nesse semestre”, diz Gentil. O momento é de pensar em como será possível não deixar esse investidor escapar. “A memória recente de performance é muito ruim”, diz Póvoa.
Quem não se mexeu ainda e pretende aderir à fuga deve ter muita cautela. Antes de mais nada, converse com o seu gerente ou orientador financeiro sobre o prazo das aplicações, que determina o tamanho da mordida do Leão do Imposto de Renda. Se for precisar dos recursos em prazos curtos, pode ser mais vantajoso esperar onde está. Os CDBs, sempre é bom lembrar, têm o risco do banco que os oferece. A cobertura do Fundo Garantidor de Créditos é limitada a R$ 60 mil por CPF. Em caso de insolvência, o investidor está 100% coberto até esse limite. Depois, vira credor da massa falida sobre o que superar esse valor – vide clientes do Banco Santos, o último a ter esse fim melancólico. Nos fundos, que são entidades jurídicas independentes dos bancos e dos gestores, o risco dos papéis é diluído.