Depois de alguns altos e baixos – mais altos do que baixos –, a família Marco Antonio volta a investir de maneira acentuada no setor de saúde. Agora, o clã fundador do Hospital São Luiz e com expertise em clínicas populares deixa de lado a administração direta de hospitais para atuar em suporte logístico de unidades. Ruy Marco Antonio Filho e seu pai adquiriram, por valores não revelados, 35% da empresa TLS Logística e Gestão em Saúde. A empresa é especializada em promover soluções de armazenamento e distribuição de suprimentos hospitalares.

Injeção de capital, know-how e networking que contribuem para a companhia que cresceu 80% de 2018 para 2019 e absorve 30% a mais de demanda neste período de pandemia. “Entramos para acrescentar valor ao trabalho da TLS, num mercado que necessita, cada vez mais, de logística para potencializar processos. Poucos possuem esse serviço”, afirma Ruy Filho, que assume como diretor administrativo e conselheiro da empresa. Ele volta ao segmento depois de uma experiência negativa com a Megamed, rede de clínicas particulares com preços populares. Depois de quatro anos sem o retorno esperado, encerrou as atividades em 2019.

“Foi um tiro no pé”, diz Filho. Antes dessa empreitada, ficou com a família por 5 anos nos Estados Unidos, onde estudou inglês e se especializou em novos negócios. O período sabático veio logo depois de vender, em 2010, o Hospital São Luiz para o banco BTG Pactual, por meio da Rede D’Or. Segundo divulgado à época, o valor da negociação foi de US$ 571,4 milhões (algo em torno de R$ 3 bilhões atualmente), divididos entre os controladores do hospital e acionistas.

Apesar de não dirigir um hospital, função na qual tem 30 anos de experiência, o executivo passa a atuar na área de logística, extremamente pulsante na planilha de despesas e receitas. Segundo a publicação anual da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), os gastos dos com contratos técnicos e operacionais, medicamentos e materiais somam 30,6%, em média. É o segundo maior custo desses negócios, perdendo apenas para a folha de pagamento de funcionários, que consome pouco mais de 50% do orçamento.

“Entramos no negócio para acrescentar valor ao trabalho da TLS, num mercado que necessita, cada vez mais, de logística” Ruy Marco Antonio Filho. (Crédito:Isabela Rangel)

Com relação aos ganhos, materiais e medicamentos são responsáveis por 44%. Uma importante fonte de receita que, bem gerenciada, com logística, pode aumentar as margens de lucros. “A entrada da família Marco Antonio é estratégica para nosso negócio. Não está relacionada apenas à capitalização. Agrega em visão comercial e experiência de governança”, afirma Rodrigo Rangel, fundador e conselheiro da TLS, que recusou algumas propostas de investidores antes de fechar a venda à família Marco Antonio. “Não queríamos apenas a entrada de capital financeiro.”

OPORTUNDIADE A TLS começou sua operação logístic a há 5 anos. Antes, era uma empresa de facilities. O novo nicho de atuação surgiu pela necessidade de a Rede D’Or buscar mais espaços rentáveis dentro das próprias unidades. Rangel viu uma oportunidade de prestar serviço de armazenamento de materiais volumosos que ocupavam muito espaço nos hospitais. Afinal, estoques não agregam valor. Era preciso transformar algumas dessas áreas em consultórios, laboratórios, leitos, centro cirúrgicos. Além de ocupar espaço, manter materiais como garrafões d’água e papel higiênico dentro do hospital gera outros inconvenientes, como desperdícios, perda de força de trabalho e queda no potencial de negociação de preços junto a fornecedores.

Com resultados positivos, o que era armazenamento e distribuição de água e papel passou ao gerenciamento de insumos, equipamentos e remédios. Com a TLS no jogo, os hospitais passaram a comprar em maior quantidade, a valores menores. Agora, funcionários especializados em saúde, que se preocupavam com estoques, focam apenas em suas funções. Entregas de soros, que ocorriam três vezes por semana, passaram a ser a cada 15 dias, direto no centro de distribuição da empresa. Lá, o material é separado para ser entregue em cada hospital, cada andar, cada setor, cada paciente, o que se chama de unitarização. Um sistema capaz de pegar uma caixa de medicamento, separar as cartelas, comprimidos e entregar no local, dia e horário certos para ser ministrado. “Tudo isso evita desperdício. Acabou o estoque deles. Abastecemos diariamente com o necessário”, afirma Thiago Amaral, CEO da TLS.

O TRIO QUE MANDA Tiago Amaral, CEO da TLS, o empresário Ruy Marco Antonio Filho e Rodrigo Rangel, fundador da companhia (da esq. à dir.). (Crédito: Isabela Rangel)

Hoje, a TLS atende, além da Rede D’Or, ao Grupo Leforte, à Unimed Recife e à Associação Fundo de Incentivo à Pesquisa (AFIP). São cerca de 20 hospitais, 13 clínicas, 4 mil leitos, dois laboratórios de análise clínica e 1,5 milhão de medicamentos unitarizados por mês. Há dois Centros de Distribuição Logística, um em Embu das Artes (SP) e outro no Recife, que realizam gestão intra-hospitalar, de inventários e de consignados, controle e movimentação de equipamentos, montagem de kits, distribuição multimodal, transporte de alta complexidade e serviços de entrega e coleta em domicílio.

CORONAVÍRUS No atual período de pandemia, o setor hospitalar atende a demanda diferenciada e a atuação da TLS sofre adaptação. Os clientes compravam muitos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e testes de Covid-19, principalmente da China. Foram algumas dezenas de contêineres que desembarcaram no Brasil e ficaram a cargo da empresa de logística. Com isso, a TLS teve de ampliar a capacidade de armazenamento e alugou espaços. Em São Paulo, os 7,5 mil metros quadrados ganharam reforço de mais 3 mil metros quadrados. Em Pernambuco, dobrou de tamanho e agora são 2 mil metros quadrados. O reforço no quadro de funcionários foi de 10%, com 20 contratações: passou de 200 para 220.

ESTRUTURA A TLS atende a cerca de 20 hospitais, 13 clínicas, 4 mil leitos e dois laboratórios de análise. (Crédito:Isabela Rangel)

A empresa também observou movimento de mudança das demandas com a maioria das consultas, urgências, exames e cirurgias seletivas adiadas. A companhia logística, que manipulava a entrega e o recebimento de muitos itens, passou a gerenciar poucos suprimentos – como álcool gel, máscaras, aventais e luvas –, mas em um volume muito maior. A tendência, porém, é essa balança se equilibrar no pós-pandemia, com o retorno das atividades em clínicas e laboratórios. “Com as pessoas em casa, de quarentena, há uma demanda reprimida pelos procedimentos de rotina na saúde. Isso voltará com força”, diz Rangel. Na visão de Thiago Amaral, os espaços mais utilizados hoje pela TLS devem ser incorporados, pois acredita em um grande mercado a ser explorado. “A logística é parceira estratégia dos hospitais. E eles estão abrindo os olhos para isso.”