O principal nome do site de recomendações financeiras que mais barulho causou no Brasil nos últimos anos fala sobre os resultados que obteve a partir de estratégias de marketing incisivas e explica por que sua empresa optou por uma postura mais zen

O megainvestidor George Soros já se autodefiniu como “um animal do mercado”. O termo também parece adequado para Felipe Miranda. Seu pai fez carreira no mercado financeiro e permitiu que o filho aplicasse na Bolsa de Valores quando tinha apenas 14 anos de idade. Hoje aos 34, o economista formado pela Universidade de São Paulo e mestre em Finanças pela Fundação Getúlio Vargas segue sua vocação como estrategista-chefe da Empiricus, site de consultoria financeira que em dez anos conquistou 360 mil assinantes a partir de um marketing agressivo que, segundo ele mesmo, às vezes “cruza a linha vermelha”.

Depois de campanhas controversas, que exageravam nos retornos aos investidores, a empresa acaba de lançar sua Fase 2, na qual o objetivo é mostrar aos potenciais clientes as taxas extraordinárias de rentabilidade que obteve nos últimos cinco anos — com uma média, segundo Miranda, de 250% do CDI. Ele falou à reportagem da DINHEIRO na sede da empresa que hoje tem 240 funcionários e deve faturar R$ 300 milhões este ano. A sala escolhida: Buffett, homenagem a outro guru dos investimentos.

DINHEIRO – A Empiricus cresceu rápido com relatórios financeiros voltados para o grande público. Por que lançar a Empiricus Fase 2?

FELIPE MIRANDA – A Fase 2 é uma mudança para mostrar o que a empresa pode fazer em termos concretos pelos seus assinantes. É um passo seguinte à nossa estratégia de comunicação, que era muito contundente, pautada em nossos sócios americanos. Eles são os maiores do mundo em recomendação de investimento, com presença em 20 países e
4 milhões de assinantes.

DINHEIRO – E o que levou à mudança?

MIRANDA – Quando lançamos aquela comunicação mais persuasiva, a ideia era sensibilizar as pessoas, anestesiadas em relação ao ambiente de investimentos no Brasil. A gente concorre com o banco (que é o principal ponto de contato com o investidor, através do gerente) e com as corretoras, que pregam o slogan da “assessoria gratuita”. A Empiricus só vende assessoria de investimento, então é complicado concorrer com um produto que supostamente é entregue de graça. Só que ele não é gratuito. Existem taxas que o investidor não consegue distinguir. Eu precisava mostrar a esse investidor que vale a pena pagar por uma assessoria independente, precisava ter um marketing muito contundente. Foi uma porrada nas pessoas para acordá-las. A qualidade do nosso produto só era percebida por quem passava da primeira etapa e se tornava assinante. Hoje podemos mostrar às pessoas o resultado que elas teriam no bolso ao seguir a Empiricus.

DINHEIRO – Qual é esse resultado?

MIRANDA – Quem nos seguiu nos últimos 5 anos sabe que não houve qualquer carteira que sequer chegasse perto da nossa. A gente acertou em tudo desde aquele manifesto que eu assinei em 2014, chamado “O fim do Brasil?”, em que recomendava comprar dólar e vender ações. E depois, com a virada de mão, quando a gente pegou a Bolsa a 40 mil pontos e multiplicou por 2,5 vezes. Quem está conosco desde então multiplicou o que tinha por seis.

DINHEIRO – Esse sucesso atraiu outros competidores. Quais riscos você enxerga para o seu negócio?

MIRANDA – A vida não pode ser feita de evitar riscos. A questão é correr os riscos certos. Quando éramos pequenos, à margem do sistema, atacávamos o próprio sistema, formado por bancos e corretoras. Hoje, um terço dos investidores da Bolsa está conosco. Se o que a Empiricus fala faz preço, é porque ela já está no mainstream. A gente precisa se institucionalizar sem perder o viés provocador, a perseguição implacável por ideias de investimento que ninguém tem. O Mick Jagger (vocalista dos Rolling Stones) está fazendo rock’n’roll há 60 anos e é Cavaleiro da Coroa Britânica. Ele resume essa ambivalência: como você se institucionaliza sem perder a sua essência? É a dicotomia entre forças apolíneas e dionisíacas. Um investidor é como um boxeador. Se ele está domado, não produz nada. Você não precisa ser o Mike Tyson, mas precisa ter aquele olho de tigre.

O Mick Jagger faz rock’n’roll há 60 anos e é Cavaleiro da Coroa Britânica. Soube se institucionalizar sem perder sua essência (Crédito:Mads Claus Rasmussen)

DINHEIRO – A Empiricus popularizou relatórios sobre investimentos, mas também atraiu a atenção da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Qual a relação de vocês hoje?

MIRANDA – A Empiricus entende que não está no mercado de capitais, que é regulado pela CVM. Eu vivo de dar opiniões sobre comprar ou vender ativos. Eu não estou na originação nem na distribuição de valores mobiliários. No momento em que um regulador do mercado de capitais afirma que eu não posso fazer esse trabalho, a minha resposta é que se trata de censura. Fomos atrás de três pareceristas e o entendimento dos três é que estamos no mercado editorial, como ocorre nos EUA. Nosso sócio americano está fora da área de regulação do órgão equivalente à CVM. Eles têm a garantia constitucional da liberdade de imprensa. Então esse é nosso pleito. Temos uma Ação Declaratória na Justiça para sermos considerados à parte da CVM. Eu não estou autorizado pela CVM para dar opinião de investimento porque eu não preciso dessa autorização.

DINHEIRO – Qual o desgaste causado pela campanha com a Bettina, que afirmava ter feito R$ 1 milhão em três anos?

MIRANDA – A gente fazia milhares daqueles anúncios de 10 segundos e não dava para revisar tudo. A partir do caso da Bettina, criamos a área de compliance, que não existia formalmente. Agora nenhum texto sai sem uma dupla revisão e todos vêm com alertas que foram criados a partir de uma consulta à CVM, com as duas frases que atendem ao que o regulador entende como necessário. Uma diz que retorno sobre investimento passado não é garantia de retorno futuro. A outra, que investimentos sempre envolvem riscos.

DINHEIRO – É difícil acreditar que uma peça como aquela tenha passado sem revisão…

MIRANDA – Entendo que você não acredite, mas foi assim. A Bettina pensou no anúncio, gravou e foi para o ar. Ela havia ganhado liberdade e confiança, porque as peças que ela vinha fazendo davam muito retorno. Até que escorregou. E onde escorregou? O problema, para mim, foi que a gente não deixou claro que ela fez outros aportes no meio do caminho para sair de R$ 1 mil e chegar a R$ 1 milhão em três anos. Ela ganhou muita grana com ações, mas não foi mil vezes o que ela investiu. E a repercussão foi muito ruim. Houve uma exposição negativa na imprensa, tivemos que arcar com Procon, Ministério Público, CVM. Por outro lado, sob o ponto de vista estrutural de longo prazo, foi positivo, pois permitiu à Empiricus reconhecer o seu lugar no mercado e entender que não pode cometer erros como esse. A empresa hoje é muito melhor do que era antes.

DINHEIRO – Você perderam clientes?

MIRANDA – Nos dois ou três meses subsequentes houve uma grande desaceleração do crescimento. A percepção foi negativa.

DINHEIRO – O pedido de desculpas que vocês fizeram agora é a melhor solução?

MIRANDA – É uma consequência da nossa nova estratégia. As pessoas subestimam o quanto a Bettina é competente, inteligente e batalhadora. Os que a seguiram, ou seguiram a Empiricus como um todo, com certeza tiveram uma experiência positiva. A carteira que ela sugeria era muito boa, deu um retorno incrível.

DINHEIRO – Você mesmo protagonizou uma campanha bem agressiva dizendo que ensinaria a qualquer um dobrar o capital investido em pouco tempo. Qual o retorno dessa estratégia?

MIRANDA – O “double income” foi o nosso maior sucesso. Temos 160 mil assinantes desse produto. As pessoas entenderam a necessidade de criar uma máquina de geração de renda. A gente tem uma carteira que envolve fundos imobiliários, títulos do Tesouro e ações que são boas pagadoras de dividendos. É a melhor do mercado para a pessoa física. Mais importante do que dobrar literalmente é a pessoa perceber que ela pode aumentar muito, 50%, 70%. Isso já é formidável.

DINHEIRO – Você aplica nas carteiras que recomenda?

MIRANDA – Eu nasci nesse ambiente. Meu pai era do mercado financeiro. O George Soros costuma dizer que é um “animal do mercado”. Guardadas as devidas e gigantescas proporções, essa expressão cabe a mim. Eu comecei a comprar ação com 14 anos de idade. Eu trato isso como uma vocação. Eu nunca sequer pensei em fazer outra coisa. Isso facilita bastante as minhas análises. O mercado financeiro está em mim de uma forma intuitiva. O que eu aprendi negociando ações em 22 anos é o que me dá vantagem nesse negócio em relação à média do mercado.

DINHEIRO – A Empiricus tem 360 mil assinantes. É possível crescer ainda mais?

MIRANDA – Escala é fundamental para o sucesso. Temos 34 analistas aqui pensando full time nas estratégias de investimento. Sem uma equipe grande e boa não dá para acertar tanto. Com essa escala, a Empiricus consegue mover o mercado. O que a gente escreve faz preço nos ativos. Se a gente recomenda, a ação sobe. Se paramos de recomendar, a ação cai. Então todo mundo quer falar com a gente, o que nos coloca em vantagem, porque informação é dinheiro nesse mercado.

“O problema do vídeo da Bettina foi não deixar claro que ela fez outros aportes para sair de R$ 1 mil e chegar a R$ 1 milhão” (Crédito:Divulgação)

DINHEIRO – Vocês pretendem avançar para outras áreas?

MIRANDA – Esses 360 mil assinantes gostam da gente porque ganharam dinheiro. A gente precisa criar um ecossistema inteiro fechado. Eu quero ter um research independente que possa ser executado com um clique. Eu preciso ter uma corretora aqui do lado que vá executar as minhas ideias. Isso só vai parar de pé se eu não cobrar corretagem e se a corretora tiver o mesmo rebate (taxa de administração) para todos os fundos.

DINHEIRO – Essa corretora será parte da Empiricus ou uma empresa parceira?

MIRANDA – Já temos uma parceria há dez meses com a Vitreo, uma corretora cujos sócios são o Paulo Lemann, o Patrick O’Grady e o Alexandre Aoude. Essa gestora executa parte das nossas ideias para 40 mil clientes e já está com R$ 2,4 bilhões sob gestão. Hoje aa parceria é comercial: eles pagam por anúncio publicitário na Empiricus. A ideia é que a gente esteja cada vez mais junto.

DINHEIRO – Como você avalia o governo Bolsonaro?

MIRANDA – Se você julgar o governo pelo que ele fala, é péssimo. Eu nunca vi um governo se expressar tão mal, principalmente o Bolsonaro e a “família real”. Só que isso, em termos pragmáticos, representa muito pouco. Do ponto de vista prático, eu acho o governo formidável. A agenda econômica talvez seja a melhor da história. A reforma da Previdência, todo mundo tentou e ninguém fez. Se passar a tributária, a mesma coisa. Há uma forte agenda de privatizações. O ganho de produtividade que pode vir com a privatização da Eletrobrás é absurdo. É um governo muito bom, que acaba subdimensionado porque o discurso é muito ruim.

DINHEIRO – Você investe em cirptoativos?

MIRANDA – Eu me interesso por critomoedas porque estão associadas a tecnologias realmente disruptivas. As empresas mais valiosas do mundo só chegaram onde estão por causa da tecnologia. Em termos de ativo, a criptomoeda traz uma possibilidade de retorno extraordinário. Aposte centavos para ganhar dólares. Se você põe R$ 100 em bitcoin e vem uma porrada negativa, você perde no máximo R$ 100. Mas se vem uma porrada positiva, você pode ganhar muito. Então eu acho que todo mundo deveria aplicar alguma coisa do portfólio de investimentos em criptomoeda. Ele é um excelente diversificador, que pode aumentar o retorno dentro de um dado grau de risco.

DINHEIRO – O Brasil está atrasado nas criptomoedas?

MIRANDA – Aqui a influência do sistema financeiro tradicional é muito grande. Além disso, não somos um grande polo tecnológico. Não somos o Vale do Silício, nem Israel, nem a China. A posição do Brasil é aguardar a regulação externa para definir a própria. Como moeda de troca, do varejo, ainda falta maturação. Acredito que a Wibx fará esse papel, para o qual foi prensada. Temos confiança de que ela pode se tornar importante.