Nestes quase quatro anos à frente da República, o governo Bolsonaro não foi gentil com os indígenas brasileiros. Alguns fatos: a construção de uma narrativa que os diminui como indivíduos — quem não se lembra da frase “o índio está evoluindo e cada vez mais é um ser humano igual a nós”, dita pelo próprio presidente?; a irresponsabilidade na distribuição das vacinas contra a Covid-19 fato que gerou a contaminação de 3,8 mil indígenas e a morte de quase 500; a ameaça à manutenção do bem-estar social de diversas tribos com o sucateamento dos órgãos de proteção e com a pressão pela aprovação do PL 191/2020 que permite a mineração em terras indígenas, entre outros fatos.

No meio desse caos, a reação dessas comunidades ameaçadas começa a aparecer. E com uma governança cada vez mais organizada. Um desses fenômenos recentes foi mapeado pela pesquisa Narrativas Ancestrais, Presente do Futuro, coordenada pela pesquisadora Cristiane Fontes, da Amoreira Comunicação, e se trata do fortalecimento das lideranças femininas nas comunidades indígenas.

Público em geral tem visão distorcida sobre pautas indígenas, revela pesquisa

Neste contexto, um grande exemplo e fonte de inspiração foi Joênia Wapichana, a primeira mulher indígena a se tornar deputada federal em 2018 pela Rede Roraima. Com ela, começam a emergir outros nomes como Vanda Witoto, Sônia Guajajara, Val Terena, Célia Xacriaba, Eunice Kerexu, Simone Karipuna, Eliane Bakairi, Juliana Genipapo Canindé, Shirley Pankará que agora trabalham em suas pré-candidaturas para, se eleitas, formarem uma bancada indígena no Congresso Nacional e também nos parlamentos estaduais.

Parte desse grupo esteve na última segunda (11) no Tribunal Superior Eleitoral, para uma reunião com o presidente Edson Fachin. O objetivo foi apresentar pela primeira vez o ‘Chamado pela Terra’, movimento articulado de lançamento das candidaturas dos indígenas. A intenção, afirmou Sônia Guajajara, é aumentar a participação na política. “Nas últimas eleições, pudemos lançar candidatos e candidatas que nos representassem verdadeiramente, mas o resultado ainda foi pequeno.” Fachin respondeu à altura dos anseios do grupo. “É nossa prioridade trazer as vozes e as cores dos povos indígenas para construirmos, juntos, uma sociedade livre, aberta e plural”, afirmou.

Agora só falta conversar com os eleitores brasileiros. Os obstáculos são os tais de preconceito e desinformação. Entrevistas com os públicos não engajados, conduzidas pela Ipsos no estudo coordenado por Cristiane Fontes, revelaram um profundo desconhecimento e distanciamento da importância e da realidade dos indígenas na atualidade e também antagonismo, desinteresse e rejeição aos direitos indígenas, especialmente o direito à terra. Esses direitos tendem a ser vistos por esses públicos como em “contraposição” aos direitos de outros segmentos da população geral — a perspectiva, portanto, é de um espaço de disputas em que, “se o outro ganha, sou eu quem perco”.

Visão nada construtiva em um pleito eleitoral.