Índios da etnia guarani fazem desde terça-feira um protesto no Parque Estadual do Jaraguá, na zona norte de São Paulo, para tentar retomar a demarcação de uma área de 532 hectares na região. Na madrugada de ontem, ao não verem as reivindicações atendidas, eles subiram ao Pico do Jaraguá e ocuparam antenas de telecomunicações, chegando a interromper o funcionamento da estrutura principal pela manhã – com efeitos para a transmissão de sinal de televisão e celular – e só permitindo o religamento após reunião com representantes do governo do Estado.

A Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), que representa 3,6 mil emissoras no País, classificou como “extremamente grave” a atitude de desligamento das antenas. Segundo a associação, mais de 600 mil pessoas no norte da capital e em Cajamar, Mairiporã, Caieiras e Franco da Rocha, na Grande São Paulo, foram prejudicadas pela ausência do sinal de TV. “Toda reivindicação é legítima, desde que seja respeitado o direito do cidadão de acesso à informação e à comunicação.”

Procurada, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) informou que apenas a operadora Claro reportou problemas. Segundo a Anatel, quando uma antena de telefonia móvel é desligada, automaticamente outra passa a fornecer o sinal, diferentemente do que ocorre com as de televisão.

Os organizadores do ato estimaram em mil o número de integrantes do protesto. Antes, no dia 30 de agosto, os índios já haviam realizado manifestação no escritório da Presidência da República na Avenida Paulista. Com faixas, eles montaram uma base na frente de um dos portões do parque e controlam o acesso. Desde a madrugada de ontem, a área das antenas de telecomunicações também foi tomada.

O motivo do protesto é a Portaria 683/2017, assinada pelo ministro da Justiça, Torquato Jardim, em 15 de agosto. Nela, Jardim anula a Portaria 581, do próprio ministério, de 29 de maio de 2015, que previa a expansão do território indígena no Jaraguá de 3 hectares para 512.

Na ocasião, o ministro sustentou que houve erro administrativo no procedimento e, considerando a abrangência da reserva sobre o parque, a demarcação deveria ter contado com a participação do Estado de São Paulo, “na definição conjunta das formas de uso da área”. Questionado ontem, o ministério preferiu não comentar o assunto.

Desde que a Portaria 683, a mais recente, foi baixada, os guaranis se preparam para realizar protestos. “Ficamos em choque com a revogação e já no primeiro dia pensamos em fazer manifestações. Mas planejamos como atuar, decidimos fazer o ato da Paulista e agora continuar chamando a atenção para a causa aqui, no parque”, disse Karai Jekupe, de 34 anos, que integrava o protesto na tarde de ontem. Para ele, é importante que haja a demarcação para que a tribo “possa conviver na terra dos seus antepassados”.

Estado

No início da tarde, os secretários estaduais de Meio Ambiente, Maurício Brusadin, de Segurança Pública, Mágino Alves Barbosa Filho, e de Justiça, Márcio Elias Rosa, estiveram no parque para reunião com os indígenas. Em nota enviada ao Estadão às 13h20, a pasta de Meio Ambiente havia dito que se trata de “uma questão federal” e não caberia à secretaria se pronunciar sobre a ação.

Às 15h25, a pasta voltou a se manifestar, dizendo que o encontro dos secretários havia levado a uma “saída pacífica dos indígenas que ocupavam as torres de transmissão no Pico do Jaraguá”. A reportagem estava na estrutura que envolve as torres no início da noite, quando um líder indígena leu a nota para o grupo e se indignou: “Nada foi resolvido. Ficaremos aqui”.

A reivindicação indígena passou a ser, então, que o governo paulista desistisse de continuar com pedido de mandado de segurança no Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde desde 2015 já sustentava suposta ilegalidade na demarcação. À noite, o governo disse ter informado ao ministro relator a “perda superveniente de interesse” no mandado, “porque o ato (Portaria 683) sustou os efeitos do ato anterior cuja legalidade era questionada”.

Na noite de ontem, os guaranis tentavam decidir os próximos passos do protesto, sem indicativo de que a medida da administração estadual seria suficiente. “Pode ser um início de negociação, mas há de ocorrer contato com o governo federal”, disse a defensora pública federal Fabiana Galera Severo.

“Precisamos que o governo federal volte atrás na revogação”, protestou Awaratan Wassu, de 35 anos.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.